.Por Susiana Drapeau.
No evento da UNE em Salvador, quando o ex-candidato a presidente Ciro Gomes (PDT) foi hostilizado, o mais importante de sua fala ficou ignorado em nome do factóide que alimenta as redes sociais. A briga entre Ciro e a militância petista voltou à tona. Briga, aliás, que os fascistas estão amando.
Ciro Gomes parece que estabeleceu uma estratégia política de atuação no campo da esquerda e decidiu disputá-la com o PT, partido hegemônico na esquerda brasileira. E isso tem seu preço. É realmente revoltante ver criticas de Ciro se você é um militante fervoroso, indignado com a prisão política de Lula.
No entanto, para as lideranças do PT, é preciso usar a racionalidade. A falta de paciência de Ciro Gomes não expressa seu pensamento, que é importante para se entender as derrotas sucessivas do PT desde 2015, quando perdeu a presidência da Câmara para Eduardo Cunha. De lá para cá, o PT só acumulou derrotas mesmo com toda a força e apoio político que tem na sociedade.
Veja o que Ciro disse na Briga com os petistas: “Ele aceitou os recursos [da Justiça]. Desculpa, não sou eu que condenei o Lula. Não está na minha mão liberar Lula. Eu avisei se a direita ganhasse as eleições, o Lula ia ficar encarcerado por muito mais tempo. Avisei na campanha. Todo mundo pode vomitar paixão que quiser, mas enquanto a gente ficar assim, acreditando em minorias ínfimas, esmagadoramente derrotados que fomos… Companheiros, nós fomos humilhantemente derrotados por essa estratégia. Insistir nela afunda o Brasil”, discursou.
Na realidade, esse grifo é a parte essencial da fala de Ciro, não sua impaciência ou seu temperamento. Pode estar certo ou errado. Mas a crítica de Ciro Gomes ao PT é oposta à crítica propagada pela grande mídia e pela extrema-direita. Com Lula preso e sem liderança capaz de superar as dificuldades, a militância petista atira para todos os lados e principalmente em Ciro que tenta ocupar o mesmo espectro político.
Após o evento, Ciro divulgou um vídeo em que disse que o PT quer empurrá-lo para a direita como fez com Marina Silva. Você pode pensar que Marina foi para a direita por que quis. Mas Ciro está falando isso para ele mesmo. Ou seja, ele pretende insistir no espectro político do PT. Ao não apoitar Haddad no segundo turno, Ciro deu uma marinada. Talvez já tenha percebido o erro.
Essa disputa pode durar um bom tempo. As lideranças petistas apostam que o desastre e o ataque aos trabalhadores pelo governo de extrema-direita vão em breve anular o antipetismo e recolocar o PT como protagonista. Ciro provavelmente não acredita nisso. Ele deve pensar que a grande mídia e as fake news vão continuar alimentando o antipetismo e atrasando uma recuperação por algumas eleições. Quem estará certo?
Mas talvez possamos pensar que ambos estejam errados.