Em São Paulo – O espetáculo “Void”, criação do italiano radicado no Brasil Alvise Camozzi, fica em cartaz até o dia 23 de dezembro de 2018 no Sesc Avenida Paulista. O solo relata, a partir de perspectivas distintas, acontecimentos que compõem o caso do Césio 137, um desastre radioativo que aconteceu em Goiânia na década de 1980, considerado o maior acidente radiológico acontecido no mundo, fora das centrais nucleares.

(Foto: Zarella Neto)

Alvise, que divide a direção com Beatriz Sayad, traz para o palco um relato prismático do incidente, comungando a versão oficial com relatos dos sobreviventes, a versão de quem ouviu falar sobre o caso e o imaginário que se criou acerca do ocorrido. A dramaturgia de Alvise em colaboração com a também italiana Letizia Russo, leva o espectador a questionar a real ocorrência da tragédia e a repensar o processo de sedimentação e apagamento das memórias coletivas, bem como a sensibilidade das pessoas na percepção da realidade. O projeto contempla ainda uma instalação, híbrida ao espaço cênico, que promove a interatividade entre os próprios visitantes e entre os visitantes e o espaço, complementando a experiência do espetáculo

Em “Void”, o artista italiano Alvise Camozzi retoma sua pesquisa sobre as fronteiras entre a realidade e a ficção a partir de narrativas mnemônicas. Em “Psicotrópico”, seu último trabalho, Alvise explorou a sobreposição de histórias apoiado em uma recordação pessoal, e em “Void” o artista amplia essa abordagem correlacionando com o processo de assimilação do que é real, em diversas camadas de apropriação.

“Em Psicotrópico, meu espetáculo anterior, isolei uma lembrança particular, para mim muito significativa, e a multipliquei e a sobrepus a outras narrativas ficcionais de alguma maneira especulares à minha lembrança. Eu procurava assim contaminar, com os meus fragmentos de memória, a memória do espectador. VOID é, ao mesmo tempo, uma expansão e uma inversão dessa experiência sobre os deslocamentos de percepção da realidade”- explica Alvise.

O eixo central é um episódio trágico que mobilizou e emocionou, na década de 80, a população brasileira e as narrativas relacionadas direta ou indiretamente a ele. Partindo dessa pesquisa, o espetáculo não percorre um caminho documental, mas sim de exploração das possibilidades, impulsionando o espectador a trafegar entre a incredulidade e a versão oficial.

“O conjunto das narrativas dessa catástrofe pode ser percebido como uma história de ficção científica. Também sua carga simbólica é muito significativa. A justaposição das contradições sociais, econômicas, geopolíticas, que emergem dessa tragédia, parecem uma metáfora sombria do Brasil contemporâneo. O limiar entre realidade e representação é muito incerto. O parcial desaparecimento desse evento da memória coletiva nos faz até duvidar do seu real acontecimento. Essa incerteza é o eixo da pesquisa”.

O jornalista e ativista político Fernando Gabeira, ao longo do seu livro dedicado ao desastre radiológico de Goiânia, se apropria do termo freudiano “Inquietante Estranheza” (unheimlich) para explicar a particular sensação da população frente às notícias sobre o desastre. Freud usou o termo para alinhar aquelas coisas, impressões e eventos, que conseguem despertar em nós sentimentos de estranheza, de forma particularmente poderosa e definida. A “Inquietante Estranheza”, portanto, é a sobreposição de um conjunto de narrativas, que se configuram, em sentido amplo, como um conjunto de representações que ao mesmo tempo em que relatam o evento, revelam também os símbolos onde canalizam as emoções, contaminando o factual pela ficção e vice-versa.

A proposta da instalação é a de promover a interação entre os visitantes e o espaço, e também entre os próprios visitantes, buscando memórias pessoais de maneira orgânica e incentivando o seu compartilhamento. Por meio de temporizadores, gravadores, sensores de presença, a instalação capta e reproduz essas histórias fundindo-as com a paisagem sonora, dando vida à uma multidão de vozes e sons que envolvem os visitantes. A instalação é parte do espaço cênico, o que aproxima o público da narrativa e o sensibiliza para uma experiência mais profícua.

“O conceito da instalação se fundamenta no contraste entre o ambiente vazio (do esquecimento, não representativo: ante-cênico e ante-teatral) e as “memórias sonoras” que o público pode acionar caminhando pelo espaço” – comenta Alvise.

O aparato tecnológico é controlado por um sistema tipo Arduíno e, durante as sessões de vinte minutos que ocorrem a cada meia hora, permite ao visitante o contato com uma dramaturgia sonora, que é alterada por sua movimentação e interação, construindo novas possibilidades narrativas. (Carta Campinas com informações de divulgação)

VOID
Quando: de 29 de novembro a 23 de dezembro de 2018
Horário: às 21h (quinta a sábado) e 18h (domingo)
Local: Arte II – 13º andar (70 lugares)
Ingressos: R$ 30,00 (inteira); R$ 15,00 (meia: estudante, servidor de escola pública, + 60 anos, aposentados e pessoas com deficiência); R$ 9,00 (credencial plena: trabalhador do comércio de bens, serviços e turismo matriculado no Sesc e dependentes).
Duração: 70 minutos
Classificação etária: 14 anos

SESC AVENIDA PAULISTA
Avenida Paulista, 119, Bela Vista, São Paulo
Fone: (11) 3170-0800
Transporte Público: Estação Brigadeiro do Metrô – 350m
Horário de funcionamento da unidade:
Terça a sábado, das 10h às 22h.
Domingos e feriados, das 10h às 19h.
Horário de funcionamento da bilheteria:
Terça a sábado, das 10h às 21h30.
Domingos e feriados, das 10h às 18h30.
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