Em uma década de governos da Frente Ampla, a economia uruguaia cresceu em média 5% ao ano, o desemprego caiu, e o índice de pobreza foi reduzido de 39% para 11%. Quem ajudou a colocar o pequeno país no mapa foi o atual presidente José Pepe Mujica, cujo sucessor será eleito neste domingo (30).
Desde que assumiu a Presidência, em 2010, Mujica – de 79 anos – fez fama por ser diferente. Vive na mesma chácara e dirige o mesmo fusca velho. Um xeque árabe quis comprar o carro por um US$ 1 milhão, mas ele se recusou a vendê-lo. Doa 90% de seu salário presidencial para projetos sociais. No seu governo, três medidas renovadoras foram aprovadas: aborto, casamento entre pessoas do mesmo sexo e livre produção e venda de maconha.
Em entrevista, José Pepe Mujica disse que – depois de entregar a Presidência a seu sucessor, em março – vai pôr em prática muitos planos. Já começou a construir uma escola de ofícios agrícolas em um canto da chácara e vai continuar fazendo política, como senador – cargo para o qual foi eleito nas eleições legislativas, em outubro passado, quando também ocorreu o primeiro turno das eleições presidenciais.
Os uruguaios foram às urnas para renovar a totalidade do Congresso: a Frente Ampla obteve maioria em ambas as casas. Mas nenhum candidato a presidente obteve suficientes votos para ser eleito no primeiro turno. Por isso, hoje (30), o candidato governista Tabaré Vázquez vai disputar o segundo turno com Luis Lacalle Pou, do tradicional Partido Nacional ou Blanco.
Pepe Mujica disse estar certo da vitória de Tabaré Vázquez. E disse que, no Congresso, vai defender reforma constitucional e adoção de regras claras para combater a corrupção – principalmente na política. “Precisamos assegurar regras que ajudem a combater alguns desvios que estão aparecendo na América Latina, como a corrupção”, disse Mujica. “Não porque tenhamos corrupção, mas quando você vê as barbas do vizinho ardendo, melhor colocar as suas de molho”, disse.
E como fazer isso? Fiel ao seu estilo de dizer o que pensa, sem rodeios, Pepe Mujica respondeu: “Ah! Tendo as ideias claras, sabendo que não estamos aqui pelo dinheiro e que temos que botar para correr da política a todos aqueles que gostam muito de dinheiro. Essa e a primeira medida”. Segundo ele, é preciso “ser sóbrio na política e viver como vive a maioria do nosso povo e não como vive a minoria”. O povo, disse Mujica, “não vê apenas o discurso, vê tudo o que rodeia os políticos”.
A paulista Renata Soares, que vive há 11 anos em Montevidéu, disse que o interesse dos brasileiros pelo país vizinho aumentou desde que Pepe Mujica virou presidente. Ela administra uma página, no Facebook, da comunidade brasileira no Uruguai. Segundo ela, muitos escrevem perguntando onde podem se encontrar com o presidente uruguaio para tirar uma foto e bater um papo.
“Graças a Mujica, muita propaganda sobre o Uruguai foi feita no Brasil e muitos brasileiros, cansados [do próprio país], ficam fascinados pelo carisma e a simplicidade do Pepe”, disse Renata. Pepe sabe que ajudou a despertar o interesse internacional pelos uruguaios: “Eu acho que há uns quantos turistas que gostam de vir ao Uruguai….e já que estão aqui, acabam vendo um velho esquisito”, brincou.
Hoje acontece segundo turno no Uruguai
Os uruguaios vão às urnas hoje (30) para eleger o sucessor do presidente José Pepe Mujica. O favorito em todas as pesquisas de opinião é o médico oncologista Tabaré Vázquez, candidato da Frente Ampla – a aliança de partidos de esquerda, no poder há dez anos. Ele foi presidente de 2005 a 2010, antes de entregar o cargo a Mujica, que foi eleito senador em outubro passado.
As últimas pesquisas de opinião dão a Tabaré Vázquez uma vantagem de 10 pontos percentuais em relação ao adversário, Luis Lacalle Pou – filho do ex-presidente com o mesmo nome e candidato do tradicional Partido Nacional ou Blanco.
“Vai ser uma eleição sem surpresas”, acredita o técnico em informática Diego Hernandez, de 34 anos. Na avaliação dele, a Frente Ampla deve a sua popularidade às políticas sociais, que reduziram a pobreza de 39% para 11%, e a economia, que cresceu em média 5% ao ano. “Sou daquela geração que fez as malas para buscar emprego na Argentina e acabou voltando porque lá a coisa ficou ruim e aqui melhorou.”
Já o engenheiro Fernando Laprida diz que vai apoiar Lacalle Pou por dois motivos: a família toda sempre votou nos “brancos” e ele acha que é hora de mudar. “Tivemos bons governos, mas não é bom um mesmo partido governar durante tanto tempo, tendo sempre maioria no Congresso – um pouco de oposição faz bem para renovar as ideias.”
Seja qual for o resultado, a Frente Ampla já assegurou a maioria no Congresso, que foi totalmente renovado em outubro passado, quando ocorreram as eleições legislativas e o primeiro turno das eleições presidenciais. No Uruguai, tanto o presidente quanto os senadores e deputados têm cinco anos de mandato. O novo governo assumirá em marco.
Se Tabaré Vázquez for eleito presidente, será o terceiro governo consecutivo da Frente Ampla. Nestes dez anos, os chamados frentistas sempre contaram com maioria no Congresso e por isso conseguiram aprovar leis polêmicas como a da legalização do aborto, a do casamento entre pessoas do mesmo sexo e a da produção e venda da maconha.
Tabaré Vázquez disse, na campanha, que o desafio do novo governo será reduzir ainda mais a desigualdade. “O Uruguai é o país da região com a maior porcentagem de classe média em relação à sua população: 62%”, disse ele. “Mas falta muito por fazer”, acrescentou o candidato. (Agência Brasil)