.Por Eduardo de Paula Barreto.
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Bom dia meus caros súditos
Como seu novo Presidente
Tomo posse deste púlpito
De onde não sairei facilmente
Porque sou o militar
Que sem precisar
Dar golpe armado
Chegou ao poder
Colocado por você
Que pelo ódio foi cegado.
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Serei para sempre o seu mito
E as Igrejas que não adotam Jesus
Serão obrigadas a usar crucifixo
E a fazer o sinal da cruz
Caso contrário os seus seguidores
Por serem os piores pecadores
Escolherão entre exílio ou prisão
Será dada plena liberdade
Para o exercício da religiosidade
Contanto que todos sejam cristãos.
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Os negros e quilombolas obesos
Para que caibam em suas roupas
Terão que perder algum peso
Pelo menos uma arroba
E os transviados sexuais
Que não apanharam dos seus pais
Poderão levar coça dos milicos
E se não quiserem se submeter
Aos padrões que vou estabelecer
Serão presos ou abatidos.
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Os trabalhadores terão que optar
Entre trabalho ou férias
E o décimo terceiro será
Coisa do arco da velha
E o ensino será a distância
Já era esse negócio de criança
Ficar dando despesa pro Estado
Agora será dos pais a missão
De ensinar seus filhos senão
Todos serão exilados.
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Aumentarei o salário dos militares
E acabarei com o bolsa vagabundo
Porque pobre faz filho aos milhares
E desnutrido se torna infecundo
E quem quiser estudar sem grana
Terá que mudar-se pra Alemanha
Porque aqui as Federais serão caras
E se fizerem manifestações públicas
Tomarão borrachadas múltiplas
E conhecerão o pau de arara.
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A Amazônia será incluída
No pacote de doações
Junto às estatais construídas
Com o suor de gerações
E todo brasileiro em subserviência
Terá que bater continência
Pra bandeira dos Estados Unidos
Ou será considerado vândalo
E enviado a Guantánamo
Para no exílio ser esquecido.
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Todas as minorias que até hoje
Lutaram pelos seus direitos
Terão que pegar seus alforjes
E voltar para os guetos
E lá ficar sempre caladas
Senão serão castigadas
Pelos cidadãos de bem
Que terão arma e porte
Para punir com a morte
Quem tratá-los com desdém.
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As mulheres que são fruto
De fraquejadas dos seus pais
Não poderão cometer o abuso
De pedir equiparações salariais
Porque elas engravidam
E assim mais caras ficam
Pra quem paga a conta
Mas talvez eu até conceda
Que receba horas extras
Quem ligar as trompas.
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Vou metralhar a petralhada
E fechar o STF
E no Palácio da Alvorada
Vou humilhar Dilma Rousseff
Erigindo uma estátua
No meio do espelho d’água
Tudo isso à sua custa
E colocarei uma placa:
‘Viva quem tortura e mata
Viva o Coronel Ustra’.
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Assim termino o meu pronunciamento
Desejando-lhes um viver dramático
Porque vocês votaram pelo incremento
Do novo regime autocrático
E vocês que criticaram a tortura
Aprenderão que a antiga ditadura
Será repaginada no Brasil
E os meus castigos e execuções
Chegarão até as futuras gerações
Como comunistas fake news.
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23/10/2018
INOCENTES E PECADORES
Inocentes e pecadores dirigem-se ao mesmo matadouro
Por vontade própria, as mãos e os pés livres, olhos além.
Acreditam saber da vida e da morte o bastante para quem
Aguarda o Paraíso, a remissão, o outro lado sem receio.
Inocentes e pecadores dirigem-se ao mesmo ancoradouro
Por vontade própria, o leme e o motor de popa eles têm.
Creem no Dia da Redenção, puros e infiéis no abatedouro,
Amigos e inimigos diante da escolha que a cada um convém.
Inocentes e pecadores saem em busca do mesmo tesouro
Batendo boca na Babel da Idade Mídia, com seus recheios
Enredados de falas que vêm da fome, que da perdição vêm,
Mesmo aquelas de supostos profetas ou de outros meios.
Inocentes e pecadores adoram cegos o bezerro de ouro
Para ganhar a salvação pretendida na cruzada prometida.
Batendo boca em línguas que julgam saber, sobem ao altar
Pregando em vez de luz, de trégua, trevas e ódio fratricida.
Inocentes e pecadores fazem aqui e ali desesperadas preces
Ante a ameaça de tempestade sem Noé. Para não naufragar
O barco em construção, rogam ao Céu não mandar messes,
Mas sagrar em ungida urna um reles fariseu fingido salvador.
Pecadores com justas palavras, cínicas teses, se misturam
Á multidão de indiferentes acostumados a nada pretenderem
A não ser talvez num outro mundo outras almas se fazerem,
Fazendo a mão direita mentir sem vexame à mão esquerda.
Inocentes e pecadores, num clamor irmão em humanidade,
Juntem vozes, cordas em acordes, versos que todos cantem,
Embora nem com tudo concordem com o 13 ou com Haddad,
É hora de escolher o nosso norte, não a nossa morte. Amem!
Maricá, 17 de outubro de 2018.
Odemir Capistrano