Online – A obra teatral completa de Hilda Hilst (1930-2004) é apresentada em 8x Hilda, ciclo de leituras online com participação dos atores Lavínia Pannunzio, Joca Andreazza, Flávia Couto e Kiko Rieser, entre os dias 7 de fevereiro e 28 de março. A curadoria é de Fábio Hilst e a direção se alterna, semanalmente, entre os próprios atores.

(Foto: Jose Luis Mora Fuentes) Acervo Instituto Hilda Hilst

A transmissão é ao vivo e gratuita, aos domingos, às 18h, pelo canal YouTube/CuradoriaHilst. As sessões serão gravadas e disponibilizadas com tradução em Libras no mesmo canal, sempre na quarta-feira seguinte a cada leitura, às 20h.

8x Hilda comemora os 90 anos de nascimento da escritora paulista, completados em 2020, trazendo à cena suas oito peças, escritas entre os anos de 1967 e 1969: A Empresa (A Possessa) (7/2), O Rato no Muro (14/2), O Visitante (21/2), Auto da Barca de Camiri (28/2), As Aves da Noite (7/3), O Novo Sistema (14/3), O Verdugo (21/3) e A Morte do Patriarca (28/3).

O projeto propõe um jogo cênico virtual que celebra e explora a dramaturgia hilstiana, criada em pleno período da ditadura militar brasileira. Segundo o idealizador Fábio Hilst, “a dinâmica consiste no mergulho dos quatro atores/encenadores  no universo de Hilda, desvendando os textos – e subtextos – e os mais de 60 personagens da obra, para mostrar ao público o processo de estudo de uma peça e o início da construção de personagens e cenas”. A ideia de encenar o teatro completo de Hilda Hilst é uma iniciativa que Fábio, pela produtora Três no Tapa, já havia colocado em andamento, em 2020, com a montagem de As Aves da Noite, cuja estreia foi adiada em decorrência da quarentena imposta pela pandemia do coronavírus.

A produção dramatúrgica de Hilda Hilst – criada no momento em que o teatro e os artistas viviam sob os mandos e desmandos da censura do regime militar – é considerada um ensaio para sua obra em prosa da década de 1970, mais livres nos artifícios da linguagem e nas tramas do cotidiano. Seus textos teatrais traduzem a atmosfera claustrofóbica de opressão e os questionamentos ao sistema, representado pela igreja, pelo Estado ou pela ciência, para se comunicar com as pessoas de forma “urgente” e “terrível”. Os personagens, vítimas ou algozes, aparecem em situações limite, presos às estruturas que escravizam e alienam – celas, porões, colégios religiosos ou locais de julgamento e execução de prisioneiros. As máscaras sociais (juiz, carcereiro, monsenhor, papa, madre superiora) são arrancadas por Hilda, que mostra também personagens dotados de almas, tolhidas do seu verdadeiro voo.

As primeiras encenações ocorreram na cena universitária, na Escola de Artes Dramáticas, com O Rato no Muro e O Visitante, no final dos anos 60. O Verdugo teve a primeira montagem profissional, em 1973, sendo a única peça hilstiana editada na época. As quatro primeiras peças de Hilda Hilst foram publicadas, em 2000, pela Editora Nankin (Teatro Reunido). Em 2008, quatro anos após sua morte, a Editora Globo publicou seu teatro completo em volume único.

FICHA TÉCNICA: Textos: Hilda Hilst. Curadoria / idealização: Fábio Hilst. Elenco / direção: Lavínia Pannunzio, Joca Andreazza, Flávia Couto e Kiko Rieser. Produção: Três no Tapa Produções Artísticas. Assistência de produção: Fernanda Lorenzoni. Técnico de transmissão: Gustavo Bricks e Henrique Fonseca. Design / gerenciamento de mídia: Ton Prado. Sinopses: Hilda Hilst – Teatro Completo (L&PM / Leusa Araujo). Realização: ProAC Expresso LAB, da Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Governo do Estado de São Paulo. As leituras contam com participação de atores convidados, conforme a demanda de personagens de cada texto.

PROGRAMAÇÃO

Ciclo de leituras: 8x Hilda

Quando: 7 de fevereiro a 28 de março/2021

Horário: Domingos, às 18h

Onde: Youtube/CuradoriaHilst

Grátis. Duração estimada: 120 min. Classificação: 14 anos.

Com tradução em Libras (gravado): 10/02 a 31/03 – Quartas, às 20h

7 de fevereiro: A Empresa (A Possessa)

A Empresa (inicialmente, A Possessa) foi o texto de estreia de Hilda Hilst na dramaturgia, em 1967. Trata-se de uma crítica ao trabalho alienado, com o qual se busca mais a eficiência que a criatividade. América é uma adolescente questionadora que se rebela contra a tradição representada pelo colégio religioso e terá de prestar contas ao Monsenhor e ao Superintendente. Esse inconformismo é medido por certos “robôs eletrônicos” (personagens Eta e Dzeta) criados pela própria América que, depois, são utilizados pela instituição para conter as “asas do espírito” e a imaginação. Ou seja, os dirigentes do colégio/empresa impõem às Postulantes e a América um trabalho alienante, o que desencadeia a morte da protagonista. 7 personagens. Direção: Flávia Couto.

14 de fevereiro: O Rato no Muro

O ambiente do colégio religioso, recorrente na obra da autora, aparece em O Rato no Muro (1967) ainda mais estreito. Tudo se passa numa capela, onde a Superiora está cercada por nove irmãs, identificadas por letras de A a I. Estão ajoelhadas, e ao lado de cada uma delas, o “chicote de três cordas”. Cada uma das religiosas expressa visões diferentes, a partir de pequenos abalos ao austero cotidiano do claustro. Irmã H (alter ego da autora) é a mais questionadora e lúcida. Tenta em vão mostrar às outras a necessidade de libertação, representada pelo desejo de ser o rato, único capaz de ultrapassar os limites do muro da opressão e do pensamento único. 10 personagens. Direção: Kiko Rieser.

21 de fevereiro: O Visitante

Peça mais poética de Hilda Hilst, O Visitante (1968) gira em torno do conflito entre Ana e Maria – mãe e filha. Ana, encantadora e meiga, descobre-se grávida. Mas a filha, estéril e parecendo mais velha, levanta suspeitas sobre a paternidade, já que seu marido, genro de Ana, é o único homem da casa. A chegada de um visitante, o Corcunda, provoca uma distensão sem, no entanto, apagar o conflito que, de um lado tem o apelo da vida, do sexo e do amor e, do outro, a aspereza de um mundo sem prazer. 4 personagens. Direção: Lavínia Pannunzio.

28 de fevereiro: Auto da Barca de Camiri

Baseado em fatos reais, Auto da Barca de Camiri é a quarta peça de Hilda Hist, escrita em 1968. Em julgamento encontra-se o revolucionário argentino Ernesto Che Guevara, morto em Camiri, na Bolívia – ainda que seu nome não seja mencionado e que sua figura, na peça, seja confundida com a de Cristo. Sob a tensão permanente dos ruídos de metralhadora soando do lado de fora e com o desconforto do cheiro dos populares que desagradam os julgadores, Hilda introduz elementos grotescos e inovadores. A severidade da Lei é representada pelos juízes (vistos de ceroulas antes de vestirem as togas com abundantes rendas nos decotes e mangas). Há também o Prelado e o Agente. A condenação está decidida, a despeito do depoimento do Trapezista e do Passarinheiro que, assim como os demais humildes, serão executados pelas metralhadoras. 7 personagens. Direção: Joca Andreazza.

7 de março: As Aves da Noite

Escrita em 1968, As Aves da Noiteé baseada na história real do padre franciscano Maximilian Kolbe, morto em 1941, no campo nazista de Auschwitz. Ele se apresentou voluntariamente para ocupar o lugar de um judeu pai de família sorteado para morrer no chamado “porão da fome” em represália à fuga de um prisioneiro. No porão da fome, a autora coloca em conflito os prisioneiros – o padre, o carcereiro, o poeta, o estudante, o joalheiro –, visitados pelo comandante da SS, pela mulher que limpa os fornos e por Hans, o ajudante da SS. O processo de beatificação do padre Maximilian Kolbe, iniciado em 1968, resulta na canonização em 1982, pelo papa João Paulo II. Hoje São Maximiliano é considerado padroeiro dos jornalistas e radialistas e protetor da liberdade de expressão. 7 personagens. Direção: Kiko Rieser.

14 de março: O Novo Sistema

O Novo Sistema, escrita em 1968, volta ao tema da privação da liberdade e da criatividade por regimes totalitários. O personagem central, o Menino prodígio em física, não se conformará com a execução dos dissidentes em praça pública nem com a opressão – desta vez exercida pela ciência – à evolução espiritual do indivíduo. Assim como em A Empresa, é evidente a afinidade com a literatura distópica de George Orwell e Aldous Huxley. 12 personagens. Direção: Joca Andreazza.

21 de março: O Verdugo

O Verdugo foi escrito em 1969 e, no mesmo ano, recebeu o prêmio Anchieta. Conta a história do carrasco que se recusa a matar o Homem, um agitador inocente, condenado pelos Juízes e amado por seu povo. Temendo reações contrárias, os Juízes tentam – em vão – subornar o verdugo para que este realize a tarefa o mais rápido possível. Apenas o jovem filho entende a recusa do pai. A mulher, ao contrário, aceita a oferta em dinheiro e toma o lugar do marido ao pé do patíbulo, com a concordância da filha e do genro. No final, o verdugo reaparece, desmascara a mulher e conta ao povo o que se passara após sua decisão. O povo reage violentamente matando a pauladas o carrasco e o Homem. O filho sobrevive e foge com os Homens-coiotes, símbolos de resistência. 10 personagens. Direção: Flávia Couto.

28 de março: A Morte do Patriarca

Em A Morte do Patriarca (1969) podemos reconhecer o humor ácido e o tom de escárnio de Hilda. Um Demônio com “rabo elegante” e de modos finos discute os dogmas da religião e o destino humano com Anjos, o Cardeal e o Monsenhor, ante a visão dos bustos de Marx, Mao, Lenin e Ulisses, de uma enorme estátua de Cristo e da tentativa do Monsenhor de colocar asas na escultura de um pássaro. O Demônio seduzirá o Cardeal a tomar o lugar do Papa; posteriormente, o próprio Papa é morto pelo povo. 9 personagens. Direção: Lavínia Pannunzio.

(Carta Campinas com informações de divulgação)