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‘Meu gestual é a régua’: a arte geométrica e sensível de Dimas Garcia

O Projeto Cartas Visuais – que busca mostrar ao público o trabalho de artistas plásticos contemporâneos que vivem e produzem suas obras na região de Campinas – apresenta nessa edição um pouco do trabalho do artista plástico Dimas Garcia.

Natural de Promissão (SP), o artista se muda para Limeira/SP em 1946; entre 1954 e 1960 passa a receber orientação em desenho e pintura do Professor Ruy Corte Brilho no antigo Instituto de Educação Castello Branco de Limeira/SP.
Em 1970, fixa definitivamente residência em Campinas/SP, passando então a receber orientação artística de Di Saboy, J. Zanellato e Thomaz Perina. Integra-se no Movimento Artístico Plástico da Cidade, construindo uma amizade com todos os artistas do chamado Grupo Pós Vanguarda, formado por nomes como Mário Bueno, Raul Porto, Geraldo Jürgensen, Eneas Dedecca, Maria Helena Motta Paes, Bernardo Caro, Francisco Biojone, entre outros.

Foi em 1960 que participou pela primeira vez e oficialmente de um evento de artes plásticas, era o Salão de Artes Plásticas de Limeira/SP, onde recebeu a primeira premiação de sua carreira artística, uma “Medalha de Honra ao Mérito”.

Em 1984, inicia em Campinas um trabalho de organização e realização de eventos culturais, administração e assessoria de espaços culturais e artistas emergentes, num verdadeiro trabalho de “agitação cultural” na cidade, desprezando sempre qualquer apoio ou ajuda oficial por entender que a “cultura” não pode e não deve manter amarras com os poderes públicos e/ou econômicos.

Realizou, ao longo dos seus 52 anos de carreira artística, 41 exposições individuais (apenas 11 em Campinas), 22 individuais simultâneas, 57 salões oficiais de arte, 18 exposições no exterior, 145 exposições coletivas, 137 palestras e oficinas de artes como arte educador e 162 organizações de eventos culturais, salões, panoramas, grupos de artistas e outros.

O ateliê do artista em Campinas, local onde ele cria suas obras, se deixa notar logo de início por uma organização e pequena quantidade de telas, objetos ou outros elementos artísticos, aspecto incomum quando se pensa na maior parte dos ateliês de artista. Nele, os olhos encontram apenas o essencial. Alguns quadros dispostos regularmente na parede formando um grande retângulo colorido, a atual tela na qual o artista trabalha, alguns pincéis, tintas, lápis de cor, livros, discos e réguas.

A limpeza, a pouca quantidade de objetos, a organização que se vê em seu local de trabalho é igualmente percebida na sua obra, como se um espaço imediatemente se refletisse no outro.

Caracterizada por uma “geometria hipersensível”, como disse o crítico Alberto Beutenmüller, a obra artística de Dimas traz poucos elementos compondo a tela, entre eles, pequenas casas, igrejas, árvores e linhas, parecendo buscar o essencial da representação para produzir outros efeitos estéticos e de sentido. O que se vê é sempre poucos traços e formas, fortes cores sem muita variação. A imagem surge limpa, lembrando aqueles procedimentos de esvaziamento em que chegando ao pouco se produz muito.

Ao contar um episódio da juventude, quando ele e um grupo de amigos saíam para andar pelo campo, em Limeira, ele destaca que a paisagem vista por eles era essencialmente vazia, não havia tantos edíficos e construções que impedissem ou dificultassem a visão da linha do horizonte. Esta última se apresentava quase solitária, apenas povoada por uma casa aqui, outra ali, algum ipê amarelo ou alguma igreja. Destacando-se de tudo, ela saltava, relevando-se limpa e constante.

É essa mesma linha que reaparece nos quadros do artista. Em suas duas principais série de obras, “Habitat” e “Ecoambiência”, a linha evolui, se transforma, mas sempre está lá. Inicialmente bem marcada, dividindo o quadro em dois planos da mesma medida, que imediatamente o olhar do espectador associa à terra e ao céu, aos poucos, a linha dos quadros (a linha do horizonte) vai se esfumaçando um pouco mais, em um efeito visual onde a tinta “escorre” um pouco para fora da fina superfície da linha, não muito, o suficiente para provocar um efeito de flutuação buscado pelo artista. Nos quadros onde a linha se quer flutuante, não há mais diferença entre o tom de cor usado no plano superior e no plano inferior do quadro, a cor passa a ser única, confundindo-se terra e céu, que não mais se colocam como tais ou tornam-se a mesma coisa.

Permanece, no entanto, essa representação da habitação, dos espaços onde se vive desdobrados na espacialidade do ambiente e em uma crítica ao congestionamento dos espaços urbanos pelas construções, nas palavras de Dimas, uma forma de denunciar “a sufocação da natureza”, “a habitação como cela.”

Dimas se diz um apreciador da matemática, da sua objetividade, e não há como não vê-la em seus quadros. Ela está ali na limpeza, na eliminação dos excessos, nas medidas exatas. Se admite admirar o gestual expressivo de artistas que com uma pincelada larga e espontânea produzem verdadeiras obras de arte, em um processo de pintura que extravasa a mente e se materializa no próprio corpo, Dimas reconhece em si mesmo a impossibilidade de tal processo de criação, dizendo: “meu gestual é a régua”.

O projeto “Cartas Visuais” foi contemplado no Edital ProAC nº 41/2015 “Concurso de Apoio a projetos de publicação de conteúdo cultural no Estado de São Paulo”, com a proposta de valorizar e promover a difusão do trabalho artístico contemporâneo em Campinas e região. Como parte do projeto, serão produzidos e divulgados no site Carta Campinas textos, fotografias e vídeos mostrando um pouco do trabalho de diversos artistas previamente selecionados para o projeto. (Maura Voltarelli)

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