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Projeto que tenta proibir discussão de gênero em Campinas é inconstitucional, afirma juiz

O titular da 1ª Vara do Júri de Campinas, José Henrique Rodrigues Torres, afirmou que o Projeto de Emenda a Lei Orgânica de Campinas (PELOM 145/2015), de autoria do vereador Campos Filho (DEM) é inconstitucional. Para ele, o projeto contraria princípios fundamentais dos cidadãos e cidadãs brasileiros, além de vedar o conhecimento, ferir o direito do legislador e até de tratados internacionais. “Clamo aos senhores vereadores de Campinas que não fechem os olhos, bocas e ouvidos dos legisladores, alunos e professores das escolas da cidade”, afirmou o juiz, referindo-se à possibilidade de aprovação da proposta em segundo turno.

“Se essa proposta for aprovada, infelizmente, contribuiria de forma decisiva para o aumento da violência, da discriminação, dos preconceitos, esteriótipos, intolerância e desigualdade. É por isso que não posso ficar resignado diante disso”, advertiu Torres, sobre a PELOM 145/2015.

A fala do juiz José Rodrigues Torres aconteceu durante o debate “Gênero e Orientação sexual na Escola Pública: Um debate sobre a PELOM 145/ 2015”, realizado na ADunicamp (Associação de Docentes da Unicamp), na manhã da última sexta (24).

O projeto, de cunho autoritário, quer impedir qualquer projeto ou discussão sobre “ideologia de gênero”, o termo “gênero” ou orientação sexual nas escolas de Campinas. Ângela Soligo, pesquisadora e professora da Faculdade de Educação da Unicamp, lembrou durante o debate que o termo ‘ideologia de gênero’ foi cunhado por uma onda conservadora e cria a ilusão absurda de que falar sobre gênero, preconceito e orientação sexual é ideológico e vai induzir a juventude a se tornar homossexual.

Ela mencionou uma pesquisa sobre violência e preconceitos nas escolas do Brasil, aplicada em 2013, que obteve diversos relatos de alunos sobre preconceitos contra meninas, negros e não heterossexuais, enquanto professores e diretores muitas vezes ignoram e silenciam.

Ângela Soligo também afirmou que a expressão que se ouve de muitas pessoas, de que falar sobre essas questões “não é papel da escola”, é uma falsa teoria, com suporte religioso fundamentalista. “Ao se negar a falar sobre isso, a escola se omite e alimenta o preconceito, a violência e a cultura do estupro. O acesso aos conhecimentos, todos, é direito da criança e do adolescente, está no ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente)”, disse ela.

Dados trazidos ao debate pelo juiz José Henrique Rodrigues Torres apontam que, mesmo com a Lei Maria da Penha (2007) e a punição decorrente, a violência contra mulheres tem aumentado e ocorre em maior parte dentro de casa, praticada por pessoas da família ou muito próximas. Segundo ele, em Campinas, de 12 acusados e julgados recentemente, 11 foram condenados. O único absolvido foi porque tinha deficiência mental.

“Para Magali Mendes, presidente do Conselho Municipal de Defesa dos Direitos Humanos de Campinas, existem interesses maiores por trás desse recrudescimento do conservadorismo político, para “manter privilégios, uma hegemonia social e religiosa”. “Discriminar e oprimir mulheres, gays e lésbicas é manter um grupo na reserva social, enquanto outros poucos enriquecem. Eles partem de uma família que não existe, além de na cabeça deles e na Rede Globo. Os professores são fundamentais para perceber a violência contra crianças e adolescentes e dialogar. Sem isso, os problemas criados seriam imensos!”, explicou Magali.

O presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Municipal, vereador Carlão do PT, disse que ele e outros vereadores têm trabalhado pela retirada dessa Proposta, mas, como são pequena minoria, avalia que só uma forte mobilização popular pode viabilizar isso. “Sem contar que ainda há repressão policial aos Movimentos quando vêm pra Câmara protestar. Já temos três professores da rede municipal afastados porque fazem esse debate na escola. Se aprovado, seria um prejuízo enorme para as políticas que conquistamos”, alertou Carlão.

O debate foi organizado e mediado por Petrilson Pinheiro, professor do IEL (Instituto de Estudos da Linguagem da Unicamp), com o objetivo de promover a reflexão da sociedade sobre o assunto. Há um ano, a PELOM foi aprovada por 25 votos a 5, em 1ª discussão (Legalidade) na Câmara Municipal (dia 29 de Junho de 2015). Antes de ser colocado em 2ª discussão (Mérito), precisa passar por Audiência Pública, que é quando a população tem a oportunidade de tirar dúvidas e opinar.

O mandato do vereador Carlão também considera fundamental destacar o caráter de censura de propostas como essa PELOM, que busca impedir apresentação de projetos sobre o assunto, contradizendo o propósito de uma Casa de Leis, que deve ser um espaço de amplos debates, envolvendo toda a sociedade de forma democrática e pluralista. Os movimentos sociais que atuam na defesa dos Direitos Humanos e uma ampla gama de pesquisadores apontam para a necessidade de se construir uma educação não sexista e inclusiva como único caminho para o enfrentamento das diversas desigualdades e violências que atingem mulheres, negros e LGBTs. (Carta Campinas com informações de divulgação)

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