.Por Marcelo Mattos.

 “Se o dia nasce, renasce o samba / Se o dia morre, revive o samba”. (Candeia, in Filosofia do Samba).

O nosso Paulinho da Viola, baluarte Portelense, Vascaíno apaixonado, nascido do bairro de Botafogo/RJ chega aos 80 anos; e 80 anos é uma condição plumária de algumas pessoas especialíssimas, situadas planando alto acima de todo bem e adversidades.

(foto divulgação)

O nosso Paulo César Baptista de Faria descende da genealogia dos grandes músicos populares, tendo escolhido o samba, expressão máxima da musicalidade universal (ainda que os mais puristas torçam o nariz e arrepie a sua branca cútis), o samba como forma rítmica e comportamental mais elaborada, acabada, da expressão musical, Paulinho segue a estirpe, a linhagem do principado da elegância conceitual do mestre Paulo da Portela, Ismael Silva, João da Baiana, Donga, o Orun das divindades na constelação de sambistas.

Desde muito cedo acompanhou o seu pai em rodas de choro que contavam com as ilustres presenças do Santo Pixinguinha, Jacob do Bandolim, Conjunto Época de Ouro. Fundou o bloco “Foliões da Anália Franco”, andou pelos subúrbios cariocas de Vila Valqueire à Bento Ribeiro, por escolas de samba até ancorar na Escola de Samba Portela em 1964, com 19 anos de idade, a convite do seu primo Oscar Bigode, diretor de bateria portelense.

Chegou e ficou: logo teve um encontro com a ala de compositores, reunida no Bar do Nozinho, onde mostrou a primeira parte do samba “Recado”, prontamente concluída por Casquinha e assim, ganhando o seu primeiro parceiro e a sua aprovação como compositor integrante da ala de compositores da Portela. Em 1966 teve o samba enredo “Memórias de Um Sargento de Milícias” escolhido para representar a Escola.  

O seu tempo é chama, não o tempo martelando no limite das horas, mas na liquidez das águas do rio que a tudo verte, flui e preenche, ocupa as margens, embebendo a vida lentamente, o tempo é a sua matéria, como poeta Drummond assinalava: “o tempo presente, os homens presentes”.  

Como personalidade grandiosa no Pantheon do Orun, o filho predileto, o Oxaguiã que nos motiva e inspira com espírito de lutar e a vontade de vencer, qualidade única de quem tem a autorização de enfeitar seus colares brancos com pedrinhas azuis como as cores da sua querida Águia de Oswaldo Cruz.

Marceneiro, eletricista, restaurador de carros, luthier, relojoeiro, jogador de sinuca, O nosso querido Paulinho é um poeta múltiplo e fundamental no cenário-catedral do samba. São 28 álbuns lançados e parcerias históricas com Cartola, Elton Medeiros, Hermínio Bello de Carvalho, Candeia, Zé Kéti, Mauro Duarte e Aldir Blanc; além de gravações magníficas, como: Sinal Fechado, Depois da Vida (Nelson Cavaquinho), Orgulho (com Capinan), Sentimento, Sei Lá Mangueira (com Hermínio), Foi um Rio que Passou em Minha Vida.

Centenas de outras músicas, bem poderiam, todas elas, serem magnificamente condensadas como iluminuras no maravilhoso “Bebadosamba”, do disco homônimo de 1996, como uma prece dolente de fina poesia, oferenda em forma de samba raiado, Padê-ofertória para as divindades musicais, um relicário para a carne da nossa mais legítima e viva manifestação, o Samba, a mais intensa expressão da nossa musicalidade. Viva o Mestre Paulinho da Vila, nos seus 80 anos de vida, versos e sambas imortais.