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O rap do petralha

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.Por Luís Fernando Praga.

Andava preocupado com o meu país,
Um lugar de gente amiga, acolhedora e feliz,
Onde o ódio mata pobre e um fascista é juiz;
Todo mundo nasce escravo, mas a globo não diz!
Corrupção, aqui, chegou bem antes do início,
Poder já era a droga, a opressão era o vício,
O dinheiro era a meta e matar era um ofício.
Tudo isso se conserva com o nosso sacrifício,
Hoje a gente só trabalha pra chegar à sepultura:
Passa o dia no corre, vai pra cama na secura,
Dorme com a esperança, sonha um monte de loucura
E acorda de conchinha nos braços da ditadura!

Meu país é uma potência, tudo é muito bonito,
Pra viver é um drama, pra morrer é “dois palito”,
Fingem que fazem justiça e eu finjo que acredito,
Bem no fundo, eu não passo é de um petralha maldito!
É que eu não acreditei em racista desumano,
Não molhei as mãos do Supremo Soberano,
Jamais entreguei voto pra miliciano,
E não dei o meu país pro império americano!

No país das maravilhas todo mundo joga bola,
Tem pastor que é vendilhão, tem mentira que cola,
Enche o rabo de dinheiro, faz que reza e nega esmola,
Tanta gente com fé, mas o amor não decola,
Porque, neste meu país, preconceito faz escola.
Porque o crente brasileiro é bem treinado é pra guerra,
Quem erra mais é o que mais finge que não erra,
Onde filho do grileiro mata o filho de sem-terra:
Se a covardia mata, a hipocrisia enterra!

Verdade verdadeira é que eu sou um derrotado
Eu queria andar pra frente, mas perdi pro passado,
Eu luto é pela paz, mas venceu a violência,
Jesus na goiabeira derrotou a ciência,
Apostei na utopia e faturei um inferno,
Justo eu, que só queria era um abraço fraterno,
Um abraço gigantesco do tamanho do Brasil,
Todo mundo é meu irmão, pouco importa quem pariu,
Mas o pesadelo existe e é real o tormento,
Sempre existe uma tragédia atrás do próximo momento,
Nossas vidas nas mãos de um Capitão “Morrimento”,
E não vale o meu lamento, aqui eu não apito,
Sou o descontentamento é de um petralha maldito!

Não confio no pastor, não confio na polícia,
Não confio na família que confia na milícia!
Eu não deixo fake news virarem minha verdade,
Vou morrer é pela luta e lutar por liberdade!
Mas eu vou viver amando, e não a mando de ninguém,
Sou petralha maldito, eu não sou gente de bem!

Tirando a escravidão, este lugar é sublime,
Matar de fome pode, mas matar a fome é crime,
O oprimido, aqui, adora bajular quem oprime,
Mas petralha é oprimido e joga é n’outro time!
Tudo é muito sinistro, verde-oliva e encarnado,
Pra não dar muito na vista eu só ando disfarçado
De esperança equilibrista sobre o fio da navalha:
Eu sou só mais um na mira, um maldito petralha!

O ódio vai pra rua, distopia medonha,
De canudo, de tambor, de gatilho e de coronha,
Quem mata é o “oitão” e a gente com peçonha,
Mas bandido bom é preto, a culpa é da maconha!
No país abençoado pela ignorância
Uns padecem de miséria, outros de ganância,
Tem nazista, tem laranja, mas nenhum que se revele;
Definiram “escória” como cor de pele,
Mas o eco de um grito não tem puto que cancele:
Quem roubou a nossa escola? Quem matou a Marielle?

Neste mundo de seu deus o que não falta é falha
A justiça é seletiva e só protege canalha!
Minha falha é a mais fatal nessa insana batalha:
Sou pobre, gay, mulher, sou índio, negro e petralha!

Meu grito vem do rap e no rap eu reflito:
Sem cultura não dá, ficou muito esquisito,
Não dá pra se pensar em se viver sem arte,
Poesia é uma linda, infinda, íntima parte...
Viver é minha arte, contundente e atrevida,
Pisa firme no calo, mete o dedo na ferida,
Se é sofrida, não me calo, o meu partido é a vida,
E meu grito vai no rap e no rap eu repito
O discurso sem censura de um petralha maldito!
Onde um gênio está preso e um medíocre é o mito,
Quem não morrer no almoço vai matar pela janta,
Mas ninguém há de ser carrasco do meu grito!
...Não sem antes cortar minha garganta.

Luís Fernando Praga mantém a Coluna Flexível com crônicas em prosa e verso, além de atuar como médico veterinário.

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