O Ministério Público Federal denunciou quatro pessoas que trabalhavam para a marca de roupas Zara por manterem 51 trabalhadores em condições análogas às de escravos em uma oficina de costura em Americana, no interior de São Paulo. Entre as vítimas estavam 45 bolivianos, dos quais 13 viviam em situação irregular no Brasil.

oficina de costura
bolivianos em situação de escravidão faziam roupas para a marca Zara


A lista de denunciados inclui o boliviano Narciso Atahuichy Choque, dono da confecção onde os empregados foram resgatados, e as brasileiras Rosangila Theodoro, Sonia Aparecida Campanholo e Silva Regina Fernandes Ribeiro da Costa, respectivamente sócia e funcionárias da Rhodes Confecções Ltda..

O caso foi descoberto durante operação do Ministério do Trabalho e Emprego entre maio e agosto de 2011. Na ocasião, constatou-se que diversos desses trabalhadores se dedicavam à confecção de peças de vestuário da marca Zara, encomendadas pela Rhodes. A empresa funcionava como fornecedora direta da grife espanhola, mas, como não possuía capacidade produtiva para atender à demanda, repassava as encomendas recebidas para outras confecções, como a do boliviano.

Para o MPF, as brasileiras tinham conhecimento da situação vivida pelos trabalhadores, mas fecharam os olhos para as irregularidades visando a baratear as peças. De acordo com a denúncia, tanto Sonia quanto Silvia faziam visitas frequentes à oficina para vistoriar a produção e Rosangila, apesar de ter afirmado desconhecer as condições de trabalho no local, tinha ciência da utilização de mão de obra barata ao contratar empresas sem idoneidade econômica, como a do denunciado.

 Os empregados eram submetidos a jornadas exaustivas de até 14 horas diárias e a condições degradantes de trabalho. Diversos direitos assegurados pela legislação trabalhista eram ignorados, como o registro em carteira, fornecimento de equipamento de segurança e o descanso mínimo durante a jornada. Além disso, no caso dos estrangeiros, os três primeiros salários eram retidos indevidamente para a quitação das dívidas adquiridas com transporte e alimentação no trajeto da Bolívia para o Brasil. 

A oficina funcionava também como alojamento dos trabalhadores e as instalações eram insalubres. Segundo a denúncia, havia quartos sem ventilação, alimentos armazenados no chão e banheiros em mau estado de conservação e limpeza. No local ainda moravam três menores, sendo dois bebês.

Durante a operação do Ministério do Trabalho, o imóvel foi interditado devido às más condições de higiene e ameaças à segurança dos trabalhadores. A fiscalização constatou perigo de choque elétrico, incêndio, explosão e até risco de morte por asfixia em caso de vazamento de gás, por conta da grande quantidade de material inflamável, instalações elétricas improvisadas, extintores de incêndio vencidos e falta de ventilação.

Além disso, Narciso Choque restringia a liberdade de locomoção dos trabalhadores bolivianos por causa das dívidas adquiridas com as despesas da viagem para o Brasil, que eram pagas por ele. De acordo com a denúncia, o único portão de entrada do alojamento permanecia fechado com cadeado e nenhum dos trabalhadores consultados pela equipe de fiscalização possuía a chave.

O boliviano e as três brasileiras foram denunciados nos artigos 149, por reduzir alguém a condição análoga à de escravo, e 203, por frustrar direito assegurado pela legislação do trabalho, ambos do Código Penal. O número do inquérito para acompanhamento processual é 0001164-18.2014.4.03.6134.  (Carta Campinas com informações de divulgação)