Uma análise da linguagem usada pelo ministro da Justiça, Sérgio Moro, pelo procurador Deltan Dallagnol por meio da assessoria do Ministério Público Federal do Paraná e também de outros procuradores contra os vazamentos de mensagens feitos pelo site The Intercept Brasil reforça a veracidade das informações e dos conteúdos vazados.
As respostas apresentam contradições e nunca negam veementemente o conteúdo das informações. Normalmente, as respostas usam “invasão criminosa de hacker nos celulares dos procuradores”, o que seria uma comprovação de que as mensagens são verdadeiras. Em outros momentos dizem que “alteram o contexto da mensagem”, o que também confirma que as mensagens são verdadeiras.
E, mais importante, os personagens e o MPF-PR dizem “não reconheço” as mensagens ou que “não permite constatar a veracidade do conteúdo” . Eles nunca dizem isso “é uma mentira, são falsas, foram inventadas. Vou provar que são falsas”. Eles não podem dizer isso. Eles apenas dizem “não reconheço” ou “não permitem constatar” etc. E o que significa “não reconheço” ou “não permitem constatar” etc?
Significa que se um dia não puderem mais negar que são verdadeiras, eles poderão “reconhecer” a verdade. Ou seja, agora “reconheço”. Eles deixam essa porta aberta pela linguagem para que um dia não possam ser acusados de falsidade.
Veja abaixo as repostas dadas às reportagens sobre os vazamentos:
Na Parte 2 do Intercept Brasil, que trata da censura à entrevista da Folha com Lula, a nota do MPF-PR não nega de forma veemente as conversas. Prefere atacar e se colocar como de vítima:
“A atuação sórdida daqueles que vierem a se aproveitar da ação do “hacker” para deturpar fatos, apresentar fatos retirados de contexto e falsificar integral ou parcialmente informações atende interesses inconfessáveis de criminosos atingidos pela Lava Jato”. Ou seja, há mais confirmação da veracidade nesse trecho do que negativa.
Em outro momento da nota, voltam a confirmar as conversas: “Vários dos integrantes da força-tarefa de procuradores são amigos próximos e, nesse ambiente, são comuns desabafos e brincadeiras. Muitas conversas, sem o devido contexto, podem dar margem para interpretações equivocadas”. Ou seja, elas são verdadeiras, mas são ‘brincadeiras’, ‘estão fora de contexto’.
Veja mais um reconhecimento de que as mensagens são verdadeiras na nota do MPF-PR: “eventuais críticas feitas pela opinião pública sobre as mensagens trocadas por seus integrantes serão recebidas como uma oportunidade para a reflexão e o aperfeiçoamento dos trabalhos da força-tarefa”. Ou seja, a nota diz que os procuradores erraram e pretendem melhorar. É mais uma confirmação da verdade dos vazamentos.
Outra confirmação da nota: “Não se sabe exatamente ainda a extensão da invasão, mas se sabe que foram obtidas cópias de mensagens e arquivos trocados em relações privadas e de trabalho“. Ou seja, mais uma confirmação indireta de que os vazamentos são verdadeiros
O ministro da Justiça, Sérgio Moro, também não nega as conversas de forma veemente. Diz que a “pessoa responsável pela invasão criminosa de celulares de procuradores”. (Veja que a possível invasão criminosa é uma forma de confirma que as mensagens como verdadeiras). E mais confirmação: “não se vislumbra qualquer anormalidade ou direcionamento da atuação enquanto magistrado, apesar de terem sido retiradas de contexto“. Se admite possível retirada de contexto, é outra confirmação de que são reais.
Parte 3, 4, 5, 6 e 7 – Falta de provas para condenar Lula no triplex do Guarujá, as ações de Moro orientando a acusação contra o réu e a proteção da Lava Jato ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, as respostas são as mesmas. No entanto, o The Intercept nota a contradição de Moro: “Apesar de chamar as conversas de “supostas”, Moro admitiu, hoje, a autenticidade de um chat. Em uma coletiva, ele chamou de “descuido” o episódio no qual, em 7 de dezembro de 2015, passa uma pista sobre o caso de Lula para que a equipe do MP investigue”.
A parte 8, que fala da violação de Moro ao sistema acusatório.
O Intercept Brasil afirma que “em resposta a nossos contatos, o porta-voz da força-tarefa da Lava Jato enviou o que já se tornou sua resposta padrão, evitando qualquer comentário sobre o conteúdo da reportagem e preferindo insinuar falsa e levianamente que as conversas podem não ser autênticas: “O trecho do material enviado à Força-Tarefa não permite constatar o contexto e a veracidade do conteúdo. Autoridades públicas foram alvo de ataque hacker criminoso, o que torna impossível aferir se houve edições no material alegadamente obtido”
E mais: “A procuradora Monique Cheker disse que “não tem registro da mensagem enviada e, portanto, não reconhece a suposta manifestação”. (A porta para reconhecer ficou aberta).
“O procurador regional da República Luiz Fernando Lessa esclareceu que, desde recentes ataques ao Telegram, não possui mais o aplicativo nem as mensagens trocadas por meio dele, de modo que não reconhece as mensagens.” (porta aberta para um dia reconhecer).
“Demais procuradores que não fazem parte da força-tarefa foram procurados e não responderam até a publicação deste texto. Eventuais comentários serão publicados se forem enviados ao Intercept”, diz a reportagem.
Na reportagem da Folha sobre a mudança de delação de Leo Pinheiro, as repostas são semelhantes: a Força Tarefa da Lava Jato diz que “o material apresentado pela reportagem não permite constatar o contexto e a veracidade do conteúdo”. A porta sempre aberta.