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Exposição com obras de Lasar Segall aborda perseguição à arte moderna durante o nazismo

“Eternos Caminhantes”

Em São Paulo – Até o dia 30 de abril de 2018, poderá ser vista no Museu Lasar Segall a exposição “A “Arte Degenerada” de Lasar Segall: Perseguição à Arte Moderna em Tempos de Guerra”. A curadoria é da professora do Museu de Arte Contemporânea (MAC) da USP Helouise Costa e do pesquisador do Museu Lasar Segall Daniel Rincon. A mostra é uma parceria entre as duas instituições.

O Partido Nazista era composto de artistas frustrados. De acordo com o documentário sueco de 1989 Arquitetura da Destruição (dirigido por Peter Cohen), Adolf Hitler era um pintor medíocre com ambições na arquitetura. Joseph Goebbels, ministro da propaganda do Terceiro Reich, escreveu romance, poesia e textos para teatro. Alfred Rosenberg, o grande ideólogo nazista, pintava e se considerava um respeitável escritor e pensador. Baldur von Schirach, líder da Juventude Hitlerista, era tido como um importante poeta.

Assim, não é de se estranhar que, ao assumir o poder, os nazistas entraram no campo de batalha também no mundo das artes. E, aqui, foi declarada como grande inimiga a arte moderna. Influenciados por ideias como as do médico Max Nordau, autor do livro Degeneração (1892), Hitler e seus aliados identificaram nas obras e nos artistas de vanguarda sinais de mentes doentias e perigosas para a raça ariana. Ao romper com a perspectiva, a tradição da figuração do corpo humano e outros cânones, artistas plásticos produziam “arte degenerada”, incompatível com os anseios de representação do Terceiro Reich.

A exposição resgata outra mostra, que completa 80 anos em 2017. Em 19 de julho de 1937, o governo alemão inaugurou em Munique a mostra Arte Degenerada (Entartete Kunst, em alemão), que levava ao público cerca de 650 obras de arte moderna confiscadas de museus públicos espalhados pelo país. Selecionadas por uma comissão coordenada pelo presidente da Câmara de Artes Plásticas, Adolf Ziegler, sob orientação direta de Hitler, as peças serviam como exemplo das manifestações artísticas condenadas pelo regime. Dentre os 112 artistas com trabalhos expostos estavam Marc Chagall, Wassily Kandinsky, Paul Klee, Piet Mondrian, Max Ernst, Otto Dix e Lasar Segall.

Apesar de exibições difamatórias da arte moderna acontecerem desde a chegada dos nazistas ao poder, em 1933, a mostra de Munique era a primeira chancelada pelo governo central. Aberta ao público um dia após a inauguração da Grande Exposição de Arte Alemã, que acontecia do outro lado da rua, na suntuosa Haus der Kunst e apresentava a arte sancionada pelo regime, deveria ser o contraponto desta.

Sediada no prédio do Instituto de Arqueologia, trazia uma organização deliberadamente improvisada, com iluminação precária, painéis cobrindo janelas, quadros amontoadas de forma desleixada e inscrições nas paredes denunciando o caráter subversivo e degenerado das obras. Isso não impediu, contudo, que a exposição fosse um sucesso, excursionando por diversas cidades alemãs até 1941 e atraindo cerca de 3 milhões de pessoas.

Lasar Segall (1889-1957) nasceu na comunidade judaica de Vilna, Lituânia, na época dominada pela Rússia czarista. Foi pintor, escultor, desenhista e gravurista. Iniciou sua carreira com influências impressionistas, mas ainda jovem aderiu ao Modernismo. Depois de morar na Alemanha, mudou-se para o Brasil, absorvendo referências do país em sua arte. Viveu um período em Paris e fixou-se definitivamente em São Paulo em 1932.

Entre 1937 e 1938, já residindo no Brasil, Segall teve 49 obras confiscadas de museus públicos alemães. Dessas, 11 participaram da exposição Arte Degenerada: três pinturas a óleo e oito gravuras. A mostra do Museu Lasar Segall traz 24 gravuras e a única tela que sobreviveu aos nazistas, Eternos Caminhantes, de 1919.

Para lembrar a perda causada pelos atos do Terceiro Reich – que confiscou cerca de 20 mil obras de arte moderna, entre elas as de Segall – a exposição traz uma moldura vazia simbolizando a obra Viúva que está entre as obras destruídas pelo regime. Cerca de um terço das 20 mil obras confiscadas foi destruído, segundo Rincon. O mesmo recurso é usado para destacar a tela No Ateliê, cujo paradeiro é desconhecido.

Além das obras tomadas pelos nazistas, a exposição do Museu Lasar Segall dedica espaço para resgatar eventos acontecidos no Brasil envolvendo a perseguição e a defesa da arte moderna. A trajetória do artista, na opinião de Rincon, é reveladora desse debate.

“Segall acaba experimentando no Brasil algumas manifestações de desagrado e alguns ataques muito parecidos com os que vinha sofrendo na Alemanha”, revela o curador. Após uma breve passagem pelo país em 1912, o artista deixa a Europa em direção a São Paulo em 1923. “Quando chegou aqui e fez a primeira exposição em 1924”, continua Rincon, “um crítico de arte escreveu um texto chamado ‘Alucinação visual’, dizendo que Segall pintava como um interno do Juqueri. Esse tipo de repercussão negativa foi experimentada até os anos 1940.”

Conforme explica o curador, vindo da Alemanha como um artista já reconhecido, com obras em museus e coleções particulares, Segall teve de enfrentar no Brasil um público e uma crítica que ainda não estavam acomodados às propostas modernistas. Um exemplo concreto dessa incompreensão, que podia chegar à violência, é a pintura Autorretrato 3. Presente na mostra atual, ela foi vandalizada durante uma exposição em 1928, quando um visitante rasgou a tela no local do olho do retrato do artista.

Por outro lado, eventos em defesa da arte moderna e da democracia também aconteceram no País, conforme documenta a exposição. Um dos destaques é a mostra A Arte Condenada pelo Terceiro Reich, organizada em 1945 por Miércio Askanazy, imigrante judeu vindo da Polônia em 1939, responsável pela criação de uma das primeiras galerias de arte moderna do Brasil. Duas obras de Segall, Sonho e Mãe Cabocla, fizeram parte da exibição.

Rincon destaca ainda a mostra que o artista realizou em 1943, no Museu Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro, quando expôs quadros que denunciavam o massacre dos judeus, como a tela Pogrom. Para o curador, esse momento revela uma tomada de posição do artista em favor da democracia. “Ele fez um gesto político. Segall sempre esteve associado com essas correntes progressistas e democráticas.”

A exposição A “Arte Degenerada” de Lasar Segall: Perseguição à Arte Moderna em Tempos de Guerra tem visitação gratuita, de quarta a segunda-feira, das 11 às 19 horas. O Museu Lasar Segall fica na Rua Berta, 111, na Vila Mariana, em São Paulo. (Carta Campinas com informações do Jornal da USP/Luiz Prado)

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