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O Zoológico:

Sempre gostei de ir ao zoológico. Na infância, ingênuo, ignorava o mal que representavam para a fauna e para a ecologia. Hoje já os entendo, talvez um mal necessário, como a última esperança na conservação de algumas espécies, além de importantes centros de pesquisa e apesar de me causar grande desconforto ver bichos enjaulados, ainda adoro ver os bichos. Porém, como meus leitores costumam ser leigos e ignorantes, tirando você, evitarei comentários técnicos e me reportarei ao zoológico como entretenimento, um local de paz para se divertir com a família. Foi o que fiz num desses últimos finais de semana.

Chegamos, eu e as meninas e tivemos a sorte de partilhar o percurso com a família do seu Fonseca. Aliás, visita ao zoológico só é completa se for acompanhada de outra família que tenha recebido a boa e pitoresca educação à brasileira…

Logo na entrada vimos as cotias, livres a se aproximarem dos humanos sem receios, em busca de guloseimas. O Krebi (espero que se escreva assim), netinho do seu Fonseca, uns 6 ou 7 anos, corria alucinado atrás dos roedores como se não houvesse amanhã, segurando seu pacote de porcaritos e só parou ao ouvir o avô cair na risada aos gritos de “o rato vai comer o pinto do Krebi, rarararararara!!” e repetir a frase umas oito vezes. O Jonatas, pai do Krebi, logo corrigiu _ “não é rato, pai, é capivara!” e emendou _ “a capivara vai comer o pinto do Krebi, rarararara!” e repetiu várias vezes. O Krebi aquietou-se e passou a conferir com os olhinhos se não tinha cotia por perto e com a mãozinha, se os “documentos” estavam intactos.

Já no recinto dos psitacídeos, enfim aprendi com os Fonseca, que os verdes são os periquitos e os coloridos são as araras e que todos são papagaios se responderem ao místico chamado de “da o pé, loro”. Também vi que apreciam salgadinhos.

Vanuzia, a nora do seu Fonseca, empolgou-se ao ver as araras vocalizarem. “Óia, Krebi, o papagaio ta chamando a Lara!!” (7x).

Lara, a irmãzinha do Krebi, talvez com seus 3 aninhos, olhava para as aves sem se lembrar de onde elas a conheciam, mas, por educação, respondeu “da o pé, lolo…”. Lara também era presenteada pelo Krebi com um tabefe na mão e um “NÃO!” gritado na orelha, sempre que tentava pegar um salgadinho do pacote do irmão.

Enquanto a Lara admirava suas quase xarás, o Krebi corria pra frente dos recintos dos felinos, minha filha pequena, que já tava amigona do Krebi, o acompanhava de perto. Vanusia pegou a Lara no colo e correu pra se juntar ao grupo, quando o Krebi chamou “óia, mãe, óiu lião!”. Observei impressionado o Krebi repetir “óiu lião” 8 vezes, mas respeitei, notando que era uma tradição familiar. Respeitei ainda mais ao ver que o lião era mesmo um leão. Já os outros felinos eram todos tigres, inclusive a onça preta, inclusive a leoa, inclusive durante suas intimidades com o leão. “Óiu lião catando o tigre, vô!”, Krebi repetiu alto muitas vezes. Minha filha olhou pra mim. O seu Fonseca olhou para os animais, para o neto, pra mim… e finalmente concluiu _ “vamos ver os macacos”. Olhei pra minha filhinha e disse _ “eba, vamos ver os macacos!!” e deixamos o leão catar o tigre à vontade.

No caminho para os macacos tivemos várias novidades. Depois de ser confundida com a cotia, a capivara deve ter ficado feliz quando foi chamada de urso, mas logo desfizeram o equívoco e chegaram à conclusão de que era mesmo um castor. A anta foi promovida a hipopótamo, o hipopótamo, incrível, foi rebaixado a porco, os quatis viraram macacos, mas sob a ressalva do Jonatas: “macaco esquisito esse…”

No setor das cobras, havia dois tipos, ou era jararaca ou era sicuri… é, sicuri. O único espécime que deixou alguma dúvida, logo foi catalogado pelo seu Fonseca: “essa é a sua sogra, Jonatas, rarararara!” não preciso dizer que ele repetiu muitas vezes e que isso já estava me deixando levemente irritado.

No caminho até os macacos, seu Fonseca e Jonatas continuavam ameaçando o Krebi de ter o pinto devorado por cada uma das espécies pelas quais passávamos e se riam a valer. O Krebi já fizera amizade com minha filhinha, uma flor de criatura que aprendia calada as novas informações. O menino continuava conferindo se “as partes” estavam intactas e comendo os salgadinhos com a mesma mão.

A ilha dos macacos exercia uma poderosa atração sobre os visitantes, sobretudo as crianças. Eram macacos prego, mas a família Fonseca estava em dúvida entre três espécies: chico, mico e balduíno, mas pela certeza do Jonatas, confiei que eram mesmo balduínos.

Os Fonseca passaram direto pelas corujas, que da azar, mas a Lara não pode deixar de notar que as aves a observavam penetrantemente como se a conhecessem e como não sabia o que era azar, conversou com elas: “da o pé, lolo”. Uma das corujas respondeu com um meneio de cabeça, sem desviar o olhar da pequena.

Final do passeio, todos cansados, paramos frente ao lago dos jacarés e dos quelônios. Vi minha filhinha no maior dos papos com o Krebi, que continuava com aquele intrigante hábito de comer salgadinho com a mão suja. Sou um cara liberal, crio as filhas para a vida, não sou possessivo, então deixei que a Mariana conversasse à vontade com o Fonsequinha, mas preferi chegar só um pouco mais perto.

A Lara perguntou que bicho era aquele sobre o tronco, no meio do lago. Cágado, eu disse. Lara me olhou com medo, deu uma olhada no meu bumbum e preferiu a resposta do pai, tartaruga. Jonatas me sorriu com desprezo e pegou a filha no colo.

Vanusia gritava “óia o jacaré, Jonatas!!”, sabem quantas vezes, né? Depois da oitava, perguntou pro Jonatas se o bicho era de verdade. Ele esperou 5 minutos para responder, avaliando profundamente a falta de atitude do réptil e enfim respondeu _ “claro que é de verdade” e sem tirar os olhos do bicho, depois de mais 5 minutos, concluiu _ “mas tá morto”. Foi no exato momento em que vi o Krebi oferecendo um petisco vindo daquele saco infecto (me refiro ao pacotinho).

Sou um cara liberal, tranquilo e super na minha, mas sem querer dei um esbarrãozinho no Krebi bem na hora em que a Mariana ia abocanhar a guloseima. Conforme planejado, pelo destino, é claro, o Krebi caiu no poço dos jacarés e eu meti o pé naquele maldito pacote de salgadinhos que já me dava nos nervos.

Ouvi o Jonatas gritando _ “ta vivo, Vanusia, o jacaré ta vivo!!!” e o seu Fonseca _ “vai comer o Krebi!!”, ambos no modo Fonseca de gritar muitas vezes.

O segurança do zoo, acho que era parente dos Fonseca, gritou 8 vezes pelo rádio: “caiu um moleque no poço do Killer!!” e logo a área estava cercada. Krebi foi resgatado são e salvo, salvo o aspecto pálido, não fosse o verde musgo que o cobria da cabeça aos pés. Killer, o jacaré, parecia feliz com os 5 minutos de fama e até abriu um sorriso.

Eu, num canto, repreendia severamente a Natália, minha filha mais velha _ “Olha por onde anda, sua banana! Derrubou a criança! Vai ficar um mês sem instagram!”. A Lara me olhou com olhos sedentos de verdade e disse _ “mas foi você, tio…”. Rapidamente recolhi alguns salgadinhos do chão e ofereci pra menininha, que veio ávida com as mãozinhas… fechei minhas mãos, olhei em seus olhos, penetrante como uma coruja e arrematei _ “pra você, Larinha, mas vamos esquecer isso tudo, tá bem!” e aí sim liberei o nutritivo alimento.

O clima tenso logo se desfez quando comprei outro pacote de salgadinhos pro Krebi e permiti que o Jonatas desse uma leve reprimenda na Natália, que assumira toda culpa só pra não passar o ridículo de ver o pai pagando mico no zoológico.

Adorei o passeio, minha esposa tá meio brava comigo até hoje, mas tenho a consciência tranquila. Na saída, ainda gritei para os Fonseca: “Valeu, desculpa alguma coisa!” … 8 vezes.