Online – Durante três meses, um grupo de 12 artistas que atuam e escrevem trabalharam sob a orientação e provocação do ator e diretor Eric Lenate. O objeto da pesquisa foi o estudo e análise da obra “Necropolítica”, do filósofo, teórico político, historiador e intelectual camaronês Achille Mbembe, as noções de biopoder/biopolítica de Michel Foucault e as correlações com o Brasil atual. O objetivo da pesquisa foi a criação de um campo de experimentações em que esse grupo de atores e atrizes trabalharam seu desenvolvimento pessoal enquanto criadores e criadoras, tanto no campo da atuação, quanto no campo da dramaturgia.

Rebecca Loise (Foto: Divulgação)

Ao final do processo, tomou corpo este experimento ceno-expressivo virtual composto por 12 solos, em temporada via streaming, com dramaturgia assinada pelo grupo e direção assinada por Eric Lenate. O elenco de 12 artistas é fomado por: Diego Lima, Juliana Poggi, Lorena Garrido, Luís Paulon, Maria Amélia Lonardoni, Maria Eduarda Pecego, Michelle Braz, Paloma Alecrim, Paulo Castello, Rebecca Loise, Renato Izepp e Vinícius Aguiar. A assistência de direção e de provocação dramatúrgica é de Vitor Julian.

Cemitério Vertical é o resultado do laboratório de montagem “Cemitério Vertical – Poéticas de Resistência à Necropolítica”, criada por Eric Lenate especialmente para o projeto de Oficinas de Montagem Inbox Cultural.

Ao transitar entre as sepulturas deste cemitério vertical, o público encontrará a “Verdade Paralela”: um futuro distópico ou uma realidade possível? A cabeça sendo comida por dentro pelos que – aparentemente soterrados – agora se manifestam; uma mulher artista, psicanalista e pesquisadora workaholic que vai perdendo sua memória, percepção e sanidade na medida em que seu companheiro se aproveita do isolamento social da pandemia do COVID-19 para enclausurar sua vida anímica com abusos psicológicos; uma personagem que nasceu, mas não viveu, e que tenta contato com Cristo em busca do seu direito de matar; uma mulher que, ao sentir a morte se manifestar em seu próprio corpo, percebe que passou a vida moribunda, sucumbindo à cultura machista de extermínio de mulheres e do feminino; uma mulher que alega estar acometida de Delirium Tremens Post-Mortem, que trata do alívio de finalmente ser diagnosticada com uma doença que poderia acarretar no ganho pleno da visão; um idealista que rememora sua trajetória até ali, refletindo sobre no que seus desejos e máscaras o transformaram; um executivo que se indigna “não sentir é uma virtude ou um vício?”; a bala perdida que sempre encontra um corpo negro.

Necropolítica, Biopoder, Políticas de Extermínio

O ensaio Necropolítica: biopoder, soberania, estado de exceção, política da morte, de Achille Mbembe, apresenta uma reflexão sobre a expressão máxima de soberania, concebida como “o poder e a capacidade de ditar quem pode viver e quem deve morrer”.

Para Foucault, biopolítica é a força que regula grandes populações ou conjunto dos indivíduos, diferentemente das práticas disciplinares utilizadas durante a antiguidade e na idade média que visavam governar apenas o indivíduo.

Já biopoder se refere aos “dispositivos” e tecnologias de poder que administram e controlam as populações por meio de técnicas, conhecimentos e instituições. Para atender aos interesses e vontades das mais variadas sociedades modernas, ideias de ameaça, medo e ódio ao inimigo foram mantidas como na Antiguidade e na Idade Média. Mas há um diferencial: se antes as guerras eram iniciadas a fim de proteger o soberano, com objetivos delimitados, e a morte de uns asseguraria a existência de todos ao final, os conflitos travados ao longo dos dois últimos séculos mostraram uma crueldade humana sem precedentes. Ou seja, para Foucault, os massacres, extermínios e regimes totalitários modernos, como o stalinismo e o nazi-fascismo, radicalizaram os mecanismos políticos de morte já existentes.

Ideias de controle dos corpos, purificação da população, supremacia de um determinado grupo sob outro não surgiram no século XX, mas nesse momento foram amplamente aceitas com base no poder exercido por governos e estruturas administrativas.

Por meio do discurso do Estado tais práticas tornaram-se aceitáveis, mesmo visando a rejeição, expulsão e aniquilação de determinados grupos. Para Foucault, o discurso é o instrumento de poder que determina condutas e valida políticas. No entanto, como analisado pelo mesmo, é preciso cautela ao lidar com tal instrumento já que este acabou possibilitando práticas cruéis e políticas que reforçam estereótipos, segregações, inimizades e extermínios. Em certos episódios da história da humanidade, alguns discursos políticos validaram massacres, extermínios e regimes totalitários modernos. Foi a partir da ideia de que discurso é um instrumento de poder que Mbembe foi além. Em seu livro “Necropolítica” apontou que esses dois conceitos são insuficientes para compreender relações de inimizade e perseguições contemporâneas. Como estudioso da escravidão, da descolonização e da negritude, relacionou o discurso e o poder de Foucault a um racismo de Estado presente nas sociedades contemporâneas que fortaleceu políticas de morte (necropolítica).

A necropolítica no Brasil

No Brasil, ao longo da história, alguns discursos tiveram o poder de retirar a humanidade de certos grupos através da desclassificação da pessoa, ou seja, da ideia de que ela merecia ser punida ou que as políticas são para a maioria e não para minorias.

A ditadura no Brasil foi um desses momentos. Os 21 anos do regime autoritário resultaram em mortes e corpos desaparecidos. À época, quando um opositor ao regime era preso, torturado ou assassinado, este corpo era considerado um inimigo visível e determinado que merecia um fim. O discurso promovido tinha o poder de estabelecer parâmetros aceitáveis para tirar vidas e controlar as pessoas.

A escravidão também foi um desses momentos. Os 300 anos da precarização de inúmeras vidas foram a base da construção e formação da sociedade brasileira. Mesmo assegurados a todos os direitos que nos igualam de forma jurídica, os dados mostram que nem todos têm as mesmas oportunidades.

Neste mesmo sentido de marginalização de pessoas, existem discursos que fortalecem a ideia de que existem lugares subalternizados com alta criminalidade em que vidas podem ser tiradas em prol do bem comum. A guerra ao tráfico e à criminalidade no Brasil é um exemplo.

Mas também há necropolítica nas prisões. O tratamento da população carcerária, com punições com foco na privação da liberdade, a superlotação das cadeias e baixas condições sanitárias são reflexos disso. Conforme apontado pelo CONJUR, só em 2018 foram mais de 1.400 mortes em presídios no Brasil.

SINOPSE:

Você está diante do conjunto de lápides de um cemitério vertical. Uma espécie de condomínio funerário onde todos que o habitam foram colocados, em maior ou menor nível, de maneira imposta e impiedosa. Dizem que a morte a todos iguala. Mas os caminhos até ela são bem distintos.

FICHA TÉCNICA

Dramaturgia e Atuação | Diego Lima, Juliana Poggi, Lorena Garrido, Luís Paulon, Maria Amélia Lonardoni, Maria Eduarda Pecego, Michelle Braz, Paloma Alecrim, Paulo Castello, Rebecca Loise, Renato Izepp, Vinícius Aguiar e Vitor Julian

Organização Dramatúrgica | Criação Coletiva

Provocação Dramatúrgica | Vitor Julian e Eric Lenate

Dramaturgia de Encenação Virtual | Eric Lenate e Vitor Julian

Direção | Eric Lenate

Direção Assistente | Vitor Julian

Supervisão técnica | Eric Lenate

Operação técnica | Luís Paulon e Vitor Julian

Efeitos visuais | Juliana Poggi, Luís Paulon, Michelle Braz e Vitor Julian

Trilha sonora original e desenho sonoro | L. P. Daniel

Músicas originais do solo “Verdade Paralela” | Michelle Braz

Arte gráfica e comunicação digital | Juliana Poggi

Assessoria de imprensa | Adriana Monteiro – Ofício das letras

Apoio na comunicação | Bossa Comunicação

Produção | Letícia Crozara

Direção de produção | Júlia Ribeiro e Kauê Telloli

Realização | Inbox Cultural

Parceria | Sociedade Líquida – Eric Lenate e L. P. Daniel

Agradecimentos | Estrela Straus, Gabriel Luiz, Luiz Eugênio, Manuella Loise, Daniella Luize, João Luiz, Marcelo Checchia, Bruno Javorski, Marcos Carvalho, Fabiano Manica, Priscila Venosa, Julia Medeiros, Patrícia Sakate, Mel Audi, Luís Rogério, Naara Aragão, Cyntia Batistetti, Jessica Moreira, Cíntia Moreira, Joana Lima, Tayná Campos, Maria Ignácia Rodrigues da Silva (em memória), Amélia de Castro Lonardoni (em memória), Arilda Rodrigues da Silva Lonardoni, Samira Lonardoni, Luíza Lonardoni Chá.

Homenagem – Às bruxas, cientistas, curandeiras, artistas, donas de casa, profissionais de todas as áreas (especialmente da saúde pública), agricultoras, enfim, a todas as mulheres deste mundo que lutam ou já lutaram por liberdade, igualdade de oportunidades, direitos femininos e justiça de gênero. Às travestis, mulheres e homens transgênero, lésbicas, gays, pessoas não binárias. Aos corpos dissidentes do sistema cis-heteronormativo – os que vieram antes, os que estão aqui, os que virão depois. Às crianças transviadas. Às pessoas que resistem, todos os dias, ao estado de exceção permanente perpetrado pelo Estado nas regiões periféricas e/ou marginalizadas. Aos povos originários destas terras. Às pessoas indígenas e quilombolas. Às mais de 500 mil vítimas da Covid-19 no Brasil, dentre as quais, tantas mortes poderiam ter sido evitadas. Nosso respeito e compaixão por todos e todas que resistiram, mas tiveram suas vidas interrompidas pelo genocídio cotidiano motivado por questões de gênero, raça e classe.

Solo “SEM NOME NO BOLSO”

De DIEGO LIMA

Sem nome no bolso escancara a concretude da violência em que corpos pretos são submetidos todos os dias. O texto parte de uma lembrança pessoal do ator Diego Lima, a perda de um jovem amigo, fato este que ocorreu nos 90 e que ainda ressoa como estado de alerta. Era um dia qualquer, desses que a gente não imagina ser o último e três jovens foram brutalmente assassinados, seus corpos perfurados ficaram expostos no muro do colégio pedacinho de chão. Ei Zé, o que foi que aconteceu contigo? Entre as rimas, gírias e perguntas sem respostas, uma conversa que poderia ter sido evitada se desenrola por meio das lembranças fragmentas do ator que na época era só uma criança. Se se encena a dor de um corpo preto, é porque ela precisa ainda ser dita e reelaborada, assim como esses corpos também precisam ser encarados não como corpos suspeitos, mas como pessoas constituídas de subjetividades, conhecimento e tradições.

Solo “VOCÊ DECIDE”

De JULIANA POGGI

E se o Jornal Nacional fosse pautado pelo WhatsApp? Recentemente um relatório da OCDE revelou que 67% dos alunos brasileiros de 15 anos não sabem diferenciar fatos de opiniões. Não deveria ser uma surpresa, numa era em que algoritmos nos colocam em bolhas que tornam cada vez mais difícil a convivência com o contraditório. A ideia de que apenas o que cabe na nossa narrativa própria sobre o mundo pode ser tido como fato alimenta a ficção binária que vem se esparramando pela realidade. Como seria nossa percepção da pandemia sem a grande mídia? Qual a última fronteira entre a mídia “independente” e a “paralela”? Acima de tudo, qual o nosso papel nisso, com a comunicação direta dos meios digitais? Nesta jornada, você decide: ou fake, ou fato. Como disse Cecília Meirelles, “é uma pena que não se possa estar ao mesmo tempo em dois lugares”.

Solo “REFLEXÕES PARA DANTES DO EXTERMÍNIO”

De LORENA GARRIDO

“Reflexões para Dantes do Extermínio”. De dentro de uma mochila com um bebê no extremo norte do país de nome vermelho e muito próximo a uma linha imaginária chamada equador, uma personagem que nasceu, mas não viveu, tenta contato com Cristo em busca do seu direito de matar.

Solo “SEM SENTIDO”

De LUÍS PAULON

Em janeiro de 2007 um dos violinistas mais famosos do mundo fez um experimento no metrô de Nova York. No intervalo entre suas apresentações, com lotação esgotada no Boston Symphony Hall, ele levou o seu Stradivarius de 1713 para uma estação de metrô, colocou um chapéu à sua frente, e tocou o seu recital de seis melodias de compositores clássicos. O experimento era para ver se ele, ou seu violino, ou as melodias perfeitamente executadas, seriam percebidas no meio de uma estação lotada. Coincidentemente eu passei por essa estação de metrô no mesmo dia e no exato momento em que ele tocava. Estava com fone de ouvido.

Solo “MORTE DA MULHER DE VERDADE

De MARIA AMÉLIA LONARDONI

Um dia você desperta e percebe que suas crenças, pensamentos, relacionamentos, escolhas, conquistas e anseios são fruto de uma construção machista, de um ecossistema condicionante e opressor, que aprisiona o feminino. Constata que por mais bem-sucedida que pareça, você não passa de chefe do departamento logístico: café coado, crianças na escola (com tarefa feita e lanche saudável), almoço adiantado, roupa na máquina, maquiagem na cara, relatórios entregues, reuniões realizadas, camisa do marido passada, cachorro no pet, unhas feitas… Seus desejos, quando não silenciados, são breves concessões numa rotina exaustiva, injusta e massacrante. Um dia você desperta na pandemia e precisa encarar essa verdade, que é a verdade de muitas mulheres. Verdade criada, conduzida, imposta pela sociedade dos “bons costumes” perversos. Cotidianamente, os sonhos, a liberdade, as diferenças, a diversidade, a criatividade, o brilho são ceifados de milhares de mulheres. É a morte a conta gotas, que muitas vezes traz sinais na psique e no corpo. Rouba o tempo e a saúde física e mental de crianças, jóvens, idosas e adultas de meia idade (seja lá que idade isso significa). E as que buscam sair dessa condição abusiva de existência, enfrentam uma morte ainda mais brutal e abrupta. Vítimas de feminicídio, pagam o preço com o que lhes restaria de vida. Não queimaram sutiãs mas tentaram matar essa “mulher de verdade” para viverem as suas verdades. Mas vocês não queriam igualdade? Não. Queremos ter tempo e espaço para ser, dizer, agir, pensar, fazer o que quisermos, sem termos de deixar a janta pronta. Nesta lápide do Cemitério Vertical, jazz a representação das mulheres que vivem mortas, mas que, a partir deste diagnóstico, tentam ressignificar suas vidas.

Solo “DELIRIUM TREMENS POST-MORTEM”

De MARIA EDUARDA PECEGO

Delirium Tremens Post-mortem trata da reflexão frente ao quão deliberado pode se tornar o distanciamento dos indivíduos frente às causas sociais que não os atingem diretamente. Quais rastros nos acompanharão eternamente? O trabalho tem como ponto de partida o dia 26 de abril de 1500: quando a primeira missa foi celebrada em solo brasileiro. Ou também: marco da instauração de necropoliticas que se alastram até os dias atuais, com o continuo auxilio de instituições intocáveis.

Solo “VERDADE PARALELA”

De MICHELLE BRAZ

Verdade paralela: Um futuro distópico ou uma realidade possível?

“Verdade paralela” é escrita partindo do cenário atual que se extrapola até uma realidade distópica mas possível. A dramaturgia é construída utilizando o sarcasmo e forçando os limites da realidade. Com referências que passam pelo futurismo, fascismo, nazismo e o renascimento do Ultra conservadorismo atual, se embebendo do universo das mídias sociais e digitais; a cada entrada se objetiva a questionar: esta será nossa futura realidade?

Solo “SUBMERSA”

De PALOMA ALECRIM

A BALA PERDIDA SEMPRE ACHA UM CORPO NEGRO.

SUBMERSA se assenta no tempo-espaço como um ritual cênico feminino em sua condição de isolamento e distanciamento social, em meio a pandemia do Covid 19. Nosso povo preto luta contra um vírus que não escolhe cor, mas expõe o racismo do Estado. O LABORATÓRIO DE MONTAGEM: CEMITÉRIO VERTICAL com Eric Lenate tem sido um espaço de lucidez em meio ao caos. Através de diálogos críticos, ampliação de repertório, provocações políticas e estéticas “Submersa” nasce da dor urgente de querer permanecer viva nessa desgoverno. Enfrentamos uma crise sanitária e econômica, o mundo em convulsão e qual corpo é alvo? como artista sinto que a arte-luta de cada dia se faz urgente e necessária, a arte me possibilita ser veículo para possíveis reflexões. Em 08 de Junho de 2021, a designer de interiores Kathlen Romeu morreu depois de ter sido atingida durante uma ação da Polícia Militar na comunidade do Lins de Vasconcelos, na Zona Norte do Rio. A jovem – que era negra, tinha 24 anos e estava grávida de 14 semanas – A PM negou que estivesse numa operação e alegou que agentes foram atacados. Mas a família de Kathlen contestou essa versão, dizendo que não houve troca de tiros e que os disparos partiram da polícia. “Se a minha filha fosse morta por bandido, eu não falaria nada com vocês. Foi a polícia que matou a minha filha”, afirmou a mãe da jovem. Cada corpo desse que despedaçam é um corte, um retalho de navalha, uma facada na alma, um tiro no meu coração. Eu, mulher negra, sou um corpo estraçalhado no chão. Estraçalhado. Picotado. Estuprado. Violentado. E nada, nada vão fazer com os pedaços do meu corpo sub-mer-so no chão.

solo “NEUROCISTICERCOSE”

de PAULO CASTELLO

NEUROCISTICERCOSE: Há palavras e expressões que de tanto serem usadas, se desgastam como um corpo que envelhece. E que de nunca serem usadas, não funcionam, como um carro que não se liga esquecido em uma garagem. “É sobre isso”, por exemplo, já é tão usada quanto ” Eu te amo”. E a palavra ” Empatia”, é desgastada por uso excessivo ou por falta de uso? Se colocar no lugar de outrem ou pensar em “por os sapatos alheios” é possível num mundo tomado pelo Egoísmo e imediatismo? É, realmente, possível? Por mais que se abra a cabeça, onde se guarda o egoísmo? Quem nunca se viu desesperado porque suas necessidades não foram atendidas? Todo mundo tem necessidades não atendidas. A grande questão é: as minhas necessidades devem ser atendidas primeiro que as suas? Numa infinita cadeia de necessidades não atendidas chegamos a um corpo que julga que fizemos um acordo social para que tivéssemos nosso ”instinto primitivo” controlado e ordem assegurada. Quem foi o primeiro homem ou mulher que assinou esse contrato e disse: “isso aqui é meu , isso aqui é seu, e eu vou administrar essa região para todos, para o bem estar geral.” Em looping infinito , não parece se chegar a lugar algum , se entra no paradoxo do ovo e da galinha e ante o caos e a ruína- esses sim, avançam , sempre – aparece, nesses questionamentos, o Ódio. A revolta. O desespero. Se a farinha é pouca e o seu pirão virá primeiro, quem sobra por último? Aliás, quem sobra? Quem vence? “Vencer”, essa palavra é real ou é tão falsa quanto a palavra ” estabilidade”? O fim ulterior é o verme que come a carne. Mas pensar sobre essas coisas nesse momento devora a cabeça, suga a força de pensamento, ataca o sistema nervoso central. E se então, os vermes, que sobrarão por último, fossem terroristas poéticos que se alimentassem de ”lixo selecionado” ? Se a vida fosse dos vermes e a morte fosse dos vivos, será que seria tudo diferente? Já me confundi, porque acho , sinceramente, que o mundo já é dominado por vermes. Mas se toda ação traz uma reação, deveriam existir outros tipos de vermes, além dos que conheço: os Vermes justiceiros, que parecem não existir e –segundo me disseram – repousam adormecidos em aparente utopia, pero que los hay, los hay.

solo “MÉTODO DE EXTERMÍNIO DA VIDA ANÍMICA OU CÂMERA DE GÁS LIGHT”

de REBECCA LOISE

Método de extermínio da vida anímica ou Câmera de Gás Light é uma atuação que fala sobre uma mulher artista, psicanalista e pesquisadora workaholic que vai perdendo sua memória, percepção e sanidade na medida em que o seu companheiro se aproveita do isolamento social da pandemia do COVID-19 para enclausurar sua vida anímica com abusos psicológicos.

solo “IDEOLOGIA, EU QUERO UMA PRA VIVER?”

de RENATO IZEPP

Em sua lápide um idealista rememora sua trajetória até ali, refletindo sobre o que seus desejos e mascaras o transformaram.

“Ideologia, eu quero uma pra viver?” esmiúça a trajetória de experiências contrastantes de um sujeito que busca se expressar no mundo. Através de um pertencimento que o enquadra, mas não encaixa. Pai militar. Fervor religioso. Teatro. Uma bandeira imponente. Memórias e sentimentos se misturam com o fervilhar do desejo de mudar as coisas. De um ponto de vista ambíguo-excludente, o que pode resultar disso?

solo “(DES)ALMA”

de VINÍCIUS AGUIAR

No dicionário “Egocentrismo” é sinônimo de: “conjunto de atitudes ou comportamentos indicando que um indivíduo se refere essencialmente a si mesmo”. Egocentrismo rima com: ceticismo, pedantismo, socialismo, cepticismo, idealismo, empirismo, despotismo, esquematismo, reacionarismo, verbalismo, diletanstismo, organismo, egoísmo, poderia rimar com bernardismo. Bernardo Matarazzo Álvares Penteado, Paulistano do Jardins, 39 anos, esteta por natureza, educado nas melhores escolas, com repertórios cultural e intelectual invejáveis, sabia distinguir o que era bom do excelente. Era um referencial de estilo e sofisticação dentre os mais exigentes, figura tarimbada nas colunas sociais, fez parte da lista da Forbes Under 40 por 7 anos seguidos. Teve sua vida interrompida por causa da COVID-19 e ausência da vacina, que nem todo o seu dinheiro e status pode comprar. Jaz em túmulo da família no cemitério da Consolação, descansa em paz, é o que todos pensam, em um caixão de acrílico italiano, climatizado e blindado. É o que todos pensam. Atordoado dentro de um cubículo de 2×1 metros, questiona a brevidade da vida, a ausência de privilégios no seu status pós mortis, enaltece o design italiano e desfia críticas mordazes ao estado necropolítico atual, do alto de seu túmulo e condição precária, para quem foi criado às margens do Atlético Paulistano. (DES)ALMA é escrito e encenado pelo ator e dramaturgo Vinícius Aguiar

Experimento ‘Cemitério Vertical’

Curta Temporada – dias 24 a 25 de julho e 31 a 01 de agosto

Sábados e Domingos às 20h

Pedimos que acessem o link do ingresso com 15 minutos de antecedência

Ingressos a R$10, R$20, R$30 ou R$50

Via Sympla Streaming https://www.sympla.com.br/cemiterio-vertical__1277350

Duração: 90 minutos

Todos os dias o público é convidado para uma conversa após a sessão

Classificação: 16 anos

(Carta Campinas com informações de divulgação)