A aguardente e a cachaça são bebidas alcoólicas brasileiras por excelência. A diferença entre elas está em seu método de produção. A aguardente é produzida industrialmente em grandes quantidades com destilação em coluna e tem teor alcoólico de até 54 graus. Já a cachaça é artesanal, destilada em coluna ou alambique e costuma ter maior qualidade, com teor de até 48 graus.
No exterior a cachaça brasileira foi e ainda é muitas vezes confundida com o rum caribenho – as duas bebidas são produzidas a partir da cana de açúcar. Daí decorre que a cachaça brasileira não possui nem de perto a “aura” que os runs cubano ou jamaicano desfrutam no mercado internacional. Esse problema tem algumas explicações. A principal delas é a falta de controle de qualidade e de origem das 5 mil a 7 mil marcas comercializadas no Brasil.
Desde os anos 1990, diversos grupos de pesquisa tentam desenvolver marcadores químicos que possam tanto tipificar a cachaça nacional quanto traçar a sua origem geográfica, a região e o estado onde é produzida. A necessidade de garantias de procedência e de qualidade é defendida pelo Instituto Brasileiro da Cachaça (Ibrac), que tem interesse em utilizá-las para classificar a produção nacional e alavancar as exportações. De acordo com o Ibrac, o Brasil produz 700 milhões de litros de cachaça por ano, com movimentação de R$ 1,4 bilhão. O total exportado é de apenas 10 milhões de litros, equivalentes a US$ 17 milhões.
Uma vez disponíveis tais marcadores químicos, será possível outorgar aos produtores de cachaça artesanal um Certificado de Origem, a exemplo do que ocorre com o vinho europeu, chileno e argentino. Avanços importantes nessa direção têm sido alcançados pelos pesquisadores do Laboratório para o Desenvolvimento da Química da Aguardente, do Instituto de Química de São Carlos (IQSC), da Universidade de São Paulo (USP).
A equipe do IQSC já desenvolveu marcadores químicos para verificar várias propriedades da cachaça, como publicado na Food Chemistry.
As conquistas mais recentes são a detecção da origem do fermento usado na composição da cachaça, conforme artigo publicadono Journal of Food Composition and Analysis, e a primeira tentativa bem-sucedida de detecção de origem geográfica da cachaça, com procedência nos estados de São Paulo e Minas Gerais ou na região Nordeste, trabalho que acaba de ser publicado noJournal of Food Science.
Como no Brasil não existe um padrão para a fabricação de destilado de cana-de-açúcar, diversos processos regionais e até mesmo locais são usados, gerando destilados com diferentes perfis sensoriais e químicos, diz Douglas Wagner Franco, do IQSC. “A cachaça possui mais de 300 compostos químicos. A distinção que estabelecemos é baseada na análise quantitativa desses compostos químicos e como variam as proporções dessas concentrações nas diferentes amostras.” (Da agência Fapesp)
Toda cachaça é uma aguardente, e nem toda aguardente é uma cachaça. Cachaça é a denominação típica e exclusiva da aguardente de cana produzida no Brasil, com graduação alcoólica de trinta e oito a quarenta e oito por cento em volume, a vinte graus Celsius, obtida pela destilação do mosto fermentado do caldo de cana-de-açúcar com características sensoriais peculiares, podendo ser adicionada de açúcares até seis gramas por litro. A principal diferença no processo de produção entre os dois destilados, é que o rum é feito com o caldo cozido da cana, o melaço, um subproduto do processo de produção do açúcar. Já a cachaça, historicamente, sempre foi feita com o suco fresco, que chamamos de garapa. O nome cachaça é protegido por lei e a sua produção está restrita ao Brasil. Vale frisar que , além do IQSC , o laboratório da ESALQ-USP em Piracicaba vem há alguns anos fazendo estudos e análises , trabalhando com afinco, eficiência e eficácia em prol do desenvolvimento e aprimoramento da nossa cachaça. Sou Mestre Alambiqueiro, Cachacier, estudioso da cachaça e produzo por hobby nossa Rainha das bebidas para consumo próprio e para os amigos. Boa matéria, sugerindo a Carta Campinas que nos traga mais informações e reportagens sobre a mais brasileira das bebidas. Antenor Albuquerque. Campinas Sp.
Acho louvável o interesse dos pesquisadores que assinam o artigo, mas lamento algumas incorreções imperdoáveis, a falta de conhecimento sobre o que já foi feito a respeito de Indicação Geográfica da cachaça brasileira e ainda algumas propostas de trabalho a meu ver equivocadas. O Brasil tem uma legislação específica pro setor da cachaça, que é regulado pela lei 8.918, de 14 de julho de 1984, que “dispõe sobre a padronização, a classificação, o registro, a inspeção, a produção e a fiscalização de bebidas …”, pelo Decreto nº 4062, de 21 de dezembro de 2001, que “define as expressões ‘cachaça’ e ‘cachaça do Brasil’ como indicações geográficas …”, e pela Instrução normativa nº 13, de 29 de junho de 2005, que “oficializa a cachaça como denominação típica e exclusiva de aguardente de cana produzida no Brasil”. Nestes instrumentos está definido que “cachaça é a denominação típica e exclusiva da Aguardente de Cana produzida no Brasil, com graduação alcoólica de 38 % vol a 48% vol a 20ºC, obtida pela destilação do mosto fermentado do caldo de cana-de-açúcar com características sensoriais peculiares, podendo ser adicionada de açúcares até 6g/l, expressos em sacarose”. Note-se que não há nenhuma menção a respeito da forma de destilação, o significa que a cachaça pode sim ser produzida tanto em alambique quanto em coluna, sem importar a quantidade. O termo “artesanal” também não existe na legislação, o que derruba essa diferenciação que o autor faz entre industrial e artesanal. Já a aguardente de cana está definida na lei como a bebida obtida pelo mesmo processo de destilação do caldo fermentado, só que com graduação alcoólica superior a 54 % em volume e inferior a 70 % em volume, podendo ser adicionada de açúcares em até 30%. Já as aguardentes são bebidas destiladas produzidas a partir de qualquer produto que tenha açúcares naturais e possa ser fermentado. Ou seja, a cachaça também é sim uma aguardente, assim como o uísque, o conhaque, a grappa, a bagaceira, o saquê, a tequila, o arak, o pisco, o poire e muitas outras. O segundo ponto a ser questionado é a alegada falta de controle de qualidade da cachaça brasileira, o que não é verdade. Pra ser comercializada no país, ou pra ser exportada, toda cachaça precisa ser registrada no Ministério da Agricultura, que é encarregado de fiscalizar a observância dos parâmetros legais pelo fabricante do produto. Ou seja, se há um parâmetro e um órgão fiscalizador, há controle de qualidade. Outro problema muito diferente disso é a clandestinidade, que continua sendo grande no país mas felizmente não é a regra da produção nacional, além do que é praticamente impossível que um produtor clandestino consiga exportar alguma coisa. Ressalvando o fato de eu não ser químico, também tenho muitas dúvidas em relação à ideia de procurar marcadores químicos pra identificar a origem da cachaça. O relativo sucesso neste sentido obtido pelos pesquisadores que assinam o artigo é perfeitamente esperado, dado que os mestres cachaceiros de uma determinada região têm métodos de trabalho praticamente iguais. A pergunta que fica é a seguinte: e se levarmos um produtor de uma região pra outra, a cachaça que ele fizer terá as características da sua região ou da região onde ele fez a cachaça? Finalmente, esse trabalho todo me parece inútil, já que o INPI, Instituto Nacional de Propriedade Industrial, já tem um sistema perfeitamente definido de concessão de indicação geográfica pra cachaça, com três regiões já tendo obtido esse diploma, a saber, Parati, no Rio de Janeiro, Salinas, em Minas Gerais, e a microrregião de Abaira, na Bahia.
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Não foi a toa que escrevi que matéria era boa e que coluna trouxesse mais informações. O Sr. Sidnei Maschio ´ está encarregando-se de trazer as mesmas e tem autoridade para isto. É um dos integrantes da “Cúpula da Cachaça”. Possui vasta experiência , conhecimento, e um imenso acervo de dados e informações relacionados a nossa cachaça. Não é a toa sua insatisfação sobre equívocos e algumas incorreções imperdoáveis e de conhecimento sobre a bebida da parte dos pesquisadores que assinaram o artigo.