O Fórum Permanente de Cultura de Campinas divulgou uma carta pública relatando o abandono das atividades artísticas e culturais da cidade e a falência da Secretaria Municipal de Cultura.
“Teatros sucateados, espaços culturais destruídos, ausência de editais públicos há mais de 4 anos, nenhum festival ou mostra pública que não seja iniciativa da sociedade civil, péssima gestão interna, com funcionários desmotivados e sublocados”, anota na carta Cassiane Tomilhero, vice-presidenta do Conselho de Cultura de Campinas.
Segundo os integrantes do Fórum, diante da crise agravada pela pandemia e da inabilidade da Secretaria de Cultura em apresentar propostas e soluções para o setor, o Fórum fará uma transmissão pela internet (live) que será realizada nesta terça feira, 05/05 às 18h. (@ForumdeCulturadeCampinas)
O objetivo é debater propostas emergenciais apresentadas pelo Fórum à Secretaria de Cultura de Campinas. “O setor cultural foi um dos primeiros a parar e será um dos últimos a retomar as atividades. É sabido que a Cultura tem papel fundante na subjetividade das pessoas e se mostra vital em momentos como esse. Também sabemos que têm grande importância na economia das cidades, além de manter um grande número de empregos. No entanto, nada disso faz com que o poder público assuma seu lugar de responsabilidade neste momento”, diz a convocação para a live.
Veja carta:
A MÁ GESTÃO E A FALÊNCIA DA SECRETARIA MUNICIPAL DE CULTURA DE CAMPINAS
Cidadãs e cidadãos,
É com indignação e perplexidade que diversos segmentos do setor cultural da cidade de Campinas tornam pública esta carta denúncia através do Fórum Permanente de Cultura de Campinas, fazendo saber à sociedade, bem como ao Chefe do Executivo, Prefeito Jonas Donizette, que diante da situação emergencial provocada pela pandemia da Covid-19, trabalhadoras e trabalhadores da Cultura, bem como espaços culturais distribuídos em diversas regiões do município, estão abandonados pelo poder executivo.
Este abandono tem como principal origem a ineficaz gestão do Senhor Ney Carrasco como Secretário de Cultura. A lista dos descasos é imensa e dá provas da má gestão, resultando numa cidade com teatros sucateados, espaços culturais destruídos, ausência de editais públicos há mais de 4 anos, nenhum festival ou mostra pública que não seja iniciativa da sociedade civil, péssima gestão interna, com funcionários desmotivados e sublocados. Isso tudo em uma cidade na qual o Secretário representa os Secretários de Cultura do País no Fórum Nacional. Isso tudo em uma cidade que, para além das capitais, aponta como uma das principais referências culturais do Brasil e têm um dos maiores orçamentos municipais.
Mas hoje não abordaremos toda esta lista. Iremos nos deter nas questões orçamentárias.
Em termos de orçamento, desde 2015 a Secretaria Municipal de Cultura sofre com cortes proporcionalmente sempre mais severos do que as previsões de arrecadação, que fazem com que o orçamento de 2020 tenha reduzido equivalente a cerca de 50% do que era em 2015. Ou seja, mesmo quando houve crescimento, a Cultura perdeu e não acompanhou e quando houve queda, a pasta da cultura perdeu proporcionalmente mais do que a arrecadação. Em 2013 a pasta da Cultura detinha média de 1% do orçamento municipal, em 2015 chegou à previsão de 2,5% e em 2020 voltamos ao patamar de 1% da arrecadação.
Isso tudo quando falamos de orçamento previsto, mas a execução é ainda mais grave. É notável a baixa taxa de execução efetiva de recursos pela pasta, tanto devido a cortes e contingenciamentos – resultado da frustração das expectativas de arrecadação da Prefeitura Municipal de Cultura, quanto da incapacidade do gestor da pasta em desenvolver projetos e programas.
Estas informações resultam de um estudo preliminar realizado por este Fórum com base nos dados do Portal da Transparência de Campinas que será disponibilizado publicamente em breve.
Diante disso concluímos que, apesar dos esforços de muitos funcionários em buscar soluções para atender a necessidade da produção cultural, a Secretaria Municipal de Cultura está falida por incompetência de seu gestor e pelo desinteresse desta Gestão Municipal em olhar com atenção para este Setor. Sendo a maior evidência dessa tese o fato que o Fundo de Assistência a Cultura conta hoje, segundo o secretário, com apenas R$ 50.000,00 para realização de edital de apoio emergencial para todo o setor cultural, que além de gerar empregos e contribuir significativamente com a economia do município, tem papel fundamental na formação de identidade, nas questões simbólicas, lazer, turismo, saúde, segurança e na subjetividade das pessoas que moram nesta cidade.
Segundo levantamentos aferidos por instituições nacionais e internacionais e centros de pesquisa de reconhecimento público e notório tais como ONU, UNESCO, FGV, Sesc, Fundação Getúlio Vargas, entre outros, a Cultura, depois da Saúde, é um dos setores mais atingidos por esta crise na medida em que foi a primeira a fechar suas portas e será a última a reabri-las. A natureza de suas atividades sociais e econômicas pressupõe aglomerações e de acordo com afirmações científicas de monitoramento da disseminação do contágio, este controle perdurará por muito mais tempo que a atual quarentena, para evitar o colapso do sistema de saúde.
Isso atinge um setor que gera 2,64% do PIB brasileiro, sendo 3,9% deste total só no Estado de São Paulo. Responsável por mais de um milhão de empregos formais diretos, segundo estudo da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (FIRJAN) e em 2018 levantamentos apontaram que o número de trabalhadoras e trabalhadores da cultura no país são da ordem de 5,2 milhões, com base em dados do IBGE. Há no setor cerca de 250 mil empresas, associações e instituições e 15 mil espaços culturais independentes de pequeno e médio porte espalhados em território nacional.
Diante de tal exposição, manifestamos nossa reivindicação de URGÊNCIA de um plano por parte da Administração Municipal para o Setor Cultural. É necessário um programa que contenha propostas para impedir o fechamento de espaços e instituições de arte e cultura, auxílio para amenizar os impactos do desemprego em massa e por tempo indeterminado destes trabalhadores, que levará muito mais pessoas para a linha da miséria, condições e subsídio para realização de trabalho virtual ou futuro que possa ser entregue para o município, dentre outras.
Ressaltamos que as escolas, os serviços de saúde e tantos outros equipamentos públicos e tantas pessoas, podem ser beneficiadas pelo trabalho que temos a oferecer. A produção de arte e cultura, sempre essenciais, são agora VITAIS para manutenção da saúde e bem estar da sociedade como um todo.
Muitos poderão, como já escutamos, dizer que toda atenção agora deve ser direcionada à saúde e isso sem sombra de dúvida nos coloca em comum acordo. Entretanto, toda a administração pública, seja Federal, Estadual ou Municipal sabe que é responsável pela manutenção do equilíbrio da estrutura social, sobretudo em tempos de crise, para evitar um colapso irremediável da sociedade como um todo. Este é o papel dos Governos. Assim, ao pensarmos a sociedade é fundamental, como nos diz o pesquisador cultural Celio Turino, imaginar que, na atual circunstância que vivemos, deveríamos considerar o ser humano regido por um tripé constituído por 3 vértices: A Saúde, A Economia e A Subjetividade. Todos os 3, atravessados por uma das características que nos diferencia de outros animais e torna humanos: a cultura. Usar ou não a máscara, tomar todos os cuidados contra possíveis contaminações, respeitar decisões da coletividade, manter a quarentena apesar das dificuldades causadas por ela, tudo isso é cultura.
Agradecemos a atenção e aguardamos respostas para as questões apresentadas.
Atenciosamente,
Cassiane Tomilhero
Presidenta do Fórum Permanente de Cultura de Campinas
Vice-presidenta do Conselho de Cultura de Campinas