Online – A partir de 21 de setembro até 6 de outubro, às terças e quartas-feiras, às 21h, acontece uma temporada virtual de Águas do Mundo. A proposição, o dramaturgismo, a interpretação e a direção são de Vanessa Bruno. A direção audiovisual é do cineasta Pedro Paulo de Andrade. A proposta é uma atualização cênica do romance “Uma aprendizagem ou O Livro dos prazeres” filmada num teatro vazio, construindo um espetáculo teatral pensado para a câmera. Um encontro entre cinema, teatro e a literatura de Clarice Lispector.
“Uma aprendizagem ou O Livro dos Prazeres”, de Clarice Lispector, vem tendo uma recepção controversa desde sua publicação, em 1969. Pudera, foi sucessor de “A Paixão Segundo G.H.”, que fez sucesso na época de seu lançamento, e tem estilo muito diferente.
No livro, Clarice atualiza situações míticas para o contexto do Rio de Janeiro da segunda metade do século XX e se apropria do mito grego de Eros e Psiqué (que trata da superação de obstáculos ao amor) e da “Odisseia”, de Homero. Em sua narrativa, a autora traz a ficção para o ambiente doméstico e inverte os papéis, fazendo com que a mulher, Lóri, parta (ainda que de forma metafórica) em busca de autoconhecimento enquanto que, desta vez, é o homem (Ulisses) que a espera.
Ao partir do capítulo central do livro de Clarice, que também foi publicado no Jornal do Brasil com o título que dá nome à peça, a montagem teatral também traz esta “Odisseia” às avessas, mantendo a poética clariciana em terceira pessoa, mas com uma narrativa ainda mais fragmentada, fazendo saltos para o fluxo de pensamento da personagem e para os diálogos que ela estabelece com seu interlocutor (que está no telefone) e com o público.
Águas do Mundo conta o encontro de uma mulher com sua aprendizagem do prazer de viver e de amar. A protagonista busca desaprender a vergonha e a proibição do prazer. A peça explora a reversão do mito bíblico do pecado original e confere à mulher a entrada no Paraíso. Como diz o texto: “Ao contrário, Eva ao morder a maçã entrava no paraíso”. Durante uma ocorrência trivial (banhar-se no mar) ela se vê revelada numa realidade mais profunda. A Lori de Vanessa Bruno vê no mar seu encontro com a liberdade e com a libertação.
Para transpor a peça para o ambiente virtual, o diretor da filmagem Pedro Paulo de Andrade evidenciou a fragmentação narrativa e o trânsito entre a cena e a poesia, fazendo um intercâmbio entre o teatro apresentado em um palco e a linguagem cinematográfica, sem abrir mão nem de um nem de outro. Assim, a interdisciplinaridade na cena reforça a metalinguagem. Ele comenta: “É teatro? É cinema? É os dois? Tem câmera, mas tem palco. Tem plateia mas o público está em casa. A tradução da tradução da tradução. No entanto, o telefone sem fio não é sem intuição e não é sem coração. Muito pelo contrário: haja veias para fazer viajar tudo isso de sentimento através de tantas linguagens.”
Ligação com Antunes
Os encontros de Vanessa Bruno com Clarice Lispector foram vários. Idealizado há mais de dez anos pela atriz e diretora, Águas do Mundo foi o embrião de sua pesquisa de mestrado concluída em 2015 na Escola de Comunicação e Artes da Universidade São Paulo (ECA-USP). Nela, ela relaciona os procedimentos do diretor Antunes Filho com a transposição da literatura de Lispector para a cena.
Desde 2004, Vanessa está envolvida no Centro de Pesquisa Teatral do Sesc-SP (CPT), coordenado por Antunes, quando atuou em Prét-à-Porter 9, Pedra do Reino, além de ministrar aulas de retórica para atores no curso CPTzinho – Introdução ao Método do Ator.
Ela também dirigiu O Ovo e a Galinha, conto de Clarice, em 2010, e depois um outro espetáculo com oito de seus textos, o infanto-juvenil nomeado de Brincar de Pensar.
Difícil precisar, mas Clarice Lispector e Antunes Filho devem ter se conhecido no final da década de 1950 ou logo no início dos anos 60. Clarice foi madrinha do único filho que Antunes e a artista plástica Maria Bonomi tiveram.
Das coincidências, Águas do Mundo estreou no SESC Recife no dia da morte de Antunes, em 2 de maio de 2019. O espetáculo teve ainda algumas apresentações presenciais, antes de ser gravado no teatro do Centro Cultural da Diversidade (sem público) para essa versão que chega em temporada virtual.
Trilogia
Águas do Mundo completa a trilogia de solos do VULCÃO [criação e pesquisa cênica] juntamente com Pulso – a partir da vida e da obra de Sylvia Plath e A Dor – a partir de La Douleur de Marguerite Duras, espetáculos dirigidos por Vanessa Bruno. Além do deslocamento de grandes autoras para a cena, a investigação estabeleceu como foco fundamental discutir as construções sociais das mulheres de nosso tempo e constituir um espaço de encontro entre uma poética literária e uma poética teatral ambas com a intenção de possibilitar uma verticalização feminista em busca de sentidos humanos para o existir.
Ficha Técnica
Águas do Mundo
Proposição, dramaturgismo, interpretação e direção: Vanessa Bruno
Direção audiovisual: Pedro Paulo de Andrade
Fotografia e operação de câmera: Claus Stellfeld
Assistente de direção e preparação corporal: Livia Vilela
Segundo assistente: Luiz Felipe Bianchini
Trilha sonora e desenho de som: Edson Secco
Iluminação: Fernanda Guedella
Preparação vocal: Paula Mihran
Preparação musical: Zeca Loureiro
Voz gravada: Fabrício Licursi
Cenário, adereços e figurinos: Anne Cerrutti
Edição: Graciela Zapatta
Projeção: Gabriela Rocha
Captação de som: Dara Duarte
Teaser: Gabriela Rocha e Bianca Moreno
Comunicação visual: Cezar Siqueira
Fotos: Cezar Siqueira, Julio Calil e Rafaella Gomes
Produção: Rodrigo Fidelis e Gabi Gonçalves/ Corpo Rastreado
Apoio: Casa das Caldeiras, Jarro e Centro Cultural da Diversidade
Realização: VULCÃO [criação e pesquisa cênica]
Águas do Mundo
De 21 de setembro a 6 de outubro
terças e quartas-feiras, às 21h (21/9, 22/9, 28/9, 29/9, 5/10, 6/10)
Duração total: 45 minutos | Classificação Indicativa: 14 anos
Os ingressos são limitados e devem ser reservados no link
https://www.sympla.com.br/produtor/corporastreado
Valores: R$ 10, R$ 20 e R$ 30
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(Carta Campinas com informações de divulgação)