Na edição de 15 de agosto, em editorial intitulado “Contra a vigarice, a lei” (na íntegra, ao final), o Estadão usou o termo tigrada para identificar os militantes do PT.

Não é a primeira vez faz isso.

Indignado, o professor aposentado Caio Navarro de Toledo (foto), da Unicamp, enviou a carta abaixo ao jornal, sem a menor expectativa de que seja publicada.

“Escrevi a amigos e colegas”, contou ao Viomundo.

“Contra insultos, não se pode calar”, observou.

Pelo menos até essa sexta-feira (17/09), o Estadão não publicou a carta do professor Caio Toledo. (Do Vi o Mundo)

À Editoria de O Estado de S. Paulo,

Não é preciso ser adepto do Partido dos Trabalhadores nem eleitor de Lula da Silva para sentir um profundo mal estar ao ler o Editorial “Contra a vigarice, a lei” [ao final, na íntegra].

Numa cultura consistemente democrática – em que o respeito ao adversário ideológico deveria ser uma cláusula pétrea e uma exigência central da argumentação política –, o rancor, a desqualificação e a intolerância deveriam estar absolutamente ausentes no debate das ideias.

Deixando para outro momento o exame da natureza classista do editorial, limito-me a destacar – dentre o arsenal de palavras pejorativas presentes no texto – um dos termos utilizados para identificar os militantes do PT: tigrada.

Reconheça-se que a palavra integra o léxico dos editoriais de O Estado quando se refere aos petistas.

Cultores do vernáculo, difícil acreditar que os editorialistas de O bravo matutino – para lembrar o título da obra de duas competentes historiadoras da USP sobre o jornal –, desconheçam a etimologia e o significado da palavra tigrada.

Entre os distintos significados pejorativos e odiosos, julgo que um deles, certamente, é privilegiado pelos editorialistas do jornal.

Tigrada: “Termo que a aristocracia escravocrata e racista usava para se referir aos escravos que carregavam e despejavam os dejetos humanos (…)

Como algumas vezes os dejetos acabavam atingindo a pele dos escravos e manchando-os, ficavam marcas de dejetos em forma de listras nas costas dos escravos que faziam o trabalho forçado de recolhimento dos dejetos”.

Caso não conhecessem este significado da palavra tigrada, acredita-se que, doravante, os Editoriais de O Estado pouparão seus leitores deste (e outros) termo de conotação aristocrática e racista.

Atenciosamente,

Caio N. de Toledo
Professor aposentado da Unicamp

Contra a vigarice, a lei

Se o PT de fato consagrar hoje Lula da Silva como seu candidato, caberá à Justiça Eleitoral fazer cumprir a lei e impugnar de pronto essa candidatura que escarnece da democracia

Editorial de O Estado de S.Paulo, 15 de agosto 2018

Encerra-se hoje o prazo para o registro das candidaturas à Presidência e, como antecipado exaustivamente pelos petistas, o PT deverá consagrar Lula da Silva como seu candidato. Se isso de fato se confirmar, caberá à Justiça Eleitoral simplesmente fazer cumprir a lei e impugnar de pronto essa candidatura que escarnece da democracia e das instituições.

A impugnação é a única deliberação cabível nesse caso porque a candidatura de Lula claramente contraria a Lei da Ficha Limpa. O texto da lei é indiscutível: “São inelegíveis: (…) os que forem condenados em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado”.

É precisamente o caso de Lula, cuja condenação à prisão por corrupção e lavagem de dinheiro, proferida pelo juiz federal Sérgio Moro, foi confirmada por colegiado do Tribunal Regional Federal da 4.ª Região.

Ao registrar a candidatura de Lula, o PT deve apresentar, entre outros documentos, uma certidão criminal fornecida pela Justiça que comprove que seu postulante ao cargo de presidente não é um meliante condenado pela Justiça – causa evidente de inelegibilidade. Já há sólida jurisprudência no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para indeferir o registro caso a certidão de Lula indique, como indicará, a existência de uma pesada condenação, em segunda instância, a 12 anos e 1 mês de cadeia.

A caterva lulopetista não se conforma com isso, é claro. Nas últimas horas, colocou a tropa na rua, sob o nome de “Marcha Nacional Lula Livre”, com bandos travestidos de “movimentos sociais” fechando estradas para infernizar a vida dos cidadãos comuns.

E continuou sua campanha internacional de difamação das instituições brasileiras, contando para isso com a inexplicável ajuda do jornal The New York Times, que publicou um artigo de Lula no qual ele enfileira uma série de fraudes factuais para culminar na acusação de que sua prisão é parte de um “golpe da extrema direita”.

Tudo isso para criar um clima de confusão – a especialidade da tigrada. Segundo estratégia amplamente noticiada, os advogados do demiurgo de Garanhuns pretendem invocar o artigo 16-A da Lei da Ficha Limpa, segundo o qual “o candidato cujo registro esteja sub judice poderá efetuar todos os atos relativos à campanha eleitoral, inclusive utilizar o horário eleitoral gratuito no rádio e na televisão e ter seu nome mantido na urna eletrônica enquanto estiver sob essa condição, ficando a validade dos votos a ele atribuídos condicionada ao deferimento de seu registro por instância superior”.

Para que essa estratégia funcione, contudo, é preciso que a candidatura de Lula seja considerada “sub judice”, o que ela só será se, uma vez deferida pela Justiça Eleitoral, for contestada pelo Ministério Público Eleitoral ou por adversários.

Como a candidatura deverá ser indeferida de saída pelo TSE, como consequência da condenação de Lula em segunda instância, não se pode falar em candidatura “sub judice”, pois candidatura não há. É isso o que diz a lei, único antídoto para a vigarice lulopetista. Para a seita de Lula, no entanto, o TSE deveria funcionar como instância revisora do julgamento que o condenou à prisão.

A Justiça Eleitoral, é claro, não pode se prestar a esse papel, e tudo indica que não o fará. A nova presidente do TSE, ministra Rosa Weber, já se pronunciou claramente a respeito da inelegibilidade de condenados em segunda instância.

Disse a ministra, no julgamento do Supremo Tribunal Federal que decidiu pela constitucionalidade da Lei da Ficha Limpa, em 2012, que não se pode falar em “direito adquirido” à elegibilidade, pois há condições a serem previamente satisfeitas – entre as quais a “ficha limpa”.

Segundo ela, a Justiça Eleitoral não pode esperar até que se esgotem todos os recursos na seara penal para só então deferir ou não o registro de um candidato, pois o que vale nesse caso é a proteção do interesse público e da coletividade. Trocando em miúdos, o que importa é preservar a legitimidade das eleições, que só estará garantida se o vencedor for alguém sem pendências judiciais que o impeçam de exercer o mandato.

É esse o espírito da lei que os petistas pretendem violentar, com suas chicanas e maquinações. Que o Judiciário, sem delongas, feche as portas a esse embuste.