Por Julicristie de Oliveira
A empreitada não poderia ter começado de forma melhor. As circunstâncias fizeram com que tudo se iniciasse na mais turística de todas as capitais brasileiras, o Rio. Dei uma pesquisada antes na internet, é claro. Achei alguns locais interessantes. Li algumas avaliações. Como era de se esperar, a maioria eram estabelecimentos ovo-lacto vegetarianos. Poucos eram vegetarianos estritos, ou ofereciam opções deste estilo. A dieta vegetariana estrita é a seguida pelos veganos que, além de restringirem todos os alimentos de origem animal, procuram não usar nada que foi gerado com base na sua exploração: cosméticos e produtos de higiene pessoal de empresas que testam em animais, roupas e sapatos de couro ou pele, são alguns exemplos. Em outras palavras, o movimento vegano busca o abolicionismo e a construção dos direitos animais. É uma pauta e tanto. Ademais, há intersecções com as agendas de outros movimentos sociais, como a agroecologia.
Comecei a aventura numa quinta-feira chuvosa, no Cosme Velho, ali na Rua Ererê, número 11, onde fica o Prana, restaurante vegetariano que oferece duas opções por dia de almoço – uma delas era estrita – além de uns sucos criativos e uns sanduíches para o lanche da tarde. Comi a feijoada feita com legumes e cogumelos, arroz integral, uma farofa de banana que tinha um amarelo tão lindo que arrisco afirmar que era doado pela cúrcuma, um vinagrete com tomates e cebolas em corte miúdos servidos num charmoso copinho de pinga, uma couve verde reluzente que parecia ter sido apenas levemente assustada no azeite, coberta com cubos minúsculos e crocantes de um “bacon” vegetal e ornada com uma fatia de laranja. Meu otimismo era tão grande que pedi ainda um suco de juçaí – frutinha parecida com o açaí, mas que é da Juçara, palmeira encontrada na Mata Atlântica. Tudo estava perfeito: a temperatura e o tempero, o sal e o sabor, a picância e a elegância, a doçura e a brandura. O que mais me seduz na culinária vegetariana estrita é esse esforço de ressignificar os sabores sem perder a nossa cultura alimentar como referência. Não foi à toa que escolhi este dia para visitar o Prana e conhecer o “sabor capital” que ali era oferecido.
Fui a outros ótimos restaurantes em Botafogo, o Vegan Vegan que fica na Voluntários da Pátria, número 402, e no Leblon, o Vegetariano Social Clube que fica na Conde de Bernadotte, número 26. Coincidência ou não, comi o mesmo prato nos dois lugares. Sete dias de Rio, três dias de arroz com feijão incrementado – que eu poderia comer muitos outros dias da minha vida. Em cada restaurante, a preparação tinha ingredientes diferentes e particularidades. Se eu tivesse a difícil obrigação de escolher a melhor, eu ficaria com o cuidadoso gosto do Prana. Está aí, o relato da minha primeira busca pelos “sabores capitais”. É, o Rio tem sabor de feijoada, de feijoada vegana.
Julicristie M. de Oliveira tem doutorado em Nutrição em Saúde Pública, é professora do Curso de Nutrição da FCA/Unicamp e atua na área de Educação e Segurança Alimentar e Nutricional