.Por Lilian Oliveira.
2024, morreu em 31 de dezembro. Quem era ele? O chamamos de Ano. Ele não é como nós. Sempre que um Ano morre ou logo nasce. Ele não conhece a mesma finitude temporal que nos sucumbe. Não conseguimos vê-los, tocar, quando muito o sentimos passar, às vezes um pouco tarde, mas como se diz: antes tarde do que nunca.
Comumente em novembro percebemos que ele vai morrer. Entramos em um vertiginoso estado de angustia. Clima de velório: culpas, bate aquela sensação de tempo perdido, de que poderíamos ter feito mais ou menos, que deveríamos ter estado mais presente… e um sem fim de lamúrias e de “e se…?” Porque nos demos conta do seu fim – ou do nosso.
Como não gostamos de sentir sensações desagradáveis [pelo menos de forma consciente].
Então logo nos recuperamos do luto de todos esses “e se…?”. Partiu dezembro! Festas e promessas para o novo Ano, já que ele trará consigo outras oportunidades. Não é? Sim.
Outras oportunidades para repetirmos tudo de novo! Continuaremos agindo nos pró-formas que achamos um pé no saco, mas porque é conveniente e evita que tenhamos que ter conversas difíceis e também de termos que nos a ver com o que realmente queríamos fazer. Arrumamos várias desculpas furadas, fingimos cara de Mona Lisa, procrastinamos…
Sejamos honestos. Não é bem assim que a maioria de nós faz? E depois reclamamos que somos vítimas, ficamos frustrados e sentimos inveja de quem conseguiu dar o fdse, ah sim, criticando essas pessoas.
Mudar da trabalho! E muito trabalho.
Por isso preferimos a facilidade da ilusão. De que Ano novo é o mesmo que vida nova. Como mágica, deu meia noite o último suspiro do Ano se fez. Pronto! Agora sim, aquele Ano ruim morreu e agora tudo será diferente.
Já fizemos nossas listas de metas e promessas para o próximo Ano, declarando para ele um relacionamento impecável, em troca de ter nossos “desejos” atendidos. Mas, logo que o relacionamento começa, ali pelo terceiro mês, nós já nos esquecemos da lista.
Os dias, semanas e meses vão passando, é quase novembro de novo. E não mudamos uma batata de lugar, que dirá algo em nós!
Temos medo de mudanças, de desconhecer o que pensávamos ser.
Como disse sabiamente Drummond: “É dentro de você que o Ano Novo cochila e espera desde sempre.”.
Ele que espera de nós entendeu?
Então,não trago boas novas, sinto, mas nem tanto, de nos advertir. Precisamos estar advertidos de que rituais ou listas não são mágicos, são ferramentas ou instrumento, como queiram. É preciso ação, empenho – em alguns casos até desempenho! – para funcionar e ajudar o Ano novo nascer de você. Sim de você e não do mundo para você.
Atreva-se a se colocar numa reforma a perder de vista.
Mude de opinião. Crie hábitos novos. Largue o lastro, suba no mastro e olhe mais longe, desça pelas velas, caia na água, se molhe. Não espere que a água bata sua bunda, se jogue nela e aprenda a nadar.
Se permita deixar os Pró-formas e entrar no ritmo do C’est la vie.
Não tenha medo dos seus desejos. Por mais confusos e que te ameacem deixar perdido na vida. O desejo nunca é.
Eduardo Galeno certa vez contou em algum lugar sobre uma conversa com um conhecido o qual lhe disse sobre a utopia do horizonte. Vou tomar a liberdade poética de trocar horizonte pela palavra desejo:
O desejo está lá. Caminho dez passos em sua direção, ele foge [escapa] nove passos para longe. Não o alcançamos nunca. Então você me pergunta para que serve o desejo? Para isso! Para não deixar de caminhar [desejar].
Como Alceu Valença cantou:
“Quando a vida inventou o desejo
O desejo, num outro desejo, se transformou
O desejo não para, o desejo não cansa
É o moto contínuo que a vida inventou”
Abrace seus desejos, lhe dê cadeira na sala de estar, porque se quiser tranca-lo no quartinho colocando um “P” em seu nome transformando-o em desPejo, bicho! – acho que essa expressão entrega idade – Com certeza você morrerá sufocado enterrado vivo. Então…
Lembrando Belchior se você “morreu no ano passado” que esse ano você não morra. Mate!
Mate suas certezas, aceite a incerteza e a inconstância da vida. E de ela é breve. Lembra do começo do texto?
Os anos e o tempo são infinitos; você não!
Melhor ser “perdido” na vida e ter muitas possibilidades de ser e estar no mundo, que saber a cartilha de cor e salteado cumprindo todos o pró-formas para receber o certificado de honra ao mérito no epitáfio: eis aqui uma pessoa que viveu em conforme para todos. Obs.: Não viveu a própria vida.
P.S.: Esse texto não é um aconselhamento. No máximo um provocador. Mas, entenda-o como quiser. Afinal o desejo é seu.
P.S.2: A responsabilidade também.
Feliz Ano Novo!
Lílian Oliveira. Psicanalista de função; filósofa e escritora de paixão.
@os.nos.de.nos.psicanalise