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Um mês antes da tragédia climática, deputados gaúchos aprovaram projeto de destruição ambiental

(foto ricardo stuckert – pr)

Em março deste ano, pouco mais de um mês antes da tragédia climática que acontece no Rio Grande do Sul, os deputados de direita da Assembleia Legislativa do estado aprovaram, por 35 votos a favor e 13 contrários, o Projeto de Lei 151/2023, de autoria do deputado estadual delegado Zucco (Republicanos-RS), que flexibiliza o Código Estadual de Meio Ambiente para permitir a construção de barragens e açudes no Estado. Zucco é um deputado de extrema direita que se promoveu na onda do extremismo bolsonarista.

Entidades ambientalistas afirmaram que o projeto de lei conflita com a legislação federal que trata de Áreas de Preservação Permanente (APPs) e poderá ser questionada na Justiça.

No dia seguinte a aprovação, no dia 13 de março deste ano, a Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural, conhecida nacionalmente pela sigla Agapan, considerada a mais antiga associação de defesa do meio ambiente, soltou uma nota alertando para o problema. “É diante deste cenário de crise ambiental intensificada pelas mudanças climáticas que essa lei antiecológica surge em nosso estado, irresponsavelmente”. Veja nota:

Manifestação Agapan sobre aprovação do PL 151/2023, da destruição de Áreas de Preservação Permanente

Diante da lamentável aprovação de projeto de lei antiecológica – nº 151 /2023, de autoria do deputado Delegado Zucco – com votos de deputados da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, voltamos a nos pronunciar publicamente, com endereçamento a todos os parlamentares do RS (deputados estaduais, federais e senadores), governo e Estado do RS, Poder Judiciário, Ministério Público, imprensa e população gaúcha com a finalidade, desta vez, de denunciar a destruição ambiental que está sendo incentivada e legalizada no RS.

Já é irrefutável que estamos vivenciando as décadas iniciais da avalanche climática que se impõe sobre nós. Da mesma forma, já se tem inúmeras provas científicas de que as atividades humanas estão impactando o planeta de forma até então nunca vista, com enormes danos ao meio ambiente. É diante deste cenário de crise ambiental intensificada pelas mudanças climáticas que essa lei antiecológica surge em nosso estado, irresponsavelmente.

A dita lei fragiliza ainda mais o Código Estadual do Meio Ambiente ao permitir a intervenção danosa em Áreas de Preservação Permanente (APPs), algo nefasto no atual cenário global (com implicações locais severas).

A finalidade das Áreas de Preservação Permanente (APP) é preservar a biodiversidade. Os recursos hídricos são elementos de preservação dessa biodiversidade. As APPs são os nascedouros de água. Como pode ser razoável pensar em interferir nesse sistema natural complexo e já tão escasso para criar reservatórios artificiais? Trata-se de uma intervenção antrópica destrutiva e mal posicionada em um local que deve ser entendido com um santuário ecológico de maior valor.

As APPs existentes já são insuficientes para manter a preservação da biodiversidade, que estamos perdendo ao longo do tempo. Com isso, também fragilizamos nossos sistemas de recursos hídricos (águas). Qualquer impacto negativo nessas áreas de inestimável valor ecológico é sinônimo de aumento da degradação ambiental com sérios reflexos na crise climática. As APPs regulam seus microclimas e, no seu conjunto, os macroclimas de regiões inteiras.

Reservatórios artificiais podem ser aceitos em áreas antropizadas, já utilizadas para a produção agrícola, em especial quando for para produzir alimentos naturais e saudáveis que possam ir à mesa da nossa população brasileira. Portanto, ressalta-se, esses reservatórios, se necessários em função do inicial cenário de aquecimento global, já alertado há muitas décadas, devem ser feitos fora das Áreas de Preservação Ambiental, que devem ser mantidas como espaços de incomensurável valor ecológico, ou seja, que servem à preservação da vida de todas as espécies.

A criação de reservatórios dentro de APPs impacta na diminuição da biodiversidade, na inversão do processo evolutivo do ecossistema e seu serviço ambiental, no grau de umidade equilibrada da área preservada, no sistema de transporte e locomoção de fauna (corredores ecológicos), na polinização essencial à agricultura, enfim, no trabalho milenar da natureza, que só ela pode fazer por nós.

Se o objetivo for estocar água das chuvas, é preciso que se garanta todas as condições necessárias para que as chuvas aconteçam. As APPs têm grande papel nesse processo. É pouco inteligente, e até perverso, recorrer a essa sistemática proposta pelo projeto aprovado na Assembleia Legislativa do RS.

Esses reservatórios artificiais são antiecológicos, portanto, não podem estar dentro de Áreas de Preservação Permanente. Não devemos permitir, principalmente através de leis, que se ameace a biodiversidade capaz de nos proporcionar a produção necessária à vida.

O desequilíbrio ambiental proporcionado pelo modelo de produção que vem sendo colocado em prática pela humanidade, de forma geral, incluindo, em especial neste caso, o modelo tecnicista e predatório adotado pelo agronegócio, com amplo uso de venenos químicos no solo, águas e atmosfera, não deve continuar pautando nossas leis. Tampouco, nossos sistemas de justiça devem permitir que tamanhos disparates sigam “arrombando porteiras” para destruir o pouco que nos resta preservado do ambiente natural.

Devemos esse respeito e responsabilidade à população atual e às futuras.

AGAPAN – A VIDA SEMPRE EM PRIMEIRO LUGAR

Francisco Milanez – Diretor Científico e Técnico

Heverton Lacerda – Presidente

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