Iniciativas e pesquisadores que compõem o fórum da sociedade civil voltado à discussão social e ecológica indicam inconsistências e contradições na divulgação da administração como realizadora de práticas sustentáveis “exemplares” no planejamento urbano da cidade.
Especialistas e pesquisadores da área ambiental, integrantes de iniciativas e movimentos sociais da sociedade civil da cidade, se manifestaram por meio do Fórum Socioambiental de Campinas contestando as sucessivas divulgações publicitárias que celebram a condição de cidade “amiga da natureza”. Segundo eles, apenas na terceira semana do mês de junho aconteceram duas divulgações com o objetivo de associar o município a práticas que priorizem ações sustentáveis e de preservação ambiental, o que não seriam condizentes com a realidade.
De acordo com o grupo, o indicador de 87,5% de arborização da cidade é constantemente usado em sites e veículos ligados ao setor imobiliário, o que, segundo pesquisa não referenciada do IBGE, não é real. “A arborização urbana não é notícia, pois tornou-se um atributo de Campinas há muitas décadas. E o que resta de árvores na cidade é resultado de uma herança de sucessivas políticas de arborização e esforços da sociedade civil anteriores ao grupo que governa a cidade hoje. Atualmente, a prefeitura está batendo todos os recordes de extração de árvores”, comenta Ari Vicente Fernandes, professor, arquiteto e urbanista e ex-presidente da Fundação José Pedro de Oliveira – Mata de Santa Genebra.
Segundo Fernandes, o discurso de que a expansão urbana sobre a zona rural pode ser feita sem danos ao meio ambiente é falso. “Uma cidade sustentável – além de bem arborizada – precisa incentivar empreendimentos imobiliários dentro do perímetro urbano”, complementa, se referindo às recentes proposições e aprovações de leis (PL88/2023 e LC207/2018, proposta pela administração municipal e aprovadas pela Câmara de Vereadores de Campinas que versam sobre a flexibilização da expansão urbana sobre as áreas rurais na cidade).
Desde 1991 foram aprovados quatro Planos Diretores e, todos eles, afirmam existir espaço urbano suficiente para abrigar até cerca de 500 mil habitantes em moradias desocupadas, lotes e glebas vazias. “É preciso que sejam aplicados os instrumentos legais do Estatuto da Cidade (Lei Federal 10.257/2001) para liberar esses vazios e coibir a especulação imobiliária que insiste em mantê-los sem uso. Mas a prefeitura de Campinas não se envolve com isso e prefere ampliar o perímetro sobre a zona rural”.
O engenheiro florestal e agrônomo, mestre em Arborização Urbana, José Hamilton de Aguirre Jr., que integra a ONG “Movimento Resgate o Cambuí” e o Fórum Socioambiental de Campinas, aponta o descumprimento das leis que são referência para a manutenção da arborização da cidade, apontando um acirramento do corte de árvores nas gestões mais recentes. Ele aborda a Lei Municipal Lei 11.571/2003, que trata da arborização da cidade e preconiza pelo menos uma árvore a cada dez metros de calçada. “Tomando como exemplo um bairro central, o Cambuí, onde são realizados estudos a cada 5 anos, entre 2007, quando já havia um déficit de pelo menos 6.200 árvores, e 2017, houve uma drástica redução de árvores de grande porte no bairro. E, quando houve reposição, a substituição foi feita por plantas arbustivas e de pequeno porte. Se isso acontece em uma região central, considerada rica, podemos imaginar o que acontece nos bairros afastados do centro, que não figuram entre os cartões postais da cidade”.
O ex-secretário de Serviços Públicos de Campinas e ex-gerente de projetos da Secretaria de Recursos Hídricos e Ambiente Urbano do Ministério do Meio Ambiente, Ronaldo Hipólito Soares, chama atenção para as contradições entre os títulos e celebrações divulgadas indevidamente e as medidas tomadas pela prefeitura da cidade, apoiada pela maioria do Legislativo local, que resulta na redução das condições para a preservação e mitigação das chamadas emergências climáticas na cidade. “Esta é uma “revolução verde” às avessas, pois com continuidade deste tratamento hostil ao ambiente, o que se preconiza para a cidade são eventos climáticos que poderão acirrar grandes tragédias, tais como eventos anteriores acontecidos em Petrópolis, em Angra dos Reis, em São Sebastião, no Rio Grande do Sul (como temos acompanhado na atualidade) e tantos outros lugares”.
Por mais abertura para a participação da sociedade civil
Os agentes que compõem o Fórum também cobram por mais abertura à sociedade civil nas discussões relacionadas ao planejamento e medidas relacionadas às políticas públicas municipais ligadas às questões socioambientais, citando exemplos como a revisão do Plano Diretor e a elaboração e divulgação do PLAC – Plano Local de Ação Climática de Campinas, que está oficialmente lançado pelo prefeito esta semana, entre outras discussões.
“Para que a atuação do poder público pudesse ser considerada legítima e de fato representativa da sociedade civil, seria preciso uma postura e procedimentos mais democráticos por parte da prefeitura. Tivemos recentemente a intervenção ilegal da prefeitura nos resultados da eleição do Condema (Conselho de Defesa do Meio Ambiente de Campinas), o que exemplifica o tipo de tratamento dado à sociedade civil na formação dos conselhos ligados ao planejamento e meio ambiente na cidade. Também questionamos os prazos (sempre curtos) com que as reuniões, audiências e eventos relacionados às questões socioambientais são divulgados para que as pessoas possam se organizar para comparecerem e se manifestarem”, complementa Ronaldo Hipólito, integrante do Fórum Socioambiental de Campinas. (*com informações divulgadas em carta aberta do Fórum Socioambiental de Campinas)