Uma tragédia anunciada na morte do estudante de Engenharia da Unicamp

Triste tragédia anunciada 

A briga por ciúmes que culminou com a morte do estudante de Engenharia da Unicamp Denis Papa Casagrande é um triste fim para uma tragédia anunciada. Na última terça-feira, dia 24 de setembro, a polícia colheu a confissão de Maria Tereza Peregrino pelo crime que, inicialmente tinha seu namorado, Anderson Mamede, como principal suspeito. Observando os perfis dos envolvidos no Facebook, todos com a idade parecida (cerca de 20 anos) podemos notar que uma infeliz confluência de fatores culminou com a morte do estudante.

Anderson, Maria Tereza e Denis. Fotos extraídas dos perfis do Facebook.
Anderson, Maria Tereza e Denis

Apesar das recentes reformas das normas que dão acesso às suas vagas, as universidades públicas ainda mantém seu perfil elitista no país. Assim, têm acesso às vagas, principalmente entre os cursos mais concorridos, os estudantes mais bem preparados e que tiveram as melhores oportunidades educacionais até o momento do vestibular. Aos olhos da massa, o estudante de universidade pública é ainda um privilegiado.

Na outra ponta da pirâmide, uma gama de jovens recém-saídos do ensino médio sem perspectivas. A estes, os excluídos das universidades públicas e dos programas de inclusão social do governo federal nas universidades privadas, resta a entrada no mercado de trabalho por meio de empregos mal remunerados e cargas excessivas de trabalho. Sobra a eles concordarem com essa realidade ou procurarem um motivo para fugir dela.

É aí que mora o perigo. Em tempos de redes sociais e de um mundo extremamente interconectado, a busca por elementos culturais que preencham uma identidade ainda em formação aumenta vertiginosamente. Dessa forma, qualquer indivíduo que queira construir uma identidade, seja ela individual ou em grupo, encontra na internet uma infinidade de temas que possam preencher esse vazio.

No caso de Anderson Mamede e Maria Tereza Peregrino, o universo escolhido foi a cultura punk. Tendo como palco original a Inglaterra do final dos anos 70, esse movimento de música e atitude vem desde então conquistando gerações que buscam com meio dele expressar sua indignação e frustração com o mundo. Os perfis individuais do casal no Facebook mostram uma atitude punk encenada, na qual a relação dos dois é expressa por meio de fotos em que se colocam em evidência as tatuagens dela e os cabelos coloridos dele. Há também um camundongo como bicho de estimação e uma vestimenta apropriada ao movimento “punk”. No perfil de Anderson, vemos também fotos de lutas marciais e animais selvagens.

Essas identidades virtuais construídas pelos donos dos perfis já revelam a atitude de negação de uma realidade que talvez lhes seja muito dura. Os elementos culturais de outras épocas lhes dão conforto e a ideia ilusória de que são diferenciados ou importantes, por mais que o mundo real lhes diga o contrário.

Quando então a Rádio Muda, sediada dentro da Unicamp, promove seu evento de aniversário por meio das redes sociais, temos essa infeliz junção de fatores. Se antes, as festas de universidades públicas eram divulgadas dentro do campus por meio de panfletos xerocados ou cartazes no ponto de ônibus, hoje se promovem festas através da ferramenta de eventos do Facebook. Quando o evento é assim promovido, a festa transborda as fronteiras imaginárias da universidade pública e convida qualquer pessoa a participar do evento. Isso não seria um problema, se não houvesse na figura da universidade pública, uma barreira, essa sim real, chamada vestibular, que inclui a elite e exclui a massa.

Ao tornar pública por meio das redes sociais a festa dos estudantes de elite, os “excluídos” partem para as festas. O problema é que infelizmente alguns poucos deles vêm armados, pois talvez enxerguem erroneamente naqueles estudantes o retrato da sua exclusão. Sua união no mesmo espaço é o mesmo que deixar exposto o pavio de um barril de pólvora. Qualquer mínima faísca pode causar uma tragédia. E foi o que aconteceu.

As redes sociais tem capacidade de mobilizar as massas, como bem presenciamos durante as jornadas de junho em nosso país. Porém, elas atraem sujeitos com perspectivas diversas. Como pudemos testemunhar, junto a uma multidão de manifestantes pacíficos, localizavam-se também grupos cuja intenção principal era a violência e a destruição do patrimônio público. Neste caso, não há dúvida de que havia ali um depósito de energia negativa direcionado a um poder público que não cumpriu o papel de lhes darem uma oportunidade melhor na vida.

Agora essa energia negativa provocada pelo não acesso à educação, ao mercado de trabalho e, consequentemente, ao universo do consumo, se manifesta mais uma vez em solo administrado pelo poder público, culminando na morte de Denis.  (Tarcísio Torres Silva, da Rede CartaCampinas)

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