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Dez Pontos sobre as eleições 2022 (1º turno)

.Por André Henrique.

  1. PL bate recorde e elege 99 deputados. Partido do mensaleiro e ex-presidário Valdemar da Costa Neto, aliado de Jair Bolsonaro, o ‘honesto”. Com isso, a tendência é o centrão e os caciques da política coronelista ficarem mais fortes. Viva a luta contra a “corrupção”, não é mesmo? Bolsonarista não está nem aí para corrupção, o que importa pra eles é ganhar; meios são detalhes. Eles trocam de narrativas como de camisas, de acordo com as conveniências: ora as urnas são fraudulentas e ora comemoram resultado delas, quando lhes convém. E por aí vai.
(foto reprod. rede social geraldo alckmin)
  1. O interesse de fundo, do clã Bolsonaro, é esgarçar o processo democrático e derrubar as colunas da República. As demais forças (centrão, pastores, empresariado, neoliberais etc.) o orbitam por interesse, mas a presença do Bolsonaro na presidência por mais 04 anos significará via de regra crises políticas e institucionais sucessivas, expansão das máfias (exemplo: milícias), destruição de políticas e aparelhos públicos (das áreas de cultura, ciência e tecnologia, perseguição às universidades e povos indígenas etc.) e ataque incessante à república (traduzindo: desobediência às leis e aparelhamento de instituições para o interesse de Bolsonaro e seus aliados). É grave!
  1. Polarização esquerda versus extrema-direita é mundial e se repete no Brasil. Infelizmente com um dado que favorece a extrema-direita: Bolsonaro tem a máquina e com ela mais pernas e braços para conquistar votos legal e ilegalmente. Porém, máquina pela máquina e dinheiro pelo dinheiro não são mais determinantes como outrora porque a disputa pelos valores engoliu essas perspectivas e é o novo formato das disputas eleitorais no Brasil, na América Latina, nos EUA e Europa.
  1. Liberais e socialdemocratas perderam força eleitoral e estão diluídos na polarização esquerda versus extrema-direita. Vide São Paulo. O PSDB reúne setores da centro-direita liberal e foi atropelado pelo bolsonarismo (extrema-direita) e pelo petismo (esquerda). As disputas eleitorais serão cada vez mais ideológicas, aumentando a necessidade de organização coletiva e formação política.
  1. O neoliberalismo está em crise, como sistema econômico, mas segue atomizando os indivíduos com “desindicalização” e novas formas de trabalho cada vez mais individualistas e precarizadas. Decorrem da exclusão social e dos problemas de imigração o avanço do neonazismo na Europa e do neofascismo na América Latina. Da exclusão surgem massas críticas de ressentidos vulneráveis a discursos de ódio e conspiracionistas da extrema-direita e a teses anarcocapitalistas de negação do estado. As máfias crescem à margem do sistema, no caso do Brasil, especialmente no RJ, com as milícias e igrejas evangélicas fazendo cada vez mais às vezes de estado nas periferias. É inegável o papel das igrejas tanto na assistência social quanto determinando o voto, na hora derradeira. Cumpre citar o avanço do garimpo ilegal, dos madeireiros e do armamentismo no campo determinando quem vive e quem morre.
  1. Em contraponto, a esquerda propõe o regramento da sociedade com planejamento econômico e direitos sociais para arrefecer a exclusão social. Também a esquerda se contrapõe ao fascismo ao defender as minorias e a diversidade. Entretanto, mesmo na esquerda se vê a reprodução do neoliberalismo à medida que o “calculismo” individual e o “identitarismo” se sobrepõem à organização coletiva. Não basta A se eleger, B ganhar seu financiamento, C o seu carguinho e D minoria ser contratado pela CNN e a esquerda comemorando a vitória individual e representativa do sujeito enquanto ele se jacta com o crachá da empresa nas redes. É preciso se organizar para garantir vitórias coletivas e de classe.
  1. Portanto, cresce a importância de a esquerda se estruturar em coletivos para fazer formação política e a disputa política e cultural no território. Dentro das polícias, igrejas, parlamentos, nas periferias, no campo e nas cidades. Para isso, eleger Lula é importante porque com a máquina haverá instrumentos para avançar a organização e as conquistas por mais direitos. Contudo, a esquerda não poderá cometer o mesmo erro de dantes e individualizar os processos de conquista. Exemplo: “EU ganhei meu apartamento do Minha Casa Minha Vida e agradeço a DEUS pela MINHA conquista”. É esse indivíduo despolitizado que conquistou uma moradia graças à política e a um governo de esquerda e votou no Bolsonaro porque o pastor mandou. Sacaram?
  1. O bolsonarismo não avança só por causa da rede social, mas porque a mensagem encontra receptividade na massa atomizada vulnerável aos discursos/taras fascistas e anti-estado (perspectivas contrastantes, mas que se retroalimentam). O machismo, o racismo e a misoginia estão postos e Bolsonaro dialoga com eles assim como dialoga com discursos obscurantistas e conspiracionistas que colocam uma suposta liberdade individual acima da razão, da ciência e do bem-comum (assistimos isso na Pandemia). Chamar de maricas quem ficou em casa para se proteger do vírus soa, infelizmente, como música aos ouvidos de gente truculenta. O “imbrochável” não foi dito à toa. De uma verdade não podemos fugir: Jair Bolsonaro é retrato de parte do Brasil. O neofascismo é real, tem força e é preciso parar de subestimá-lo.
  1. Resultados eleitorais surpreendentes como os dos bolsonaristas neste domingo (02) acontecem em larga medida pelos fatores elencados. O bolsonarismo avança no desregramento neoliberal. O desafio da esquerda é organizar as lutas populares para enfrentar o fascismo. Não há outra saída. E, não se trata de polarizar trabalho de base e eleições. Isso é mais uma daquelas bobagens de quem coloca em oposição classe e o debate de minorias, quando as duas perspectivas precisam se encontrar assim como a batalha eleitoral e a construção coletiva. Uma sem a outra não resolve. A querela de fundo é por valores e entre regramento/organicidade versus desregramento/individualismo.
  1. É chegada a hora de os setores centristas terem responsabilidade e colocarem a República e a Democracia, bem como a civilização, acima dos cálculos individuais e partidários e se reunirem em torno de Lula contra o fascismo. Contra o candidato que representa a destruição de políticas públicas civilizatórias e das instituições. E não basta dar apoio eleitoral, é preciso ajudar a governar. A Nova República sofreu uma rachadura a partir da Lava-Jato – um dos responsáveis por essa rachadura, Sérgio Moro, ao se reconectar na linguagem a Bolsonaro, elegeu-se no Paraná – e está em processo de desmanche com o bolsonarismo e a voracidade do centrão no governo. É preciso o reencontro das forças democráticas, de liberais responsáveis a socialdemocratas e socialistas, para reconstruírem as colunas da República – abaladas pelo bolsonarismo com aparelhamento da PF, da PGR e conflito aberto com TSE e STF – como também refazerem um pacto social para combater a miséria, gerar emprego e direitos; proteger o meio-ambiente e os povos originários, fortalecer a agricultura familiar e as políticas de inclusão social. Tais agendas vão na direção oposto à atomização neoliberal. Simone Tebet e Lula simbolizam esse reencontro e, em vários momentos, mostraram semelhanças nestes pontos. Para tanto, trabalhadores, movimentos sociais e povos indígenas precisam participar dessa construção.

André Henrique, cientista político e jornalista, responsável pelo canal Rede Popular no Youtube

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