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De lugares de infância: os campos, as crianças, as histórias de Jerci Maccari

Neste mês de maio, o projeto Cartas Visuais traz um pouco do trabalho do artista plástico Jerci Maccari. Nos diversos quadros que cobrem as paredes do lugar onde mora e constrói sua arte, um jogo intenso de cores invade os olhos, juntamente com cenas do campo, onde aparecem trabalhadores rurais desempenhando suas funções do dia-a-dia, ou simplesmente contemplativos diante das longas paisagens. Em outras telas, há também mulheres, músicos, bailarinas, crianças.

Em um estilo artístico que nos recorda muito o impressionismo de Van Gogh, Jerci traz nos seus quadros montagem de cores e linhas, a presença marcante do amarelo – cor que em Van Gogh falava também de sua loucura e que, em Jerci, fala do campo e do sol que se arrasta quente e seco nos dias de lavoura – e o protagonismo de homens e mulheres anônimos que nas suas telas ganham uma existência outra, que nasce, dentre outras coisas, das suas memórias de infância.

Jerci nasceu em Urussanga (SC) e, dos primeiros anos de vida vividos no campo, reservou para os seus quadros as marcas do arado na terra, que aparecem na forma das linhas arrastadas, multiplicadas e reinventadas sobre um chão que parece quase não ter fim. Guardou também as mulheres de sombrinha, carregando-as para se protegerem do sol. Reservou um lugar para as cenas de namoro, para as brincadeiras da infância, para toda uma liberdade do homem na natureza.

Além de Van Gogh, Jerci lembra outras influências artísticas como Portinari e Di Cavalcanti, ambos atentos ao homem, à sua atividade na terra. Como não lembrar o “Lavrador de Café”, de Portinari, com os ombros largos, os pés grandes, a enxada trazida para o primeiro plano e, arrastados ao fundo, os largos campos recortados pelas linhas dos pés de café. Os trabalhadores da lavoura reaparecem a todo momento em Portinari, ao lado das brincadeiras de criança, dos músicos, das mulheres, da dor e da miséria que transforma em presenças fantasmáticas os retirantes.

São os mesmos personagens da arte de Jerci, refeitos, no entanto, pelas suas cores, pelo seu imaginário, pela sua sensibilidade e generosidade artística que traz para os seus quadros a influência de outras linguagens, como a da música.

Ao lado das memórias de infância e, como resultado delas, o que se vê nos quadros é a expressão de uma arte moderna que se faz moderna justamente por buscar algo de muito longe, de lugares da infância do artista, mas também de lugares da infância do próprio homem. Os começos que estão ali, já são começos de outros começos, e assim, indefinidamente, não param de sobreviver no presente, preparando novas formas para o futuro. Como em um filme, as imagens se sucedem, contando cada uma a mesma e sempre nova história.

Sua arte, neste sentido, pode ser uma arte de todos nós, assim como aconteceu no Mural pintado pelo artista na Apae, de Valinhos, cidade onde mora atualmente. Ao vê-lo, a dimensão impressiona, assim como a leveza e luminosidade das cores. Depois, o artista revela que o Mural foi pintado por ele e também pelos alunos da Apae. A obra de arte aparece então como um tecido múltiplo, aberto na direção do Outro, nunca único e sim feito de vários e improváveis movimentos.

Jerci é mais um artista do projeto Cartas Visuais, que foi contemplado no Edital ProAC nº 41/2015 “Concurso de Apoio a projetos de publicação de conteúdo cultural no Estado de São Paulo”, com a proposta de valorizar e promover a difusão do trabalho artístico contemporâneo em Campinas e região. Como parte do projeto, serão produzidos e divulgados no site Carta Campinas textos, fotografias e vídeos mostrando um pouco do trabalho de diversos artistas previamente selecionados para o projeto. (Maura Voltarelli)

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