Lutas de Maio
.Por Paulo Bufalo.
Desde o século 19, no dia primeiro de maio, a classe que vive do trabalho vai às ruas denunciar a superexploração a que está submetida e lutar por direitos sociais e trabalhistas. Na segunda metade do século 20, outras lutas marcaram o mês de maio e são fundamentais de serem lembradas nestes tempos sombrios que vivemos no Brasil em relação aos direitos humanos e às políticas públicas das áreas sociais.
O dia 17 de maio é lembrado como Dia Internacional de Combate à Homofobia e foi instituído em 1990, quando movimentos de luta pelos direitos humanos de homossexuais conquistaram junto à Organização Mundial de Saúde (OMS) que a homossexualidade fosse excluída da Classificação Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde. No Brasil passou a ser celebrado nos anos que se seguiram e foi oficializado em 2010.
O objetivo desta data é debater as diversas formas de preconceito e de violência contra lésbicas, gays, bissexuais, transexuais e intersexos – LGBTI, além de conscientizar o conjunto da sociedade sobre as diferentes orientações sexuais e identidades de gênero e a criminalização da homofobia.
Duas lutas sociais marcam o dia 18 de maio. A luta antimanicomial e o enfrentamento à violência e à exploração sexual de crianças e adolescentes.
O Dia da Luta Antimanicomial, foi articulado no Brasil desde meados da década de 1980 e marcou o início do processo de superação do tratamento de privação do convívio com a sociedade, para pessoas acometidas por sofrimento psíquico e desvio psicossocial.
Em 1987, um congresso de trabalhadores da saúde mental realizado em Bauru, cunhou a bandeira “por uma sociedade sem manicômios” em referência ao sistema manicomial e seus tratamentos agressivos com uso abusivo de medicamentos, eletrochoques, camisas de força, confinamentos, torturas, entre outros, aplicados para conter e, supostamente, devolver as pessoas à normalidade psíquica e social, moralmente aceita pela sociedade. Sua finalidade é mobilizar a sociedade pela continuidade da “desconstrução” deste passado violento em favor de um presente mais humano e solidário. Por isso, o fim das grades e da tortura, a convivência social e às relações mais humanizadas, foram e continuam sendo fundamentais neste processo.
Neste contexto, um dos principais desafios de nosso tempo é preservar a política de saúde mental como política pública de Estado e atendendo de portas abertas o Sistema Único de Saúde, refutando privatizações ou qualquer forma de gestão de mercado.
O Dia de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual Infanto-Juvenil foi instituído em 2000, mas, a pauta já havia ganhado força no processo constituinte e com a nova Constituição Federal aprovada em 1988 e o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA em 1990, que reconhecem crianças e adolescentes como sujeitos de direitos e pessoas em condições peculiares de desenvolvimento, buscando superar a atenção à infância focada na criminalização da pobreza.
A data foi instituída em razão do crime ocorrido no dia 18 de maio de 1973 que comoveu o País, conhecido como “Crime Araceli”. A menina Araceli Cabrera, então com oito anos de idade, foi brutalmente estuprada, torturada e assassinada de forma cruel por membros de uma tradicional família capixaba em Vitória (ES) que nunca foram condenados.
A violência e exploração sexual contra crianças e adolescentes constituem umas das formas mais brutais de violência contra estas pessoas, fruto de desigualdades sociais, da discriminação de gênero, raça e etnia, do machismo e de relações de poder presentes em nossa sociedade. Elas podem se manifestar de muitas formas, dentro ou fora da família, em consequência de processos progressivos de outras violências que começam com o assédio e ou para fins comerciais na prostituição, na pedofilia e no tráfico. Crianças e adolescentes submetidos a essa barbárie sofrem danos físicos, psíquicos e sociais, que deixam sequelas irreparáveis ao seu desenvolvimento.
Por suas características, o enfrentamento necessita de ações articuladas de caráter continuado e políticas públicas sociais estruturadas, que assegurem a proteção integral à criança e ao adolescente, previstas no ECA, mas, que raramente foram respeitadas. Requer também iniciativas contundentes de pessoas que trabalham ou convivem com crianças e adolescentes e se deparam ou tomam conhecimento de violações aos seus direitos.
As mobilizações em torno destas lutas provocam a sociedade para combater os preconceitos e exigir o respeito aos direitos humanos. São de extrema importância para disputa dos rumos de nossa sociedade, cada vez mais regulada por negócios e fundamentalismos e na qual, valores como solidariedade, tolerância e respeito às diferenças e à diversidade, perdem lugar à concorrência, ao individualismo e à intolerância.
As mobilizações, ocorridas no #15M em todo país, contra os cortes de recursos na educação, ciência e tecnologia públicas e contra o desmonte da previdência, seja por suas dimensões ou pela pluralidade, poderão entrar para história como mais uma luta de maio que, sob um governo de ultra-direita e fascista, inaugurou no Brasil, um novo marco em defesa da educação pública, gratuita, laica, de qualidade socialmente referenciada e, sobretudo, libertária.
Paulo Bufalo é professor e ex-vereador em Campinas