.Por Carolina Violante Peres.
Carnaval… tempo de festa e alegria! Os amigos se reúnem, os pais fantasiam as crianças com capricho, os blocos, bem ensaiados, saem pelas ruas da cidade espalhando sua música contagiante; todo mundo vibra, sentindo a onda de energia boa que é gerada por tantos seres humanos unidos em um momento raro de brincadeira e felicidade…Bom, este deveria ser o sentido genuíno do Carnaval, mas não é exatamente isto que temos observado nos últimos anos aqui na cidade de Campinas.
Barão Gerado de Rezende, distrito de Campinas onde se localiza a Unicamp, tem sido alvo de ataques ferozes, injustificados, desrespeitosos e fora do procedimento, da Guarda Municipal aos foliões durante os carnavais dos últimos 4 anos. O último destes ataques à alegria do povo ocorreu neste sábado de carnaval, dia 2 de março de 2019.
Era por volta das 23:15 horas da noite do dia 2 de março, quando uma chuva muito forte despencou sobre a Vila Santa Izabel, bairro tradicional de Barão Geraldo, atingindo os foliões que se divertiam ao som do Bloco União Altaneira. O bloco havia iniciado uma concentração nos portões de cima da Moradia Estudantil da Unicamp, e prometia muita festa até as 3 horas da manhã do dia seguinte, como constava nos sites com a programação cultural de Campinas para o Carnaval de 2019.
Ali se divertiam crianças, adultos, idosos, adolescentes, enfim, gente de toda idade. O clima era de paz, amor e alegria. O maracatu desfilava com suas jovens dançarinas, e os mini-carros alegóricos do bloco coloriam a rua. Tudo muito organizado e saudável. Porém, quando a tempestade despencou, o povo que se divertia nas ruas correu todo para o posto de gasolina Ipiranga, localizado na avenida Santa Izabel, próximo à portaria de baixo da Moradia Estudantil da Unicamp.
Eu mesma estava lá, e também busquei abrigo no posto. Caminhei ao redor da multidão, brinquei com as pessoas, observei tudo muito bem, e de fato, como podem relatar muitos outros presentes no momento, não estava acontecendo qualquer ato de vandalismo, qualquer tentativa de furto, qualquer briga, ou seja, nada que justificasse a ação violenta perpetrada pela Guarda Municipal na sequência dos fatos.
De repente surgiram vários carros da Guarda Municipal, e logo a multidão começou a ser atacada por policiais imensos com bombas de gás lacrimogêneo, balas de borracha e spray de pimenta. As bombas foram jogadas bem no meio da multidão, deixando pessoas sem terem para onde correr, e levando elas a saírem atropelando umas às outras, na tentativa de fugir do gás que contaminava o pouco ar existente no local, então abarrotado de pessoas.
Uma covardia imensa da Guarda municipal, um ato completamente desnecessário, e que deixou alguns feridos, crianças de colo intoxicadas, e muitos, como eu, traumatizados e revoltados com tanta violência gratuita. Uma festa linda transformada em tragédia sob o comando de nosso prefeito Jonas Donizette (PSB).
Trabalhadores honestos, cidadãos de bem, professores, advogados, empresários, caixas de mercado, gente de todas as profissões, e todos pagadores de impostos, estavam presentes no momento do ataque brutal da Guarda Municipal (GM).
A GM alegou que o posto estava sofrendo uma tentativa de furto, mas isto é uma grande mentira, já alegada pela GM em relação a outros carnavais de Barão Geraldo, visando justificar suas ações violentas e ilegais; pois nada além da paz e da alegria reinava naquele local. Eu e outras pessoas, com as quais estou em contato, podemos testemunhar este fato! Como disse o colega Lucas Galesco Rosselli, sobrinho do Sargento Galesco, da Rota de São Paulo, em depoimento compartilhado em grupo de WhatsApp que criamos para coletar denúncias de violência policial gratuita durante o carnaval:
“(…) a Guarda Municipal chegou jogando spray de pimenta, bombas e dando cacetadas indiscriminadamente contra todos que ali estavam, O POVO, apenas se protegendo da tempestade num dia de festa popular. Eu estava próximo da loja de conveniência do Posto e posso afirmar que não houve qualquer movimento ou qualquer outro ato que ameaçasse o estabelecimento. Eram pessoas se protegendo da tempestade, não havia motivo para serem tratados com tanta truculência. Trabalhadores, Pais e Mães e até Crianças, tratados como bandidos criminosos”.
Se o problema no caso do Posto Ipiranga era invasão de propriedade, a GM poderia perfeitamente usar megafones para dispersão da multidão, ao invés de sair agredindo criança, jovem, idoso, etc, gratuitamente.
A GM, que se torna mais agressiva com os foliões a cada ano que passa, chegou ali simplesmente “botando pra quebrar”, e tratando cidadão de bem como se fosse bandido! Éramos apenas pessoas tentando se abrigar da chuva! Foi o fim do carnaval para mim, e principalmente para aqueles que foram parar no hospital, e para aqueles que tiveram o filho de colo atingido pelo gás jogado pela guarda.
Nossos impostos pagam a polícia para nos proteger e não para destruir um dos nossos melhores momentos de lazer, e para machucar nossos filhos e amigos! O relato abaixo, de Andreia Preta, artista de Barão Geraldo de Rezende, mostra muito bem o absurdo da ação da GM contra os foliões no dia 2 de março de 2019, no Posto Ipiranga da Avenida Santa Izabel:
“Socorri a Cris, que é minha vizinha, que não parava de vomitar e ficou acabada! Saímos do hospital mais de seis horas da manhã.”Já faz uns 4 ou 5 anos que a Guarda Municipal, (e vários tipos de polícia!), a mando de nosso digníssimo prefeito, está atacando o carnaval de Barão Geraldo. Compartilho com outros, como a advogada Ana Claudia Benatti Catozzi, que também sofreu o ataque da GM no sábado, dia 2 de março do presente ano, a ideia de que está ocorrendo um desmantelamento progressivo do carnaval do distrito de Barão Geraldo de Rezende, e um complô contra a festa e a alegria.
Há quatro anos, se não me engano, presenciei a primeira ação truculenta da GM no carnaval de Barão Geraldo, quando duas tropas de choque fecharam uma rua ao lado da Praça do Coco, deixando muitos e muitos feridos e destruindo uma festa completamente pacífica. Atos de vandalismo haviam sido praticados há mais de um quilômetro do local da intervenção da tropa de choque, e já haviam sido contidos.
A ação da tropa de choque na ocasião foi uma afronta ao cidadão de bem que curtia pacificamente seu carnaval na Praça do Côco em Barão Geraldo de Rezende. Participei, posteriormente a este ataque brutal das tropas de choque aos foliões, de reunião do Conselho de Cidadania e Direitos Humanos, onde foram ouvidos vários relatos sobre as agressões gratuitas praticadas pela Guarda Municipal durante aquele carnaval.
No ano seguinte a coisa foi parecida, e se via mais polícia e guardas nas ruas do que foliões! Prometi para mim mesma que não iria mais ao carnaval de Barão Geraldo, mas quebrei minha promessa este ano, afinal, um cidadão não pode ser tratado com tanto desrespeito e muito menos ter seu direito a uma festa tradicional popular lesado, devido a ações ilegais da Guarda Municipal. Porém, o problema da violência policial no carnaval se mostrou mais vivo do que nunca, o que nos motivou a escrever este artigo e a colaborar com a construção de uma denúncia coletiva ao abuso de poder da GM.
Inspirada por um dos líderes do tradicional Bloco Berra Vaca, o senhor Inácio Brito Moreira Azevedo, do distrito de Barão Geraldo, que também vivenciou a violência da GM ao longo destes anos, e pela digníssima senhora Marcela Moreira, ex-vereadora de Campinas, nossa colega de trabalho há anos e presidente do PSOL Campinas, tomei a iniciativa de unir os foliões que, como eu, se sentem lesados em seus direitos, em um grupo de whatsApp, com a finalidade de coletar depoimentos que sirvam de fundamentação a uma ação judicial.
Uma ação será movida pelo Conselho de Cidadania e Direitos Humanos. A advogada Ana Claudia Benatti Catozzi, com a qual fui colocada em contato por Marcela Moreira, também está empenhada em coletar vários depoimentos sérios de pessoas feridas durante a ação da GM no sábado, dia 2 de março, no Posto Ipiranga, bem como depoimentos relacionados a abusos de poder da GM em carnavais de anos anteriores.
Abaixo temos depoimento da Marcela Moreira, sobre o problema da violência policial nos carnavais de Barão Geraldo nos últimos 4 anos, e que denuncia uma tentativa progressiva da Prefeitura de Campinas de arruinar o carnaval de rua de Barão Geraldo de Rezende:
“Está tendo problema dessas ações truculentas desde 2015. Na minha avaliação, é uma decisão política de tentar acabar com o carnaval de rua. Em especial o de Barão, pois tem grupos bem politizados e mobilizados, que tiveram papel fundamental na luta pelo Fora Hélio. A PM ou GM seguem ordens. Não continuariam a fazer esses atos, casos seus superiores dessem um basta. Uma coisa é abuso de autoridade de um agente. Outra é uma ação sistemática, de todo carnaval fazer o mesmo: do nada chega, joga bomba, e depois fala que estava acontecendo assalto e “arruaça”.”
Marcela Moreira já havia escrito um artigo no Carta Campinas, em 2016, sobre o problema da violência policial e da GM nos carnavais de Barão. Fica aqui o link para consulta do artigo neste link.
O pessoal do Conselho Municipal de Cidadania e Direitos Humanos, representado pela figura do senhor Paulo Mariante, aliado à população que se sente lesada pela ação da GM, já está tomando as devidas medidas judiciais, e nós, cidadãos e foliões que nos sentimos lesados em nosso direito a uma festa popular tradicional saudável, daremos o peso necessário a esta ação, com nossos depoimentos. Nós, cidadãos de bem, pagadores de impostos, estamos nos unindo para lutar por nossos direitos, sobretudo pelo nosso direito à DIGNIDADE, que é o amálgama da nossa Constituição e a base da Declaração Universal dos Direitos Humanos que a fundamenta.
Todo este desrespeito ao cidadão de bem, cometido por nossas autoridades, precisa ser contido, e este é o momento de nos unirmos e lutarmos por nossos direitos.
Na segunda feira, dia 11/03/2019, às 19:30, no Salão 3 da Estação Cultura (Praça Marechal Floriano Peixoto, s/n, centro), haverá uma reunião do Fórum Permanente de Cultura de Campinas, e uma das pautas será o carnaval 2019. O problema da violência da GM durante o carnaval em Campinas será abordado e todos os que se sentirem lesados de alguma forma pela ação truculenta da GM estão convidados a participar. O Fórum é um instrumento de participação direta da população de Campinas em políticas culturais da cidade. O e-mail do Fórum para contato é: forumculturacampinas@gmail.com.
Convidamos também os nossos leitores a se unirem a uma ação da sociedade civil contra os abusos da Guarda Municipal. Esta ação, como já mencionamos, está sendo encaminhada pelo Conselho Municipal de Cidadania e Direitos Humanos. Interessados em apresentar denúncias de violência policial nos últimos carnavais de Campinas podem enviar seus depoimentos através do e-mail: repressao.carnaval.campinas@gmail.com.
Em tempos de opressão, só nos resta a união e a luta. Vamos lutar pelo direito à alegria, à vida! Ou em breve nos veremos confinados em nossos lares, sem direito à festa, ou à agremiação humana.
Não podemos aceitar ser tratados como gado, ou pior, como escravos! Fica aqui nosso repúdio às ações ilegais e desumanas da Guarda Municipal e nosso repúdio aos políticos que têm comandado este tipo de ações. Fica aqui, ainda, uma pergunta ao senhor prefeito, Jonas Donizette: como o senhor se sentiria se a GM invadisse uma festa cheia de amigos e familiares teus, e os machucasse sem motivo, acabando com a alegria de todos? Nós pagamos o teu salário, senhor prefeito, e o salário da GM, portanto exigimos RESPEITO!
Campinas, 08 de março de 2019.
Carolina Violante Peres, Professora de Filosofia na Rede Estadual de Ensino)