.Por André Henrique.
A aliança de Lula com Geraldo Alckmin não é produto de meros cálculos eleitorais, mas fruto das circunstâncias históricas. É claro que Lula e Alckmin fizeram cálculos. Alckmin viu a oportunidade de encurtar o caminho para chegar à presidência. O que mais pode querer um político que governou o maior estado da federação por 13 anos? Vice, Alckmin estará posicionado pelo PSB para ser o sucessor de Lula que, em 2026, estará com mais de 80 anos.
Governar SP outra vez para chegar à presidência seria uma via arriscada. Por duas vezes essa estrada não surtiu o efeito esperado para o ex-tucano e em 2018 o deixou num beco sem saída quase pondo um fim à sua carreira política.
Para Lula, a aliança com Alckmin abre caminho para o PT derrubar a hegemonia de 28 anos do PSDB em São Paulo. Sem Alckmin na disputa e como cabo eleitoral as chances de Fernando Haddad eleger-se governador se ampliaram. O petista lidera as pesquisas e pode levar no primeiro turno. Alckmin é a carta na manga de Haddad contra seus rivais conservadores.
Além disso, Lula conseguiu amealhar palanques estaduais ao fazer a aliança com o PSB e criou pontes com setores conservadores da economia com os quais o ex-governador de São Paulo tem interlocução.
Para além dos cálculos eleitorais, tem o fator simbólico. A chapa Lula-Alckmin representa um reencontro das forças republicanas contra a barbárie bolsonarista – com seu neofascismo autoritário na linguagem e no desrespeito às leis e às instituições; e seu anarcocapitalismo desorganizador do estado em benefício de máfias como as dos garimpeiros e madeireiros ilegais; e as dos milicianos, tendo Rio das Pedras como referência.
Alckmin e Lula estão entre as principais lideranças remanescentes da transição democrática de 1985 e da Constituição Cidadã de 1988. A Lava-Jato causou uma fissura na Nova República ao colocar em descrédito a política e os partidos tradicionais, facilitando a eleição de um outsider defensor da ditadura militar e que governa tencionando a relação do executivo com as leis e outros poderes.
O movimento Lula/Alckmin pode suturar o tecido político da Nova República, isolando o extremismo e pacificando o país a partir de um novo pacto social dentro do qual estejam os trabalhadores e o combate da miséria. Sem isso, não há como estancar a hemorragia interna da qual o bolsonarismo se alimenta para corroer a República.
As previsões do governo de que Jair Bolsonaro ultrapassaria Lula em junho não se concretizaram. Até aqui a PEC Kamikaze não interferiu nas tendências das pesquisas que persistem há mais de um ano. O clima é de derrota. O Datafolha do começo de agosto apresentou o petista com 18 pontos à frente. A partir daí, empresários e banqueiros aderem à carta à democracia dando sinais de que já admitem a vitória do petista.
Parece que Lula levou a sério as lições de Karl Marx sobre correlação de forças e previu que sua aproximação com Alckmin exerceria uma força centrípeta agregando ao centro forças divergentes de maneira a lhe garantir musculatura eleitoral e governamental para enfrentar os desafios de um país dilacerado e isolar a extrema-direita.
Desse modo, mais do que uma aliança eleitoral, criou-se um movimento político. Os sinais iniciais são alvissareiros para as pretensões de Lula. A ver os próximos capítulos.
Por André Henrique, cientista político e jornalista