Desde que Baudelaire postulou o que seria a modernidade ao dizer que o moderno é o eterno do transitório, e que caberia ao artista na modernidade capturar e perceber esse moderno, ao artista passou a falar mais alto elementos prosaicos, considerados até então menores, a partir dos quais ele, com sua estética e linguagem própria, conseguia extrair esse elemento de eternidade.
Quando Maria Paula fala das casas vazias, abandonadas, desabitadas, deterioradas pela ação do tempo ou do homem, mas que conservam em sua arquitetura uma memória, e que na sua própria condição de abandono e invisibilidade comunicam-se diretamente com um estado do homem na modernidade, ela parece ter encontrado um elemento do cotidiano para transmitir esse sentimento pensado por Baudelaire.
Em diversos trabalhos da artista, pequenas casas, representadas com traços finos e delicados, são recriadas por ela em água-forte, registrando as linhas gravadas no metal, e água-tinta, que recobre a área ao redor, criando uma relação figura-fundo que destaca o volume da imagem desenhada.
As casas, em um primeiro olhar parecidas, surgem, depois, nas suas peculiaridades, no particular de cada representação, registram, ao mesmo tempo, a cidade, o homem abrigado pela casa, o homem que captura as imagens para imaginá-las, transformá-las, transformando a si mesmo.
O homem também aparece diretamente em imagens em preto e branco onde a artista direciona o olhar para uma área central delimitada por uma fina linha a formar um quadrado destacando um gesto também desde sempre moderno e, singularmente contemporâneo, “o guardar no coração”, lugar essencial onde se deve procurar aquilo que se “aprende de cor”.
Em uma proliferação de imagens e elementos, em outras criações da artista temos uma multidão de chaves, instrumentos que permitem guardar, trancar, proteger, deixar-se em solidão. A chave, objeto bastante simples, é daqueles que contém em si infinitos sentidos, imagens e interpretações, reflete e deixa refletir a modernidade.
Outro trabalho da artista compõe sutilmente dois elementos. Como uma intervenção em um plano florido por vitórias régias, que ao mesmo tempo em que desestabiliza, concentra e direciona a atenção, surgem as finas linhas de um triângulo, geometrizando o lírico.
Artista visual e designer gráfico, Maria Paula desenvolve investigações artísticas em gravura e outras propostas artísticas. Realiza atividades como designer gráfico para projetos culturais em Campinas (Espaço Ideia Coletiva) e participa de publicações independentes. Bacharel e Licenciada pela PUC-Campinas em 2011, atualmente cursa Especialização em Design Gráfico e participa do Curso livre de Gravura, na Unicamp. Paralelamente, mantém uma produção de cadernos artesanais e estampas digitais.
Como uma “remetente desconhecida”, expressão da própria artista, ela nos envia sua imagens, nos mostra novas paisagens e formas de ver, nos transmite algo desse eterno que há no provisório, no fugaz, naquilo que quase nunca é lembrado. (Maura Voltarelli)