Neonazistas do bem
.Por Guilherme Scalzilli.
A solidariedade incondicional pela Ucrânia faz parte da imagem positiva que os aliados exibem para plateias internas e externas. As aparências são tênues, contudo, e exigem o silenciamento dos debates que possam revelar suas contradições.
O maior desses embaraços vem do neonazismo ucraniano. O esforço para subestimá-lo envolve até acadêmicos e jornalistas respeitáveis, segundo os quais as milícias são poucas e esparsas, parecidas com núcleos “ultraconservadores” de diversos países.
Pois estão mentindo. O documentário “Máscaras da Revolução”, do insuspeito Canal + francês, mostra que o neonazismo da Ucrânia é nazista mesmo e se organiza em vastos contingentes militarizados. Não há fenômeno similar nas potências ocidentais.
Eis a vergonha bloqueada pelo uníssono midiático internacional: os EUA e a Europa repassam fortunas bilionárias e imenso poderio bélico a milhares de neonazistas. Como fizeram com o jihadismo afegão, fomentam a barbárie com a desculpa de combatê-la.
Decisivo na resistência aos invasores, absorvido pelo exército e mais poderoso do que nunca, o neonazismo terá destaque inevitável no futuro governo. Então nascerá outro celeiro fascista na Europa, dando-lhe o pior triunfo geopolítico que ela poderia almejar.
Mas nenhum efeito negativo da insensatez supera os crimes de guerra ucranianos, que desde já exibem as marcas inconfundíveis das quadrilhas nazistas. Massacres e torturas realizados com dinheiro e armamentos fornecidos pelas democracias humanitárias.
A adesão imediata à censura mostra que os custos da parceria miliciana, como o próprio conflito, foram antecipados. Governos e mídia corporativa bloquearam a divulgação desses riscos, garantindo que ninguém ousasse prevenir suas óbvias consequências.
Os novos macartistas alegam refrear apologias aos delitos russos, mas de fato visam blindar a causa ucraniana. O perigo vem da rejeição pública à mera hipótese de fortalecer o nazismo, não importando o número, a origem ou a serventia dos imbecis.
Uma coisa é refutar a narrativa cínica de que os neonazistas justificam a invasão. Algo muito diverso, porém, é tomar o exemplo do imperialismo de Hitler como pretexto para um endosso conveniente à sua ideologia. Esse discurso vai além da estratégia militar.
O problema não envolve a índole de Putin, a judeidade de Zelensky ou a democracia liberal ucraniana. Envolve, sim, o uso desses argumentos banais para desviar o foco da naturalidade com que o Ocidente esnoba os valores civilizatórios que afirma defender.
A normalização da ideia de que há neonazistas inofensivos é sintoma de uma patologia moral. Seu diagnóstico ajuda a iluminar as estruturas subjetivas e institucionais que têm viabilizado o avanço do extremismo, a despeito dos hipócritas apelos contrários. (Do http://guilhermescalzilli.blogspot.com/2022/05/neonazistas-do-bem.html)