.Por Marcelo Sguassábia.
Sim, tudo mudou, permanecerá mudando e trará transformações ainda não suficientemente dimensionadas pelos antropólogos de Helsinque.
Entretanto, as oito horas regulamentares de sono continuam necessárias, e ainda não inventaram um aparelho indutor da fase REM com 100% de eficácia comprovada em testes clínicos. Mas como os carros são autônomos, pode-se cumprir boa parte dessas horas a caminho do trabalho, com cobertor, travesseiro e máscara de dormir, no banco de trás.
Os carros autônomos são quase todos elétricos, e com eles o procedimento é o mesmo que se tem com os celulares – basta ligá-los na tomada e deixá-los carregando ao longo da madrugada para que logo no começo da manhã estejam com carga máxima e prontos para a faina diária.
Os postos de combustível aos poucos vão sumindo da paisagem, para darem lugar a grandes estacionamentos com totens de carga elétrica rápida, para os distraídos que esqueceram de abastecer o carro na garagem antes de saírem de casa ou para os que acabaram rodando mais que o previsto. Quiosques de fritas e de casquinhas do McDonald’s amenizarão a angústia dos intermináveis quinze minutos de espera.
A expectativa para os próximos dois anos é que mais e mais pessoas troquem seus carros movidos a combustível fóssil pelos modelos elétricos. Para os próximos quatro anos, prevê-se o sucateamento de toda a geração anterior, de veículos híbridos eletricidade/gasolina. Para os próximos sete anos, a previsão é de que os carros elétricos não precisarão mais ser carregados porque não terão que sair de suas garagens, já que muito provavelmente os seus proprietários estarão dispensados de deixar suas casas para trabalhar.
A gigantesca malha de transporte urbano e as rodovias federais, estaduais e municipais perderão sua função repentinamente, e concursos serão criados nas comunidades para que se deem a elas alguma finalidade, pois interligarão nada a lugar nenhum.
Alternativa alguma de curto prazo será encontrada para substituir a queda de arrecadação de IPVA, de pedágios e de tarifas cobradas nos transportes coletivos, o que irá acelerar a ruína de todos os caminhos possíveis e imagináveis. A malha asfáltica abrirá fendas e buracos imensos, que não se consertarão por falta de verba. Neles o mato crescerá e jamais será carpido, igualmente pela escassez de recursos das prefeituras e concessionárias de rodovias.
Mas a população, ou a minoria de pessoas que ainda dispuser de algum dinheiro após o caos, poderá ficar tranquila: tudo o que precisarem será entregue por drones da Amazon, no conforto de seus lares. O pagamento dispensará cartão, ficando a critério do cliente a utilização dos sistemas de reconhecimento de íris ou a biometria. Caso queira, o consumidor poderá adquirir o próprio drone do Delivery, se tiver o que fazer com ele.