.Por Marcelo Sguassábia.
Pasme, porque a coisa é séria e assustadora. Um pedreiro, daqueles de mão cheia, que trabalha rápido e bem, consegue assentar até 600 tijolos ao longo de oito horas de serviço. Isso em condições ideais de temperatura e pressão, contando que o sujeito irá pular da cama disposto e louco pra botar a mão na argamassa.
O robô, já concebido e no aquecimento para roubar seu lugar, assenta POR HORA cerca de 1500 tijolos – milimetricamente aprumados, sem desperdício de material, sem cantoria de pagode, sem parar para começar outro serviço enquanto não termina o que está fazendo ou para chavecar a mulherada que passa em frente à obra, com o manjado “ô, lá em casa!”.
Mais: sem salário, sem nunca ficar doente, sem FGTS, sem INSS, sem décimo terceiro, sem greve, sem panetone e sidra de fim de ano. O máximo que vai exigir é uma ou outra borrifada de WD40 de vez em quando. Esse é um exemplo, para ficar só na construção civil.
Juro que não quero estragar o seu Natal, nem o espírito de harmonia e fraternidade reinante, mas o poder de destruição da Inteligência Artificial promete não deixar pedra sobre pedra. Vai virar tudo do avesso e passar a Makita em milhões de pescoços.
Tem jeito de evitar isso? Não. Tem jeito de evitar as consequências disso? Também não. Então, fazer o quê? Tentar deixar menos árdua a remoção dos escombros e a reinvenção da roda. Fóruns de discussão e congressos mundo afora debatem a possibilidade de uma giga-tributação sobre os robôs, como forma de inibir sua utilização desenfreada e o resultante desemprego em massa. Aí então teríamos robôs em oferta abundante e a preços módicos, mas não teríamos empresários dispostos a arcar com o ônus de utilizá-los.
Logicamente, a produtividade e a diminuição de custos prometidas pela Inteligência Artificial, que trariam uma brutal redução nos preços de tudo, ficariam pra depois. Afinal, de que adianta o mundo a preço de banana, se não tiver ninguém empregado e recebendo direitinho para limpar as prateleiras?
Pessimistas mais radicais profetizam que a automação e o autosserviço tomarão conta de toda a cadeia econômica, e que funções burocráticas e mecânicas serão rapidamente varridas dos comércios e das indústrias. Até mesmo contadores, engenheiros, nutricionistas, analistas de laboratório e adestradores de foca estariam ameaçados de extinção para darem lugar ao fantástico poder dos algoritmos.
Tudo bem, novas funções surgirão, mas com um potencial de empregabilidade infinitamente inferior ao número de humanos tornados obsoletos da noite para o dia. Não é difícil imaginar o aparecimento de fábricas moderníssimas, cujas inteligências artificiais produzirão artefatos de Inteligência Artificial para controlar robôs artificialmente inteligentes que executarão miríades de tarefas antes a cargo do pessoal de carne e osso. E o Nosso Senhor lá em cima assistirá a tudo isso com um olhar complacente e um sorriso de canto de boca, como quem já sabe desde o início dos tempos qual será o final dessa novela. Que Ele nos inspire e nos abençoe.
Com a devida licença da vulgaridade da palavra, mas que PORRA de mundo uns estão construindo (e lucrando) e outros deixando que seja construído (e perdendo)? Quem é mais condenável, o espertalhão ou o ignorante e omisso?