Resumo da Ópera
.Por Ricardo Pereira.
Tudo ia aparentemente bem até GREEN BOOK, apesar do filme tratar da questão racial, o faz pela ótica do branco a exemplo do que fazia “CONDUZINDO MISS DAISY” em 1990, outro vencedor do Oscar de Melhor Filme.
O tom já era ingênuo em 1989, mas funcionou, hoje parece mais datado que nunca, até porque do racismo escancarado passamos ao racismo velado, ele continua vivo mesmo que não exista mais um guia dizendo quais hotéis e restaurantes os negros podem frequentar sem incomodar os brancos sendo impresso e distribuído.
É preciso, portanto, como faz Spike Lee em INFILTRADO NA KLAN escancará-lo novamente, para que todos, sobretudo brancos, percebam sua hipocrisia.
Por isso, GREEN BOOK é um filme que agrada tanto a audiência branca porque nele tudo é resolvido na base da compreensão de ambos os lados, sem nenhum trauma para os brancos, sem que nenhuma dívida lhes seja cobrada.
Mas de resto a noite teve seus momentos a serem celebrados, você pode não amar BOHEMIAN RHAPSODY, mas é significativo que Rami Malek tenha ganho sua estatueta interpretando um homossexual genial e talentoso como Freddie Mercury que significa tanto até hoje para meninos e meninas buscando sua identidade e felicidade.
Nunca tantos profissionais negros foram premiados numa edição do Oscar – sete – sinal de que a campanha encabeçada por Spike Lee em 2016 surtiu efeito – o “Oscar So White” denunciava a ausência de negros entre os indicados da Academia. De lá para cá, Hollywood se mexeu e os negros passaram a ganhar mais papéis e destaque nas produções, o Oscar para Spike Lee seguido do belo discurso do cineasta que como não poderia deixar de ser lembrou a opressão histórica à população negra no seu país – tema de quase todos os seus filmes e deste poderoso “INFILTRADO NA KLAN” – é uma espécie de reconhecimento não apenas do talento do cineasta, mas de sua luta.
Infelizmente na hora de escolher o melhor filme da noite, a Academia não fez a coisa certa e foi “GREEN BOOK” quem levou. Mas se “GREEN BOOK” entrou para a história do Oscar, “INFILTRADO NA KLAN” entrou para a história do cinema, o que é mais importante, história em que já se encontra “FAÇA A COISA CERTA”, derrotado em 1990 por “CONDUZINDO MISS DAISY” e hoje esquecido.
Também é significativo que enquanto o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, fala em construir um muro na fronteira com o México, Alfonso Cuarón e o seu “ROMA” represente tão bem na festa o país contando uma história cuja protagonista é uma indígena, uma empregada doméstica, pessoas que sentem e existem.
Da mesma forma nunca tantas mulheres foram premiadas numa única edição, quinze ao todo. E até um curta-metragem sobre menstruação foi premiado. Aliás, um belo filme – “PERIOD. END OF SENTENCE” que está no Netflix com o título de “ABSORVENDO O TABU”; assistam, meninos e meninas.
O cinema não vai mudar o mundo, mas através dele ideias são disseminadas, a maior parte dos filmes que vemos são de Hollywood e que nesta fábrica de sonhos mulheres, negros e imigrantes ganhem cada vez mais voz é algo a ser comemorado. Eu acho que é. Wakanda forever.
A capacidade que antecede, um mês da entrega do Oscar, é algo fabuloso. É de mais de 3.000 pessoas que são envolvidas diretamente, só para a grande noite de gala. O Brasil precisa aprender muito com isso. Mas em se falando da entrega do Oscar, esperava os atores Willen Dafoe e a Glen Close fossem ganhar o tal cobiçado troféu. E Roma, que deveria ter sido a grande vencedora de melhor filme ou no último caso, Infiltrado na Klan de Spike Lee. Enfim… O Oscar não é para os veteranos.