Por Ariane Araújo
“Ontem, 10 de fevereiro, a emissora do Pastor Edir Macedo transmitiu uma reportagem sobre o Encontro Nacional dos Sem Terrinha, que aconteceu em Brasília em 2018. Questionaram até que ponto uma criança deve ser inserida em uma organização de caráter ideológico.
Pois bem:
Venho, então, falar como sem terrinha que fui. Nasci e me criei na Bahia, no seio desta organização, de uma família de origem camponesa do interior do Piauí.
Desde muito pequena, aprendi sobre a importância de dividir com as demais crianças. Aprendi que o brinquedo, o lanche, a roupa, são coisas que, quando necessário, devem ser compartilhados.
Aprendi que a cama macia para dormir não era comum na vida de todos, para alguns era luxo, que comer mais de refeição também.
Aprendi que estudar próximo de onde morava era algo quase impossível. Que, naquela época, ter uma TV era o sonho de muitas crianças.
Aprendi a dar valor a tudo que tinha e que nada caía do céu. Que meus pais trabalhavam dia e noite, passavam semanas fora de casa visando melhorar a vida não apenas da nossa família, mas de outras também.
Aprendi que a arte, a cultura e as brincadeiras eram um direito, uma necessidade humana para fazer os dias de amargura um pouco mais doces.
Aprendi que aquela sementinha de feijão que plantamos na escola significa cuidar a terra, cultivar o alimento, semear o grão.
Aprendi que, apesar de parecerem mundos completamente diferentes, na cidade muitas crianças também não tinham o que as crianças do campo almejavam. Que a comida que se tinha na cidade, vinha diretamente da mão do povo do campo
Hoje, com estes e tantos outros aprendizados adquiridos ao longo da vida, a sem terrinha que antes não entendia do mundo, pôde estudar – mesmo nas escolas tidas como “tradicionais e livres do comunismo”-, pôde entrar (com outros que também foram sem terrinhas) numa das carreiras acadêmicas mais elitistas, que outrora formava apenas os filhos dos que muito tinham.
Hoje, com diploma e OAB, esta sem terrinha poderá defender que cada criança aprenda tudo que aprendi, que tenha tudo que não tive, que sorria, cante e brinque como se deve e que possa, assim como eu, ter todas as oportunidades para pintar os quatro cantos deste país de povo
Até que ponto, então, as crianças devem se inserir em uma organização de caráter ideológico?
Respondo: até que não seja mais necessário lutar pelo que é direito. Foi assim que aprendi e é assim que vou ensinar para todas as crianças, seja ela sem terrinha ou não: que só a luta muda a vida.
Por Ariane Araújo, militante sem terra e advogada formada pela turma de Direito da UNEB Eugênio Lyra (PRONERA). (Do Facebook de Ariane Araújo)
Bravo companheiros do MST! Uma das poucas iniciativas que me fazem ter orgulho e esperança neste país! Continuem firmes e fortes pois o embate é de Davi contra Golias!