Em Marselha, ficamos em um hotel chamado Première Classe. Apelidamos de Última Classe. Com certeza foi o hotel mais xexelento que encontramos e bastante caro para o que oferece, 45,00 Euros por noite. Ali entendemos porque hotéis longe do centro das cidades são bem melhores e mais baratos do que os do centro. Hotéis no centro geralmente são velhos e mal administrados. Os que estão longe do centro se esforçam mais para atrair os clientes e geralmente são melhores. Claro que toda regra deve ter exceções, mas o Primeira Classe não foi exceção. Do lado de fora, ruas sujas com lixos espalhados. Logo na entrada do hotel, vimos que o tapete estava visivelmente bem sujo, com um bom tempo sem limpeza.

Marselha é conhecida pelos sabonetes e aromas que produz artesanalmente. Mas o hotel exagerou. Ao entrarmos no quarto veio aquele cheiro de perfume de quinta categoria, aquele perfume de talco, desinfetante, sei lá o que é aquilo. Abrimos a janela para melhorar e com o tempo acho que nos acostumamos. O Première Classe tinha uma cama boa e uma boa ducha, o ar condicionado ótimo, mas completamente imundo na parte interna. Dava para ver as crostas de sujeira. O suporte da lâmpada que fica em cima da pia do banheiro despregou e ficou pendurado. Mas tirando isso tudo, não foi insuportável a estadia. Alguns funcionários eram bem atenciosos, mas nem todos.

O hotel é muito bem localizado, próximo do metrô e da região central. Para comer barato, próximo ao hotel há um fast food chamado O Tacos. Era tudo que precisávamos para economizar. Se encontrar esse fast food, pode ir tranquilo, é bom e barato. Comemos bastante, um taco grande mais bebida por cerca de 7 Euros cada.

Marselha é uma síntese do capitalismo. Iates aos montes, hotéis luxuosos, restaurantes caríssimos, cidade suja, com muito lixo e bituca pelas ruas. Em boa parte da Europa, como no Brasil, boa parte dos fumantes acham que bituca não é lixo e jogam em qualquer lugar. E muitos, muitos pedintes e moradores de rua.

Aliás, na Europa e, principalmente na França, há mendigos e pedintes em quase toda esquina dos centros comerciais e estações. Eles entram nos trens para pedir, restaurantes, em qualquer lugar. Até quem não precisa pedir, pede. Estava no supermercado comprando uma água, que chega a ser cerca de 1.000% mais barata do que em lugares turísticos (não é exagero), e uns garotos bem vestidos e com tênis da Nike vieram me pedir moeda. Fiquei puto com a folga da molecada.
– “je ne parle france”.
– speak inglês? Have a coin?
Nossa que folgados, pedem em inglês.
– No, no
respondi e resolvi inverter a situação:
– Je precise coins too. I am a tird world person. Je precise manjare. Do you have a coins to me? I need coins too.
Eles fizeram uma cara de interrogação e já fui indo embora.

Outro probleminha de Marselha, esse, terrível. As ruas às vezes são uns campos minados. Muito cocô de cachorro pelas ruas. Tivemos a sorte de não pisar em nenhum mole, mas um senhor que estava caminhando na nossa frente na beira da praia de Catalans pisou em uma bosta mole, escorregou e quase caiu um tombo. Ele se segurou em uma placa de trânsito e por pouco não cai de bunda no cocô do cachorro. A partir daquele momento, tomamos todos os cuidados possíveis, como em um campo minado.

Do hotel, era possível ir a pé até o Porto Velho, famoso pela foto da grande quantidade de barcos ancorados. É um bom local para uma caminhada a pé. De um dos lados há o monumento Porta do Oriente, como ficou conhecida Marselha. A França importava produtos da Argélia, da Tunísia e outros países pelo porto de Marselha. A religião muçulmana é muito presente na cidade e há muitas mulheres usando o véu sobre o cabelo, aquele que permite que o rosto apareça.

Do monumento é possível ir caminhando à beira mar até o Porto Velho. No caminho tem a Praia dos Catalães. É bem pequena, mas bem equipada e é possível tomar um banho de mar se tiver calor. Marselha tem belos passeios de barcos em praias paradisíacas, mas nosso orçamento não estava para peixe. Ali descobrimos o tanto que já tínhamos pagado de IOF (Imposto sobre Operações Financeiras). Se juntar isso à ‘cotação extra-oficial’ que a empresa de cartão de crédito cobra na hora de converter, você paga cerca de 12% atualmente. E descobre que está viajando em sociedade com os bancos e com o fisco.

O Forte de San Jean é um lindo lugar de Marselha, próximo ao Porto Velho, mas fica do outro lado em relação à Praia dos Catalães. Lá há o Museu das Civilizações da Europa e do Mediterrâneo (MuCEM). O local mistura a arquitetura antiga do Forte com a construção moderna do Museu. O local é muito grande, cerca de 15 mil metros quadrados, onde é possível de vários cantos e locais ter belas vistas para o mar ou para o Porto Velho. No Forte, há jardins no alto da construção, corredores medievais, torres e outros locais. Você pode visitar gratuitamente o Forte e só paga para entrar no Museu. Valor 9,5 Euros. O Forte foi construído no século XVII, a partir de uma construção do século XII, para reforçar a defesa da cidade. A construção moderna, J4, é ligada ao Forte por uma passarela de 115 metros.

De Marselha, seguimos via trem de alta velocidade TGV para Barcelona. Esse foi um dos erros da viagem. Ir de Paris para Marselha e depois seguir para Barcelona. Parecia um trajeto viável, mas a SNFC nos cobrou uma fortuna para nos levar até Barcelona. Uma passagem até Montpelier e outra de lá até Barcelona. Passagem para uma pessoa:  83 Euros!

O detalhe é que o trem foi um dos mais desconfortáveis e mal preparados. A parte de colocar as malas em cima do banco dos passageiros é minúscula e só cabem mochilas semi vazias ou pequenas bolsas. Com isso, as malas tem de ficar no final do vagão. O problema é que o trem lotou e foi uma confusão generalizada. Gente falando, discussão por lugar que não era marcado. Não cabiam mais malas e elas acabaram ficando no corredor, uma em cima da outra. Isso impedia a passagem das pessoas para ir ao banheiro ou descer e subir nas estações. Sem contar a falação e confusão das pessoas até se ajeitarem. Depois de toda a bagunça armada, um dos passageiros soltou essa:

– Next time, first class (algo como “dá próxima vez, vamos de primeira classe)
O vagão inteiro deu risada.

Ficamos naqueles bancos em que um fica olhando na cara do outro com uma mesinha no meio. Na nossa frente um branquelo, cara de alemão, com bigodinho e bem bombado, cerca de dois metros de altura. Um verdadeiro guarda-roupa.  O grandalhão na nossa frente parecia bufar e se incomodar com a segunda classe e a bagunça do trem. Ao lado dele, uma jovem bonita, cabelos castanhos, estilo francesinha, roupas e bijuterias estilo hippie, mas com um Iphone último tipo. Esse conjunto a deixava mais intrigante e bela. O grandalhão tentou uma conversa com a garota do lado, mas ela não deu muita bola. Vi que sobre a mesinha havia um papel e embaixo do papel, um livro do grandalhão. Tentei ler o título e pensei: “esse cara é nazista!”.
O título do livro na minha primeira visão: ‘A führer understanding the painting of orsay museum”. Na verdade era: “A fuler understanting… (Ufa!). Provavelmente, era apenas um jovem estudioso da arte. (Tião Braskaville)

Próximo destino: Barcelona

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