Por Regis Mesquita
Você conseguiria ficar um ano sem comprar roupas, brinquedos ou qualquer coisa que não fosse comida e as outras necessidades do dia-a-dia (remédios, material de limpeza da casa, etc.)?
A origem do desafio.
A família de Scott and Gabby Dannemiller e seus dois filhos criaram este desafio e cumpriram. O motivo desta decisão radical foi que estavam insatisfeitos com a rotina de vida na qual os desejos e os gastos excessivos obrigam a família a viver estressada e com o prazer diminuído. Os pais viam-se prisioneiros do trabalho corporativo e com uma vida hiperagitada. É importante lembrar que existe uma lógica na vida: quanto mais desejos, mais stress e mais agitação.
Os dois filhos também estavam envolvidos com o estilo de vida: “ocupo minha mente com desejos.” Este estilo de vida está repleto destas frases: eu quero isto, eu quero aquilo, sempre sonhei com tal coisa, desejo comprar, etc. A mente fica focada no possuir e no comprar. Perdem referência do usufruto e do vínculo.
Identificando claramente o problema.
Explicando o estilo de vida “ocupo minha mente com desejos”: imagina uma menina 50 anos atrás que tinha apenas duas ou três bonecas; ela tinha poucas bonecas, mas brincava intensamente com elas. Desta forma, surgia o amor por elas. Este vínculo profundo é fonte de satisfação e de estímulo para o brincar sadio. Esta mesma menina, numa sociedade consumista, terá dezenas de bonecas e outras dezenas de brinquedos. Se ela tem bonecas e continua desejando e comprando outras é porque não está satisfeita; o que ela está fazendo é desprezando o que já possui para dar valor ao que ainda não possui (desejos repetitivos).
Este constante desprezo do que se tem é a fonte do consumismo. A mulher abre a sapateira dela e lá tem mais de 50 pares de sapatos. E ela jura que tem que comprar mais um, pois não tem o sapato que ela realmente quer. A família americana estava vivendo como esta mulher e seus filhos como a criança consumista. Scott, o marido, disse para o site Tennesean “Percebemos que estávamos vivendo (com o pensamento) … de que “mais é melhor”. “
Esta vida fica cara, complicada, bagunçada, difícil, complexa e pouco satisfatória. As pessoas ficam prisioneiras de compromissos, compras e contas que geram um nível baixo de satisfação (já reparou como as pessoas estão sempre reclamando de cansaço – mesmo as que não fazem quase nada? É o fruto do baixo nível energético deste estilo de vida).
Coragem para tomar decisão.
O casal Scott and Gabby Dannemiller decidiu: vamos ficar um ano fora deste padrão e vamos viver com o que temos (valorização) e desenvolver a criatividade no que faltar.
Assim fizeram e ficaram muito felizes.
Desafios são importantes na vida de todas as pessoas.
Estes desafios ajudam as pessoas a criarem qualidades pessoais e desenvolverem experiências que podem mudar completamente o rumo das suas vidas. É muito importante que você crie desafios para você mesmo cumprir, a fim de que possa estabelecer metas ousadas e se tornar uma pessoa melhor e mais forte.
O desafio da família americana tem duas partes:
1) valorizar e aproveitar o que já possui. Tirar o maior proveito e aprender a cuidar (não estragar e se estragar procurar consertar).
2) usar a criatividade para superar os desafios que surgirem.
Buscando soluções em conjunto.
Para dar presente de aniversário para os amigos, pais e filhos discutiam soluções criativas para que não precisassem comprar. A consequência foi maior aproximação dos pais e filhos. Além do desenvolvimento da capacidade de improvisação, inovação e trabalho em equipe. Uma vida muito mais saudável do que ir ao shopping comprar algo e depois cada um da família vai para um canto da casa, sem diálogo.
Experiência contada em livro.
Um livro foi lançado (em inglês) relatando esta experiência: “The year without purchase”. Nele está explicado o cotidiano e os desafios que enfrentaram. Vale notar que as experiências positivas foram mantidas: ir ao zoológico (por exemplo). A ideia não é restringir a vida da família; ao contrário, é ampliá-la. Porque na vida consumista existem poucas experiências realmente construtivas. Na rotina que eles criaram há mais proximidade, mais diálogo, mais tempo e mais satisfação.
Lição de vida.
Scott “citou uma reportagem do jornal New York Times que afirmava que o maior preditor de felicidade são os relacionamentos humanos e quanto tempo passamos com as pessoas especiais em nossas vidas. O interessante é que as pessoas sacrificam as relações sociais realmente importantes para obter outras coisas que não irão torná-los tão felizes”.
Leitura indicada:
Criança mimada: a falta do cultivo de bons valores, como o servir e o autocontrole
Regis Mesquita é psicólogo em Campinas.
Autor do blog Psicologia Racional e da coluna “Comportamento Humano” aqui no Carta Campinas.