Orçamento Público: onde está o dinheiro?

.Por Paulo Bufalo.

A Constituição Federal, em seu Artigo 165, estabelece o plano plurianual (PPA), a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a Lei Orçamentária Anual (LOA) para planejamento das receitas e despesas públicas, nos diferentes níveis de governo. Isso é definido através de projetos de lei de autoria dos poderes executivos que deverão ser aprovados pelos respectivos parlamentos.

(foto pmc – arq – div)

O PPA, apresentado no primeiro ano de uma gestão, deve definir “as diretrizes, os objetivos e as metas da administração pública para despesas e programas de duração continuada” para todo um período de governo, ou seja, quatro anos.

A LDO, aprovada anualmente, em geral até o final do primeiro semestre, deve estabelecer as metas e prioridades da Administração para o exercício do ano subsequente e, com isso, orientar a elaboração da LOA e dispor sobre alterações na legislação tributária, sempre mantendo a compatibilidade com o PPA, conforme determina a Constituição.

Já a LOA, ou orçamento propriamente dito, deve apontar com precisão um planejamento de receitas e despesas, bem como programas e ações que se pretendem executar ao longo do ano posterior à sua aprovação. Portanto, é nesta lei que deverão estar previstos quanto se estima arrecadar com impostos, taxas, alienações de bens e repasses de outras esferas de governo e onde ou como serão investidos os recursos arrecadados.

No conjunto, estas três legislações estabelecem o planejamento financeiro do dinheiro público e conferem aos orçamentos importância central na definição do papel do Estado (municípios, estados e União) e das prioridades dos governos. Elas refletem se as propostas e projetos apresentados à população serão, ou não, executados de fato, pois, sem dinheiro, não há infraestrutura ou política pública que se viabilize.

Ocorre que esses instrumentos de planejamento são muito complexos, nada didáticos e pouco acessíveis à grande parcela da população.

Além disso, por serem planejamentos, em certas circunstâncias, de difícil previsão, acabam não sendo plenamente executados mediante justificativas diversas como, por exemplo, num caso de “calamidade pública” onde a lei garante ao (à) chefe do Poder Executivo remanejar recursos sem a autorização do Poder Legislativo, ou numa situação econômica em que uma receita prevista deixa de ocorrer, obrigando a cortes de despesas e investimentos.

É importante lembrar ainda que, geralmente, os governos usam de mecanismos que lhes permitem certa “autonomia” em relação às ações, programas e obras previstos nas leis agindo segundo seus próprios interesses e princípios. Sobre isso é importante destacar: a) os elevados percentuais de remanejamentos que podem ser feitos pelo Poder Executivo sem qualquer análise do Legislativo; b) os remanejamentos dentro das mesmas ações não incluídos nos limites percentuais; c) as descrições genéricas de programas e ações do governo nas dotações orçamentárias que permitem várias interpretações sobre onde aplicar o dinheiro; e d) a receita subestimada, que dificulta a fiscalização pelos órgãos de controle.

Este último artifício é muito utilizado pelo governo do Estado de São Paulo e compromete as receitas em áreas onde os recursos orçamentários são vinculados legalmente como educação, saúde, universidades e o Centro Paula Souza. Estima-se que, com o uso desta última estratégia, na estimativa da Quota Parte do estado na arrecadação do ICMS para o Orçamento de 2021, o governo paulista deixará de investir cerca R$ 180 milhões nas universidades públicas estaduais.

Em Campinas o percentual de remanejamentos é de 17%, e o planejamento orçamentário é caracterizado por ações e programas cada vez mais genéricos, o que dificulta a fiscalização e permite abusos, principalmente em áreas com vinculação orçamentária. Entre o final de 2013 e meados de 2014, o governo municipal desapropriou “amigavelmente” mais de uma dezena de imóveis na cidade e, alegando que seriam utilizados para construção de unidade educacionais, utilizou cerca de R$ 80 milhões vinculados à educação, num contexto em que a cidade necessitava de milhares de vagas em creche, como até hoje necessita.

Um destes imóveis foi o antigo Colégio Ateneu, localizado na Rua Barreto Leme. O prédio que em 2009 havia sido adquirido pelo Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia do Estado de São Paulo por R$ 3 milhões, em 2013 foi comprado pela Prefeitura de Campinas por R$ 10 milhões. Só recentemente o governo anunciou o uso do prédio para instalação da Secretaria Municipal de Educação.

Por tudo isso, a elaboração, análise e execução das leis orçamentárias devem ocorrer com ampla participação popular e dos conselhos. Os governos e parlamentos precisam garantir transparência de dados, informações didáticas que permitam a todas as pessoas interessadas entenderem e acompanharem o processo, com espaços de discussão e decisão. Só assim os recursos públicos serão revertidos, de fato, em políticas públicas e investimentos de interesse coletivo da maioria da população.

Paulo Bufalo – vereador em Campinas (PSOL) e professor do Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza.