O governo indiano determinou, na semana passada, três semanas de confinamento obrigatório no país, que tem mais de 1,3 bilhão de habitantes. No entanto, uma semana depois, os efeitos são sentidos em outra área relevante para a saúde e o bem-estar da população: os níveis de poluição caíram drasticamente.
A Índia é um dos países do mundo onde mais se sentem os efeitos nefastos da poluição atmosférica. Em 2019, 21 das 30 cidades mais poluídas do mundo eram indianas e, em novembro passado, foi declarada emergência de saúde pública devido aos perigosos níveis de poluição em Nova Delhi.
Agora, as medidas impostas no país para conter o novo coronavírus parecem ter resultado na resolução, ainda que temporária, de um problema premente da poluição na Índia. Na semana passada, diante da ameaça do covid-19, o governo indiano decretou quarentena de três semanas em todo o país para travar a propagação do vírus.
Dias depois, o primeiro-ministro pediu desculpa aos indianos por uma medida “muito dura, mas necessária”, que afeta sobretudo os mais pobres. As ruas encheram-se de pessoas, migrantes que nos últimos dias procuram regressar às aldeias para garantir alimentação durante os dias de quarentena.
As dificuldades do confinamento obrigatório são mais que percetíveis em um dos países mais populosos do mundo. As autoridades estão a usar bastões para impedir a circulação de pessoas. Há relatos de que, mesmo a população que tenta sair à rua para comprar alimentos, é agredida pela polícia. A Índia registra um total de 1.397 casos do novo coronavírus e 35 mortes.
No entanto, mesmo com toda a dificuldade e problemas de manter em casa um país de 1,3 bilhão de habitantes, a resposta ao covid-19 parece ter efeitos colaterais nos níveis de poluição no país, como aconteceu na China e Europa.
Com todas as fábricas, lojas e locais de culto fechados, além da suspensão dos transportes públicos e dos trabalhos de construção, as principais cidades indianas registaram quedas acentuadas e sem precedentes na poluição em menos de uma semana.
Foi registrada queda acentuada nos níveis de partículas PM2.5: entre 20 e 27 de março, houve uma diminuição de 71% nessas partículas altamente prejudiciais à saúde humana em Nova Delhi, de 91 microgramas de partículas por metro cúbico para apenas 26 microgramas. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), o máximo deve ser de 25 microgramas.
Também o dióxido de azoto caiu 71% na capital indiana, de 52 por metro cúbico para 15 partículas durante o mesmo período. Níveis semelhantes de diminuição da poluição foram registados em outras cidades como Mumbai, Chennai, Calcutá e Bangalore.
“Não vejo um céu tão azul em Delhi há dez anos”, disse Jyoti Pande Lavakare, representante de uma organização ambientalista indiana, a Care for Aid, em declarações à CNN.
Problemas respiratórios
Mesmo antes de se ter começado o período de confinamento obrigatório na Índia, os níveis de poluição já estavam em queda desde o início de março. Nas cidades de Mumbai, Pune e Ahmedabad, os níveis médios de dióxido de azoto caíram entre 40% e 50%, em comparação aos anos de 2018 e 2019.
“A redução nas emissões de combustíveis fósseis deve-se ao setor de transportes e à desaceleração em outras atividades”, explicou Gufran Beig, cientista do System of Air Quality and Weather Forecasting and Research.
“Obviamente que essa não é a maneira ideal de reduzir a poluição do ar, mas isso só prova que a poluição é causada pelo homem”, disse Jyoti Pande Lavakare, da organização Care for Aid.
No entanto, apesar da diminuição desses poluentes, o mal já pode estar feito. Isso porque a Índia poderá ter uma população potencialmente mais vulnerável à pandemia do novo coronavírus devido aos problemas respiratórios que são provocados pela poluição.
O país tem uma das maiores taxas mundiais de doenças respiratórias do mundo, antecedentes que podem criar mais complicações em caso de infecção pelo novo coronavírus.
“Existem muitos casos de doenças respiratórias, mesmo em crianças menores”, explicou Kavakare.
Em nível global, a poluição é responsável pela morte de 7 milhões de pessoas por ano, de acordo com dados da OMS. (Por RTP)