O descolamento entre manifestantes e a elite do movimento Fora Bolsonaro: as vaias, o silenciamento ao Lula e a desmoralização
.Por Rafael Martarello.
A manifestação do dia 02/10 ocorrida no sábado na Avenida Paulista se destacou pela cisão entre a vontade popular e as manobras dos detentores do palanque. Os detentores do microfone tentaram manobrar a população para não vaiar abutres políticos burgueses e não entoar cantos a favor do Presidente Lula.
Composição do ato
O ato foi rico pela diversidade de vozes. Tiveram oportunidade de discursar grupos de diversas matrizes religiosas, grupos indígenas, entidades de profissionais pela democracia, e sindicatos – principalmente a maior central sindical da América Latina, a CUT. Quem esteve presente, ainda foi agraciado com expressões artísticas, sendo a mais aplaudida, uma poesia contra o Bolsonaro. Além disto, uma gama muito grande de movimentos sociais de luta popular, partidos políticos e personalidades políticas marcaram presença e espaço por meio de falas.
O movimento também foi muito rico na parte de baixo do palanque. Lá estavam quem compõe estes movimentos populares, quem milita nesses partidos de esquerda, e quem é diretamente afetado com a situação socioeconômica do país. Friso, os que lá estavam não recebem remuneração para atividade política e não vivem de eleição, são as pessoas que têm preocupação humanitária e ideológica, e claro ódio ao que o Bolsonaro fez e ao que gerou o Bolsonaro.
Organizadores x manifestantes
Da parte de baixo do palanque ficou claro uma série de manobras da elite que controlava o ato – aqueles que do alto representam a de si mesmos – em flagrante oposição a voz popular. Buscou-se, na expressão popular, empurrar goela a baixo um conjunto de referências políticas já rechaçadas pelos manifestantes.
Anteriormente ao ato, já havia denúncias em comitês organizativos que relataram que parte das lideranças convidaram a direita para as manifestações, mesmo após recentemente os manifestantes terem expulsado o PSDB dos atos. Outra denúncia que estava correndo nos grupos de organização do protesto era a tentativa de impedir Lula Presidente nos atos.
Durante o ato, isso foi exageradamente pior do que imaginado.
As aberrações começaram com um áudio reproduzido da banqueira Neca Setúbal. Sim leitores, uma herdeira bilionária do Banco Itaú. Muitos políticos também adotaram essa estratégia do áudio, principalmente dos partidos golpistas como PSDB e MDB. Setores que são articuladores do golpe, da prisão do Lula e do empossamento do Bolsonaro, e que carecem de simpatia popular.
Outro momento quente, foi a vaia e ofensa verbal ao Ciro Gomes. Ainda que do palanque, o presidenciável não teve coragem de proferir a bravata contra o Lula que havia repetido no Twitter. A multidão descontente o recebeu com vaias, passou para os gritos que o mandavam tomar no cu e arremessos de objetos inofensivos, ao final soou cantos ao Presidente Lula. O mesmo aconteceu para um representante do PSDB que não aguentou a pressão após 30 segundos segurando o microfone.
Os controladores do ato não aceitaram o rechaço popular e tentaram conter, desviar e silenciar a manifestação popular. Nenhuma solidariedade ao Ciro, um dos políticos mais dissimulados no cenário nacional, vale um texto específico para tratar sobre.
Outra denúncia a ser feita é que o nome do Lula não foi mencionado, mesmo sendo a principal alternativa eleitoral ao Bolsonaro. Nem mesmo a presidenta do PT ou o Haddad disseram a palavra Lula. Salvo engano somente um representante indígena e o companheiro Antônio Carlos do PCO exclamaram o nome do ex-presidente.
Em todos os momentos que os manifestantes começavam a gritar o nome do Lula, imediatamente quem controlava o microfone, fazia algum contorcionismo para paralisar os cantos.
Eu estava a 20 metros do principal caminhão de som e foi frustrada a tentativa de silenciar os cantos e as vaias que eram ensurdecedoras. Para quem não viu, deixo o vídeo da fala do Freixo que nem o potente carro de som conseguiu impedir de escutar os gritos da população em aclamação ao Lula.
Comentários finais
Primeiramente, todas estas figuras desprezíveis foram enaltecidas pela pessoa que anunciava a fala. Particularmente, eu tenho vergonha alheia dessa pessoa que se submeteu a tamanha desmoralização ideológica.
Há diversas estratégias de policiamento das vozes da rua para impor uma narrativa e uma preferência política estranha aos corpos que lá se manifestavam: alternância entre figuras dos movimentos populares e figuras rechaçadas; acordos para não exaltar o Lula; pedido de ordem; críticas de palanques e nas mídias burguesas contra quem os critica…
A população sabe quem é seu dirigente e que ela não trata o Fora Bolsonaro de forma personalista. Não é resolutório tirar uma pessoa e permanecer os que criaram, abriram caminho e sustentam Bolsonaro. Os manifestantes sabem que é incoerente lutar ao lado de grupos que têm a mesma agenda política do Bolsonaro.
Essa elite desmoralizada tenta colocar o movimento de rua de forma submissa ao processo eleitoral e de representantes eleitorais, quando o processo legitimamente democrático é o oposto. Dissimulam em seus discursos que a solução vem das mobilizações de ruas, mas quando a rua se manifesta, não aceitam e empreendem alguma manobra.
Por uma frente ampla só com os trabalhadores e com a esquerda
Vídeo com vaias a Ciro Gomes:
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