.Por Adilson Roberto Gonçalves.
O apagão democrático que vivenciamos dá luzes para reflexões e críticas. Assuntos diversos permearam o noticiário no final do ano, notadamente o mês de dezembro, mas que guardam certa relação entre si, especialmente naquilo que se rotula de retrógrado e ditatorial. Os jornais abrem espaço para comentários de leitores, que não representa a totalidade e diversidade de opiniões. Aquelas cartas que foram lá preteridas são aqui reapresentadas, com alguma edição para situar os fatos, quando pertinentes. Os golpes são tão evidentes que muitos dispensam apresentações.
Um ministro disse que o PSDB está dentro do governo, outro, que está fora. A dissimulação tucana é o símbolo de sua subida e permanência no muro, tão bem construído ao longo dos anos. Donald Trump deveria se consultar com os chamados sociais-democratas daqui para construir robustos muros, que, se não separam povos, por aqui separam a realidade da ficção vivida por esses políticos.
Nessa linha, a campanha pró-Alckmin começou um dia após sua confirmação à frente do PSDB. Em defesa de um “legado tucano em São Paulo”, omitem-se, é claro, todas as falcatruas do governo paulista com a Alstom, os acordos com o PCC, o desmonte dos institutos de pesquisa estaduais e uma longa lista. Além disso, o Poupatempo apenas funciona porque os servidores foram realocados de outros órgãos.
Morosamente a cartelização do transporte em São Paulo aparece. Ainda que seja tratada como novidade, sabemos que não haverá punição, pois a ausência de petistas nas delações impede. O governador fique tranquilo: o anestesiado povo paulista não irá às ruas exigindo sua prisão. Têm razão os que apostam que a campanha deste ano será baseada em fake news.
Soma-se a isso a notícia sobre mais um caso de corrupção em governo do PSDB, envolvendo o estaleiro que subornou a Petrobras no governo FHC. O caso parece ser apenas a ponta do iceberg, pois o ex-presidente FHC assume que sabia do caso e nada fez, já que os interesses escusos eram outros. Mas que ele fique tranquilo, porque o ambiente jurídico protege os tucanos, nunca os prendendo.
A falência do modelo atual de política para a maioria dos partidos é a notícia sobre a migração de membros do PSB para o DEM. Como agremiações que possuem essências tão antagônicas podem disputar os mesmos representantes? Precisamos investir em política maiúscula neste país.
A Folha de S. Paulo procura ser plural e abriu espaço, enorme, também para pilantras, malfeitores e bandidos. Ler o artigo de Romero Jucá “O que esperar do MDB”, de 20/12, foi por obrigação de quem deve ouvir todas as vozes, mas seu conteúdo é uma ode à ficção. O partido ônibus muda o letreiro, mas não o itinerário, acomodando tudo e todos, sendo um dos núcleos principais da corrupção embreada no país. As contradições entre o que está escrito e a prática partidária são despudoradas e, talvez por isso, causem anestesia. O citado legado de Temer com certeza não será tirado, pois já foi tirano.
Tudo é possível neste país, até Maluf ser preso e Temer dizer que tem saúde para disputar a reeleição. Além de bons médicos, que escolha bem o vice, pois se for da mesma índole que a sua, já começaria um suposto mandato ameaçado. Ao falar de Maluf, a Folha em editorial de 23/12 (Um símbolo que cai) fez bem em citar a corrupção que dilacerou o País durante a ditadura da qual poucos falam ou admitem. Mas Maluf, que já foi verbo – malufaram meu dinheiro – ainda conta com Gilmar Mendes, que mesmo falhando do teste da força de outro símbolo – o presente de Natal – ainda não mostrou tudo de que é capaz.
Finalizando o ano, a parcela dos rombos orçamentários devida à corrupção foi desprezada pelo presidente da Câmara em seu artigo “A mudança que não pode esperar”, por motivos óbvios e pessoais. Na conta fantástica que ele faz sobre a previdência – como se sua solução fosse a panaceia para todas as mazelas brasileiras –, esquece de incluir os principais devedores do sistema e o fato de que o trabalhador contribui com parte de seu salário, não sendo apenas o governo que banca o sistema com outros impostos. Isso sem contar que o exemplo deveria vir de cima, especialmente quanto aos salários e aposentadorias de parlamentares e juízes.
Adilson Roberto Gonçalves, doutor em química pela Unicamp, livre-docente pela USP e pesquisador no IPBEN da Unesp – Rio Claro.