Em São Paulo – Os 35 anos de carreira de Rosângela Rennó (Belo Horizonte, 1962) serão celebrados com uma mostra panorâmica que reúne cerca de 130 obras entre 1987 e 2021 na Pinacoteca de São Paulo. A exposição Pequena ecologia da imagem apresenta os principais argumentos que a artista desenvolveu em torno da “fotografia expandida”, aquela que extrapola a criação de imagens autorais e inclui seus processos técnicos e sociais. Além de obras que pontuam toda essa trajetória, a curadoria inclui trabalhos que serão vistos pela primeira vez e um projeto comissionado pela Pina.
O ineditismo no Brasil fica por conta da instalação Eaux des colonies (2021), resultado da residência artística de Rennó em Colônia, na Alemanha, e a série Seres notáveis do mundo (2014-2021), produzida em Las Palmas, Espanha. Ainda faz parte da seleção, a videoinstalação Terra de José Ninguém (2021), uma reunião de videoaulas distribuídas pela igreja católica, em 1980, no que diz respeito à luta do cidadão comum pelos direitos políticos e civis, que foi comissionada pela Pinacoteca de São Paulo para esta exposição. Também ganham ênfase os trabalhos Realismo fantástico (1991); Série Vermelha (Militares) (2000-3) e Arquivo Universal (1992-).
Com curadoria de Ana Maria Maia, a mostra adota trabalhos de linguagens diversas, das fotografias às coleções, objetos, instalações e obras audiovisuais que estarão distribuídas em três salas no quarto andar da Pinacoteca Estação. Apesar da variedade de suportes, há um direcionamento para o modo como a artista observou e comentou um imaginário histórico brasileiro e suas persistências no presente. A organização expositiva abandona a cronologia para uma apresentação com bases nos assuntos tratados de forma persistente e reincidente no decorrer da sua trajetória.
“A artista considera a fotografia um pretexto para se questionar os arquivos, as narrativas e as relações de poder que fazem algumas imagens existirem e circularem, enquanto tantas outras permanecem invisíveis e, portanto, esquecidas. Nesse sentido, embora a linguagem fotográfica seja de fato predominante enquanto suporte e assunto em seu trabalho, ela aparece de forma expandida, o que envolve assumir seus bastidores, fazer críticas e desconstruções; entrelaçá-la a textos, máquinas, objetos e coleções”, resume a curadora Ana Maria Maia.
Ao todo, serão três núcleos temáticos. O primeiro deles se dedica à privacidade dos sujeitos e às políticas da memória. Neste espaço, constam trabalhos do início da carreira de Rosângela Rennó, quando predominava o recurso aos arquivos de família, de tom autobiográfico, e uma autorreferência dos processos e materiais fotográficos. A série Pequena Ecologia da Imagem, 1988, obra título da mostra, está nesta sala e parte dos álbuns de fotos tiradas por seu pai. Rennó manipula os elementos da imagem, deixando ora muitos escuros, apenas as silhuetas, e faz comentários visuais e textuais nas próprias fotos reveladas. Na sala, há também obras posteriores, como a série Corpo da alma (2003), feita a partir de fotos de jornais em que familiares de desaparecidos portam fotografias para publicizar sua busca. A artista reproduz essas imagens e, a partir delas, reflete sobre o papel da fotografia como atestado de existência, muito mais do que apenas memória.
Na próxima sala, encontra-se uma produção artística pautada pela observação das instâncias públicas. Como a imprensa, o estado e as instituições de formação e controle contribuem para processos de subjetivação individuais e coletivos? Neste eixo, o visitante terá acesso a alguns trabalhos do projeto Arquivo Universal (1992-), uma das séries mais longas e ainda em curso da artista, que consiste em uma coleção de matérias de jornais onde se faz referência a uma fotografia que está ausente. Os relatos, como, por exemplo, “a mulher indiana, V., tirou de sua roupa a foto encardida”, são diagramados por Rennó e podem ser apresentados em contornos simples ou até mesmo tornarem-se parte de uma instalação com um design de luz próprio, é o que acontece em Hipocampo (1995-8), que está presente na mostra.
O último eixo traz uma análise constante da artista sobre os efeitos da colonialidade na manutenção de sistemas de controle e violência, permeados por questões de classe e principalmente de raça. Na sala, será exposto o projeto inédito e ainda em construção Eaux des colonies (2020-), instalação com frascos de perfume que é resultado da residência artística de Rennó em Colônia, na Alemanha, realizada em 2020.
Para este mais recente trabalho, Rennó retrata o espírito expansionista do colonialismo, ao abordar a história da água de colônia. Com o crescimento das rotas mercantis na Europa, o elixir passou de objeto de desejo, símbolo de um estrato social, a sinônimo para qualquer tipo de perfume, atravessado inclusive por uma prática de falsificação que atingiu várias partes do mundo. A pesquisa sobre o percurso da água de colônia ao longo de mais de 300 anos de história foi iniciada durante a pandemia da covid-19, quando diversas instituições ampliaram seus acervos digitais, o que facilitou os estudos. O objetivo é exemplificar a eficiência de alguns modelos de colonização até os tempos atuais por meio da observação da “vantajosa” relação entre colônia e colônias.
Pequena ecologia da imagem
Mostra panorâmica da artista Rosângela Rennó
Curadoria: Ana Maria Maia
Período: 02.10.2021 a 07.03.2022
Pinacoteca Estação
Endereço: 4° andar Largo General Osório, 66 – Santa Ifigênia Ingressos Gratuitos, com reserva pelo site www.pinacoteca.org.br
Ingressos Gratuitos, com reserva pelo site www.pinacoteca.org.br
(Carta Campinas com informações de divulgação)