Pandemia de coronavírus: O que o governo precisa fazer para o Brasil não ter o pior inverno da saúde pública

Por Alexandre Padilha:

Em tempos de pandemia de coronavírus, o grande desafio do Brasil é estar um passo à frente em relação a dinâmica da epidemia. Temos que executar já o que queremos ter quando o maior impacto dos casos acontecer, no início do nosso inverno.

(imagem niaid)

Os dados obtidos nos demais países em relação ao coronavírus são: 5% dos casos evoluem para UTI e 10% internação. Com isso, é possível calcular a necessidade de leitos de UTI. Se essa demanda não começar a ser tocada agora, em 90 dias os leitos não estarão prontos, instalados e funcionando.

É importante lembrar que em 11 dias começa o Outono no Brasil. Em três meses, teremos o Inverno. Essa é a minha grande preocupação. Independente do coronavírus, o inverno deve ser muito complexo para as redes pública e privada de saúde. E isso é consequência do golpe e dos desmontes implementados nos últimos anos. A população vulnerável aumentou.

Na cidade de São Paulo, por exemplo, dobrou a população de rua. Em Belo Horizonte, triplicou a população em situação de rua. Os dados do Ministério da Saúde de 2019 mostram que aumentou a internação e crianças de até 5 anos de idade por pneumonia – o que é um indicador extremamente sensível sobre a perda da resolutividade da atenção primária em saúde.

Outra consequência do desmonte e da redução dos trabalhadores e trabalhadoras com carteira assinada é o aumento da população SUS exclusiva. Isso porque caiu o número de usuários de planos de saúde. Tivemos também o fechamento de diversos equipamentos importantes da Assistência Social, que são equipamentos decisivos, por exemplo, os leitos de longa permanência para idosos e casa de acolhimento para idosos.

Como já foi em 2019 este desmonte do SUS já mostrou seus sinais, não à toa aumentou mortalidade de dengue e aumentou internação por pneumonia de crianças até 5 anos de idade. Podemos ter um inverno rigoroso com uma pressão maior sobre esses serviços públicos de saúde com o coronavírus. Pessoas que normalmente ficariam em casa por conta de um resfriado, procurarão os Prontos Socorros e as UPAs.

Não podemos titubear em nenhum protocolo de segurança, como o que ocorreu com a ANVISA, que teve dificuldade de manter todas as equipes de vigilância nos portos e aeroportos em janeiro e fevereiro deste ano. Essa situação é inaceitável. Precisamos nos antecipar para que não exista essa redução de equipes, com dificuldade de plantão.

Se for preciso, é necessário que seja feita mobilização de funcionários de outras áreas, inclusive convocar aposentados. Só assim poderemos ter a presença completa das equipes de vistoria nos portos e aeroportos.

Sobre vacinação: eu defendo e espero que o Ministério da Saúde concretize a redução da faixa etária para 55 anos. Precisamos aproveitar essa oportunidade para vacinação de influenza.

Também é preciso garantir médicos em equipe da família que hoje estão sem esses profissionais, como nas capitais, nas regiões metropolitanas, nas comunidades como a Rocinha, todas as áreas vulneráveis. É necessário que o Ministério da Saúde faça a reposição imediata dos médicos, se não houver atenção primária forte, a sobrecarga sobre os hospitais vai ser impossível de controlar. Essa reposição, ao que parece, começará a ser feita brevemente, pois o Ministério da Saúde, que havia cancelado editais do Programa Mais Médicos para as capitais e regiões metropolitana, soltou novo edital nesta quarta-feira (11). Mas é necessário trazer os médicos brasileiros formados no exterior e os médicos cubanos que moram no Brasil.

O Ministério da Saúde também precisa atuar em outra frente, que é o acompanhamento econômico e a regulação econômica dos itens. É preciso ser fortemente enfrentado o aumento abusivo do preço das máscaras, do álcool em gel, ou seja, do conjunto dos produtos.

Neste momento, sugiro que a ANVISA, que coordena nosso sistema de vigilância, reúna as vigilâncias estaduais e municipais, e o CONASS e o CONASEMS, sob coordenação do Ministério, para definir critérios para determinações sanitárias de bloqueio de eventos. Isso precisa ser feito de forma prévia, pois, com o crescimento dos casos de influenza, doenças respiratórias e coronavírus é preciso gerar medidas de contenção de eventos descoordenadas. O resultado será o crescimento da preocupação da população e uma descoordenação nacional das ações.

Alexandre Padilha é médico, professora universitário e deputado federal (PT-SP). Foi Ministro da Coordenação Política de Lula e da Saúde da Presidenta Dilma Rousseff. Foi Secretário de Saúde de São Paulo na gestão Fernando Haddad.