O Plenário da Câmara Federal pode votar nesta terça-feira (22) o projeto que entrega aos Estados Unidos a Base de Lançamentos de Alcântara, no Maranhão. A proposta é alvo de críticas da oposição e de comunidades quilombolas que vivem na região. 

Instalações do Centro de Lançamento de Alcântara (CLA), no Maranhão. (foto valter campanato – ABr)

O chamado Acordo de Salvaguardas Tecnológicas (AST), assinado em março deste ano, estabelece regras que protegem a tecnologia estadunidense para lançamentos. O texto estabelece ainda normas para técnicos brasileiros em relação ao uso da base, restringindo a circulação nela. Esse é um dos pontos criticados por parlamentares oposicionistas, que enxergam na medida um ataque à soberania brasileira. 

Para o deputado Glauber Braga (Psol-RJ), o acordo fere o princípio da reciprocidade, o qual é historicamente defendido pela diplomacia brasileira. Para que ele fosse cumprido, deveria existir uma contrapartida equivalente no território estadunidense. “Eu duvido que lá nos Estados Unidos exista algo do gênero”, questionou.

“Representantes das Forças Armadas ou do governo dos Estados Unidos podem entrar em todos os espaços. O mesmo não acontece em relação ao Brasil, que tem espaços restritos”, critica. 

Roberto Amaral, ex-ministro de Ciência e Tecnologia (2003-2004), definiu a parceria, em artigo, como um “acordo indigno”. Ele aponta que a entrega da Base de Alcântara significará o fim do programa espacial brasileiro, o que impacta em áreas cruciais da economia. “Quem não tem [programa espacial], é obrigado a alugar os serviços de terceiros”, escreveu.

“O objetivo dos EUA, nesse acordo, dito simplesmente de ‘Salvaguardas Tecnológicas’, mais do que dispor de uma base de lançamentos (da qual não carecem), é impedir que o Brasil tenha seu próprio programa espacial, pois isso não é permitido em seu ‘quintal’, e somos seu ‘quintal’ hoje, também por decisão do atual governo, subalterno aos seus interesses”, diz o texto.

O acordo, que agora é apreciado pelos parlamentares, foi assinado durante visita de Jair Bolsonaro ao presidente estadunidense, Donald Trump.

Comunidades

A Base de Alcântara fica em uma região habitada por comunidades tradicionais, especialmente quilombolas. Já na década de 1980, quando era construída, parte dos moradores foi realocada em outros lugares. O processo foi alvo de críticas pelo desagregamento dos modos de vida daquela população. 

Com a entrega da base para os Estados Unidos, a expectativa é que haja uma ampliação das instalações. Lideranças quilombolas temem que, novamente, a população seja prejudicada.

“Para além da soberania nacional, o que importa para nós são vidas humanas. Pessoas que estão ali, nasceram e que se criaram secularmente ali”, diz a Célia Cristina, representante das comunidades atingidas. 

Na Comissão de Relações Exteriores da Câmara, por onde o projeto passou, apenas PT e PSOL votaram contra a aprovação do acordo de salvaguardas. 

Tentativas

Os Estados Unidos requerem a cessão da Base de Alcântara há pelo menos 20 anos. O Acordo de Salvaguardas Tecnológicas foi barrado duas vezes pelos brasileiros: no Congresso Nacional, em 2001, durante o governo Fernando Henrique Cardoso, e por meio de plebiscito realizado na mesma época. Em 2016, o governo de Michel Temer se empenhou para aprová-lo, mas não conseguiu. 

De acordo com a Força Aérea Brasileira (FAB), a base tem uma posição geográfica estratégica e privilegiada para lançamento de foguetes e satélites no espaço. (Rafael Tatemoto – Brasil de Fato)