Qualquer cidadão norte-americano pode comprar uma arma com facilidade e ter garantia de porte. É um direito baseado na Segunda Emenda à Constituição, promulgada em 1791. O texto prevê que a “autodefesa” é um direito que não pode ser restringido nem desrespeitado. Uma pessoa pode usar uma arma para se proteger, mas há distorções e elas acabam usadas em outras situações.
O jovem Dylan Roof, 21 anos, por exemplo, preso e apontado como suspeito de ter matado nove pessoas na Igreja Africana Metodista Episcopal em Charleston, Carolina do Sul, havia ganhado uma arma de aniversário, dois meses antes de utilizá-la para cometer o crime, motivado por racismo.
Os tiroteios, atentados e massacres em escolas, igrejas e outros espaços públicos abalam os Estados Unidos e são noticiados com frequência. Entidades civis e organizações não-governamentais tentam conscientizar a população e defendem o maior controle, como defendeu Obama. A coalização Stop Gun Violence (Pare a Violência da Armas) reúne milhares de norte-americanos em busca de apoio para pressionar o Congresso a votar medidas restritivas, mas encontra resistência.
“Se muita gente se reúne para tentar frear o uso de armas, de outro lado, uma quantidade grande resiste e participa ativamente das campanhas das entidades favoráveis à liberdade sem restrição, também amplamente apoiada pela indústria das armas”, disse Kamau Franklin, diretor regional do Comitê de Serviço Amigos Americanos, uma entidade que atua em defesa dos direitos civis no país.
O ativista lembra que instituições como a Associação Nacional do Rifle (NRA, sigla em Inglês), atuam fortemente junto ao Congresso enviando cartas e e-mails aos senadores para defender o porte de armas e a manutenção das leis atuais. “A NRA é muito ativa e recebe apoio financeiro da indústria bélica”, afirma. “Muitas campanhas eleitorais são patrocinadas pelo lobby das armas”.
A NRA foi criada em 1871 e hoje tem mais de 4,5 milhões de associados que contribuem financeiramente com a causa defendida pela organização. A Agência Brasil conversou com uma moradora de Atlanta, de, 63 anos, que pediu para não ser identificada na entrevista. A família dela participa da associação e diz que não ter uma arma é algo “inconcebível”.
“Para nós, é poder se defender é como ser cidadão”, disse. “Você tem direito a ter esse direito se nasce neste país”. Sobre os casos de violência ela pondera: “Não é o fato de ter ou não ter uma arma que faz a pessoa cometer um crime”.
Mas as mães que perderam filhos em tiroteios em escolas argumentam o contrário. E se organizam para pedir por mudanças nas leis e por restrições do porte de armas em espaços públicos. A ONG Mães Demandam Ações por Conscientização do uso de Armas realiza trabalha com base em depoimentos de mães que perderam os filhos. A entidade promove caminhadas, vídeos e campanhas nas redes sociais.
Os parentes de vítimas se organizam como podem e agem também individualmente. Na última sexta-feira (31), o norte-americano Tom Teves publicou um artigo em um jornal de Louisiana falando sobre a morte do filho de 24 anos, Alex, atingido há três anos, em um episódio de tiroteio em um cinema.
“Algo está muito errado na nossa sociedade”, diz o início do texto. “É muito tarde para ter Alex de volta e as outras vítimas recentes como as da Igreja. Mas não é tarde para proteger nossas crianças”, escreveu.
Com relação às políticas nacionais de prevenção e programas paliativos para prevenir o uso de armas, a Stop Gun Violence diz que administração Obama mostrou comprometimento com a causa. “Acreditamos que o presidente fez o possível para prevenção”, disse Andrew Patrick, representante da entidade com sede em Washington.
Segundo ele, a opinião pública tende a oscilar entre o desejo de maior controle de prevenção ou de manutenção das regras atuais de acordo com os crimes acontecidos. Foi assim após o massacre de crianças em Newtown, Connecticut, em dezembro de 2012, quando 20 crianças e seis adultos foram assassinados por disparos feitos por um jovem cuja a identidade não foi confirmada.
Uma pesquisa feita depois do crime mostrou que mais de 50% das pessoas queriam mudanças na lei de armas, 45% não. Em seguida, o resultado mudou e o desejo pela manutenção do porte armas voltou a ter ligeira vantagem nas pesquisas de opinião.
Para Patrick, enquanto não há mais controle, a quantidade de casos de violência com armas de fogo se multiplica. “São oitenta e oito mortes por dia e 33 mil mortes por ano. Precisamos colocar um freio nisso”. (Agência Brasil / Leandra Felipe)