Não há como deter o obscurantismo depois que ele se torna majoritário no Congresso

(foto pedro frança – ag senado)

Rumo a Gilead

.Por Guilherme Scalzilli.

Os movimentos contrários à descriminalização da maconha para uso pessoal revelam os tentáculos retrógrados que aos poucos estrangulam o futuro do país. Não se trata, repito, de conservadorismo: é uma ideologia obscurantista sem molduras partidárias ou morais.

Esse espírito anticientífico prolifera no STF, no Congresso e, surpresa nenhuma, no Conselho Nacional de Medicina. Sua marca é a agressividade falaciosa: argumentos pueris, números impossíveis e paralelos ridículos como formas de violência simbólica.

A brutalidade manifesta-se no descaramento da mentira óbvia, que insulta o bom senso e o saber técnico. É um soco de ignorância nos valores civilizatórios, aliado ao desprezo ofensivo pelo interesse público. Funciona como ostentação de soberania retrógrada.

A expressão “pauta de costumes” faz parte do engodo. Iguala conhecimentos empíricos a crenças e valores, pesquisas a superstições. Em vez de comprar essa bobagem, Lula deveria refutá-la com uma campanha educativa nacional, organizada por especialistas.

Entre perplexos e indiferentes, os campos jurídico, jornalístico e acadêmico silenciam. Ninguém ousa romper as bolhas digitais e corporativas para, em nome da constitucionalidade, questionar os chutes absurdos, exigir fontes qualificadas, cobrar o decoro esquecido.

Freios e contrapesos institucionais só vigoram com heterogeneidade ideológica. Não há como deter o obscurantismo depois que ele se torna majoritário tanto no Congresso quanto nos tribunais superiores. Simplesmente porque não sobra a quem recorrer.

O caso da maconha revela como estamos próximos dessa “tempestade perfeita”. Quase metade do STF adotou as fraudes proibicionistas. Mais um ou dois votos endossando a autonomia legislativa e o retrocesso em gestação no Senado torna-se permanente.

Vimos o trailer da distopia nos golpes da Lava Jato, que derrubaram uma presidente legítima e alavancaram um fascista graças à coesão oportuna entre os Poderes. Mas hoje não lidamos com mandatos. O pesadelo que se anuncia terá longuíssima duração.

A cada abuso impune o rolo compressor avança mais. Sua força é a irreversibilidade. Um centímetro de ruína leva décadas para ser corrigido, na otimista hipótese de surgir o necessário ambiente político. E o remendo nunca alivia o estrago consumado.

Ironicamente, a maconha está servindo como “porta de entrada” para a naturalização da barbárie. Sem obstáculos contramajoritários, o misticismo instaura os precedentes que levam à hegemonia das pautas fascistas. Os democratas não perdem por esperar. (guilherme scalzilli)

Recent Posts

Mulheres protestam em todo Brasil contra o feminicídio e a violência do machismo

(foto marcelo camargo ag brasil) Mulheres de diversas cidades brasileiras saíram às ruas neste domingo…

17 hours ago

Ciclo sobre cinema e psicanálise exibe a comédia ‘Boa Sorte, Leo Grande’ com Emma Thompson

(imagem reprodução - divulgação) O projeto “O Eu, o Isso e o Cinema” realiza no…

2 days ago

Campinas Hip Hop terá dez horas de shows gratuitos, com Mano Brow e mais 19 artistas; confira a programação

(foto jeff delgado - divulgação) Um dos maiores encontros de cultura urbana do Estado de…

3 days ago

Concerto de música sacra na Catedral celebra a padroeira de Campinas

(foto firmino piton - pmc) A Catedral Metropolitana de Campinas será palco neste domingo, 7…

3 days ago

Congresso invade competência do governo Lula e sequestra R$ 13 bilhões do orçamento

(foto fabio rodrigues pozzebom - ag brasil) O Congresso Nacional aprovou nesta quinta-feira (4) o…

3 days ago

15º Encontro de Folias de Reis no Casarão acontece neste domingo em Barão Geraldo

(foto fabiana ribeiro - divulgação) O Centro Cultural Casarão, em Barão Geraldo, recebe neste domingo,…

3 days ago