(foto: tv brasil/divulgação)

Há mais de duas décadas, uma lei tornou obrigatório o ensino da história e da cultura afro-brasileira nas escolas públicas e privadas de todo país. Aplicar o que a legislação determina ainda é desafiador. Uma pesquisa do Ministério da Educação mostrou que, entre 2019 e 2021, apenas metade das escolas desenvolveu algum projeto sobre relações étnico-raciais.

Quando se fala em educação continuada, o quadro é mais grave: 14,7% dos gestores escolares disseram ter materiais pedagógicos ou socioculturais para ensinar a disciplina. Para completar, havia só 0,92% dos professores com formação adequada sobre o tema.

Ignorar a história e a cultura dos negros é ignorar a história e a cultura de 56% dos brasileiros. E por que implementar a Lei 10.639/2003 é tão difícil? “Se você me perguntar como pesquisadora, eu digo: coordenação federativa. Num país tão grande como o nosso, com desigualdades tão significativas, você precisa de uma coordenação forte do Ministério da Educação para colocar todas as redes na mesma página e ajudá-las a implementar a política”, responde a secretária de Educação Continuada, Diversidade e Inclusão do MEC, Zara Figueiredo.

Segundo a secretária, essa implementação da lei será, de fato, feita a partir deste ano, com o lançamento da Política Nacional de Equidade, Educação para as Relações Étnico-raciais e Educação Escolar Quilombola. “Nós ofertamos, só este ano, 215 mil vagas de formação de professores. Além disso, tem o material de apoio. Nós encaminhamos, para centenas de redes, o livro do professor e o livro do aluno (com conteúdo antirracista) para os anos iniciais e finais do ensino fundamental”, informa.

Medidas importantes, de acordo com os especialistas, afinal, as marcas do racismo na escola não se apagam nunca. “Eu lembro de ter sido posta de castigo no fundo da sala. Eu fui a única colocada lá, embora a turma toda tivesse fazendo bagunça, e fiquei ali até urinar na roupa”, conta a professora Gina Vieira no episódio “As Marcas do Racismo na Escola” do programa “Caminhos da Reportagem”, exibido pela TV Brasil.

“As piadas de cunho étnico-racial geralmente eram direcionadas a mim. Na época, eu não sabia nomear essas violências, mas sempre houve um desconforto”, revela a também professora Keila Vila Flor. “Eu estudei numa escola particular e nessa escola tinha as classes A e B. A classe B era a das crianças que não aprenderiam com tanta rapidez como as da classe A. E as crianças nessa classe B eram negras”, recorda outra professora, Paula Janaína.

Vencedor do Prêmio Jabuti com o livro “O Avesso da Pele” e alvo de censura em pelo menos quatro estados do país, o escritor Jeferson Tenório afirma que a discussão do racismo dentro da escola é importante “É preciso ter uma responsabilidade ética: me preocupar com os problemas dos outros e não só com os meus. É colocar também o racismo numa dimensão em que o aluno perceba que não existe democracia enquanto houver racismo”.

Bons exemplos

Assim mesmo, há soluções. O Caminhos da Reportagem buscou exemplos no Distrito Federal e em Salvador. Na capital do país, o projeto Cresp@s & Cachead@s tem como ponto de partida recuperar a autoestima dos estudantes negros. Já na capital da Bahia, o programa mostra a escola Maria Felipa.

“Existe na escola um projeto político-pedagógico de valorização dos diferentes marcos civilizatórios do nosso povo, então a gente leva para o currículo a cultura africana, a cultura indígena e a cultura europeia em grau de igualdade de paridade. O que isso significa? Significa que eu não vou levar a cultura europeia para escola na matemática, na filosofia, na história e vou levar a cultura africana apenas na capoeira e no samba. Então, é levar a cultura africana na história, na matemática, na ciência. E o mesmo é feito para a cultura indígena”, explica a idealizadora da escola, Bárbara Carine. (Agência Brasil)