(imagem: douglas iuri medeiros cabral – ccl)

. Por Eduardo de Paula Barreto.

Era uma vez um cangaceiro
Que tomou a fazenda Ilusão
Ele tinha fama de embusteiro
Que domava boi com sugestão
Bastava chegar perto do bicho
E repetir num cochicho:
Você é um boizão de bem
Ai o animal se curvava
E pra tudo que escutava
Só repetia amém.
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Os bois quando dominados
Se tornavam sem noção
Prendiam nos chifres afiados
Camisetas da seleção
E usavam como viseiras
Várias páginas inteiras
Da Santa Bíblia
E nos quatro cascos
Gravavam o recado:
Em defesa da família.
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Então comiam ervas daninhas
E arrotavam capim Mombaça
Vociferavam e mugiam
Apesar de usarem mordaça
E com pose de chique
Exibiam os chifres
Como se fossem medalhas
Mas medalhas não tinham
O que no pescoço exibiam
Eram pesadas cangalhas.
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Mas num dado momento
Surgiu uma pandemia
E os bichos foram pra dentro
Aonde o cangaceiro dormia
E o viram na rede deitado
Lambendo leite condensado
E dando tiros no ar
Tentando matar os vírus
Até que um dos tiros
Ricocheteou num pilar.
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O tiro pegou no pé dele
E ele saiu desesperado
O suor escorrendo na pele
E o dedão pendurado
Então no mato sumiu
Mas a boiada o seguiu
Até um velho esconderijo
E o encontraram ajoelhado
Diante do diabo
Que ria de regozijo.
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O cangaceiro se levantou
E fez um apelo ao danado:
Fiz o que o mestre mandou
E dominei o meu gado
Agora peço com fé
Que cure esse dedo do pé
Pra que eu consiga correr
Porque comprei cloroquina
No lugar da vacina
Só pra ver a boiada morrer.
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O embusteiro foi curado
Para cumprir sua missão
Deu cloroquina pro gado
Que comeu com satisfação
E sem fazer alarde
Conduziu ao abate
A sua claque bovina
E com ela fez churrasco
Para comemorar o fato
De já ter tomado vacina.
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20/03/2021

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