CPI do Bolsolão é para ontem!
.Por Ivan Valente e Paulo Bufalo.
Cerca de 60% da população brasileira rejeita Jair Bolsonaro, de acordo com diversos institutos de pesquisa. Os índices refletem a percepção de desastre na gestão da pandemia, no controle da inflação, no combate ao desmatamento, na imagem do país no exterior, na atenção aos que mais precisam de Estado e evidentemente no desmascaramento do discurso anticorrupção. Junto à impopularidade, há mais de 130 pedidos de impeachment que não saem da gaveta do presidente da Câmara Arthur Lira. A única explicação para a inação de Lira diante de um cenário caótico e com um governante de grande impopularidade é que o Centrão está se beneficiando financeiramente com Bolsonaro. O apoio ao presidente da República vem sendo comprado por meio do esquema do “orçamento secreto”.
Trata-se aqui das emendas de relator, ou RP-9, que surgiram em 2019 em costura do governo Bolsonaro com o Congresso. Enquanto as emendas individuais, a que todo parlamentar tem direito, são distribuídas com equanimidade e transparência, essas emendas de relator possibilitam identificar apenas o órgão orçamentário, a ação e o destino da verba, mas não permite identificação imediata do parlamentar beneficiado com o recurso. O valor vem superando em muito o que se aplica nas emendas individuais, criando assim uma enorme discrepância nos redutos eleitorais de cada parlamentar, o que sem dúvida fará diferença no momento da campanha. O arbítrio é tão escandaloso e tão intimamente ligado a desvio de dinheiro que quando a imprensa noticiou, logo pegou o apelido Bolsolão. Ou “Tratoraço”, pois foi constatada pelo TCU compra de tratores superfaturados no decorrer desses repasses.
Temos, portanto, um balcão de negócio onde o toma lá dá cá impera. O governo destina a verba que fortalecerá a campanha (ou até mesmo o próprio bolso) do parlamentar aliado, que em troca se fideliza nas votações que interessam ao governo no Congresso. Tal esquema é uma afronta às leis orçamentárias e ao princípio da transparência nos gastos públicos. Felizmente, com base em uma ação do PSOL, o STF entendeu que o orçamento secreto é inconstitucional, suspendendo-o por 8 votos a 2.
Para se ter uma ideia, em 2021 já foram repassados 16,3 bilhões do orçamento por meio das emendas de relator. Às vésperas da votação da PEC dos Precatórios (também conhecida como PEC do Calote), foram empenhados R$ 1.967.751.844,83 para garantir a votação com o governo. É bom ressaltar que a Polícia Federal, a partir de um relatório da CGU, pediu ao STF abertura de inquérito para investigar corrupção no “orçamento secreto”. O próprio General Mourão, em entrevista recente, admitiu que o orçamento secreto é “manobra em benefício daqueles que apoiam o governo”. Está escancarada a compra de votos, que se trata de nada menos do que corrupção.
Desde maio deste ano, na esteira de notícias publicadas pelo jornalista Breno Pires, nosso mandato apresentou um pedido da CPI do Bolsolão. A coleta de assinaturas está em andamento. A suspensão das emendas de relator por parte do STF é importantíssima, contudo, é preciso que todos os parlamentares que têm compromisso com a democracia e a lisura apoiem a abertura desta CPI. Uma Comissão Parlamentar de Inquérito voltada para o orçamento secreto poderá averiguar o destino dos recursos, a identidade de cada envolvido e casos de superfaturamento. Somente com muita pressão conseguiremos as assinaturas necessárias para a instalação da CPI.
Vimos no Senado um trabalho fundamental na CPI da Pandemia, que apontou a responsabilidade do governo em um cenário de mais de 600 mil mortes, proliferação de fake news em um gabinete paralelo composto de charlatões, e o desvio de dinheiro público que deveria ter sido gasto na compra de vacinas. O êxito da CPI da Pandemia apenas reforça a importância de uma nova CPI, dessa vez com foco no Bolsolão, que movimenta bilhões em benefício de Bolsonaro e seus aliados. O Brasil não pode ficar passivo diante de tantos escândalos. CPI do Bolsolão Já!
Ivan Valente – deputado federal (PSOL/SP)
Paulo Bufalo – vereador em Campinas (PSOL)