Governos ignoram população em situação de rua
.Por Paulo Bufalo.
O Brasil tem mais de 101 mil pessoas em situação de rua, segundo estudo divulgado em 2016 pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA que considerou dados do Sistema Único de Assistência Social – SUAS, além de fatores populacionais e de vulnerabilidade social.
O IPEA estimou o número da população em situação de rua conforme o tamanho das cidades, em todas as regiões do país e recomendou aos governos locais a realização de estimativas e análises socioassistenciais próprias. Reafirmou também a necessidade desta população ser considerada nos censos oficiais feitos do país.
Esta é uma antiga reivindicação dos movimentos pelos direitos humanos da população em situação de rua, pois é fundamental no combate da invisibilidade desta população e na elaboração de políticas públicas de atendimento.
Os poucos estudos realizados por cidades brasileiras mostram o aumento das pessoas em situação de rua. O censo na cidade de São Paulo apontou a existência de 8.706 pessoas nesta situação em 2000 e 15.905 em 2015. Estimativas mais recentes falam em cerca de 20 mil.
Na cidade de Campinas, eram 343 pessoas nesta situação em 2012 e 623 em 2017, segundo o Programa Cidades Sustentáveis. Dados oficiais recentes falam em mais de 700 pessoas.
O desemprego, que atinge mais de 13 milhões de pessoas no Brasil conforme os dados mais recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE é um dos principais fatores que influenciam a ida e a estruturação nas ruas.
Porém, existem outros fatores que aumentam a complexidade desta questão social. O trabalho esporádico e precário, ausência de políticas habitacionais, miséria, abandono e rompimento de laços familiares, violações de direitos humanos, violências policiais, dependência de drogas legais e ilegais, comprometimentos da saúde física e mental, ausência de perspectivas para egressos do sistema prisional, entre tantos outros.
Devido a esta diversidade de fatores, seu enfrentamento requer, além de diagnósticos precisos, a adoção de políticas públicas estruturais e humanizadas de assistência social que garantam redução de danos, alimentação, atendimento emergencial em saúde, guarda de pertences, banheiros e espaços de higiene, construção de vínculos, moradias transitórias, acolhimento de seus animais, emissão de documentação, formação e trabalho. Tudo isso necessita investimentos, mas, sobretudo, inversão de prioridades políticas pelos governos.
Em 2016, Campinas realizou uma grande obra na Avenida Francisco Glicério, onde estão algumas das principais aglomerações de pessoas em situação de rua no centro da cidade. A obra chamada de “requalificação”, apesar da qualidade precária, fez muitas mudanças na via e custou R$ 33 milhões entre dinheiro público e privado, no entanto, no mesmo período nenhum investimento considerável foi realizado em políticas que pudessem mudar os destinos das pessoas que viviam e continuam vivendo naquele território. Isto lembrou-me Eduardo Galeano em Veias Abertas da América Latina: “o que sobra é gente.”.
Paulo Bufalo é professor e ex-vereador de Campinas