.Por Paulo Bufalo.
Está tramitando na Câmara Municipal de Campinas o Projeto de Emenda à Lei Orgânica 160/2019 que propõe o Orçamento Impositivo no município. A proposta, que foi debatida em audiência na Comissão de Constituição e Justiça e será votada, prevê que os vereadores possam apresentar emendas individuais ao projeto de lei orçamentária, limitadas no total a 1,2% da receita corrente. Metade deste percentual deve ser voltado para a área da saúde.
Antes de qualquer consideração sobre essa matéria, é preciso apresentar brevemente, aos que tem pouco domínio sobre o tema de orçamento público, a principal diferença dessa proposta com o modelo vigente. Atualmente, o Poder Executivo não é obrigado a investir todas as verbas autorizadas na Lei Orçamentária Anual (LDO) pelo Poder Legislativo, trata-se de um planejamento de receitas e despesas. É o chamado orçamento autorizativo para o total das despesas previstas. No caso do impositivo, a execução do valor aprovado, que seria de 1,2% relativo às emendas parlamentares, terão caráter obrigatório. Considerando que no Projeto de Lei Orçamentária Anual para 2022, está prevista uma receita corrente aproximada de 6,3 bilhões de reais, cerca de 75,6 milhões serão obrigatórias. Os demais 98,8% continuariam na condição autorizativa.
Numa primeira análise, a proposta traz aspectos positivos, pois amplia a decisão sobre investimentos públicos, incluindo indicações de todos os representantes do legislativo e partidos, ainda que seja sobre um pequeno percentual. Pode ser uma forma da sociedade civil organizada incidir na busca destes investimentos em serviços, equipamentos e políticas públicas por meio da interlocução e pressão junto à Câmara de Vereadores. Esta possibilidade de participação no planejamento orçamentário foi reduzida na cidade com o fim do processo de “Orçamento Participativo” e vem se tornando cada vez mais restrita com a adoção de dotações genéricas nas previsões de despesas e mecanismos de remanejamentos de verbas cada vez maiores para o Poder Executivo.
Porém, a perpetuação das velhas formas de se fazer política no Brasil, exige cuidados e demandará mudanças na atuação do Legislativo Municipal.
A primeira questão diz respeito à forma aleatória como as emendas poderão ser apresentadas, representando, na prática, um interesse ou demanda captada por cada vereador individualmente sem qualquer planejamento do ponto de vista territorial, histórico e coletivo que dialogue com um olhar para a cidade na sua totalidade. Isso reforça a necessidade de envolvimento muito maior de cada parlamentar e do Poder Legislativo com o planejamento da cidade e decisões políticas.
Sem desconsiderar obras e ações importantes que podem e devem surgir de tais emendas, é notório que em experiências já existentes, em grande parte, esse recurso é usado como troca de influência e favores e, principalmente, para a manutenção de currais eleitorais nos municípios. Uma forma de aumentar a interferência que o poder econômico já tem sobre os processos decisórios em nossa frágil democracia.
Portanto, o legislativo campineiro se coloca diante de um desafio e de uma grande responsabilidade que é dar consequência aos debates realizados na instituição em suas audiências e reuniões de comissões numa perspectiva sistêmica, de interesse público geral e não clientelista.
Concluo afirmando a necessidade de realmente implementarmos um orçamento com maior participação da sociedade, o que só pode ser feito a partir do diálogo permanente com suas organizações e representações. Um processo de escuta aos conselhos municipais, entidades representativas de classe, de bairros e movimentos sociais. Experiências assim não são apenas a antítese da forma como a política é conduzida de modo geral em nosso país como também representam o fortalecimento da democracia por meio da participação popular.
Paulo Bufalo – vereador em Campinas (PSOL) e professor da Escola Técnica Bento Quirino